O favorecimento do devedor vulnerável

AutorGustavo Henrique Baptista Andrade
Páginas515-527
O FAVORECIMENTO
DO DEVEDOR VULNERÁVEL1
Gustavo Henrique Baptista Andrade
Sumário: 1. Introdução – 2. Vulnerabilidade e historicidade – 3. Vulnerabilidade e contrato não paritário
– 4. Vulnerabilidade e o favorecimento do devedor – 5. À guiza de conclusão.
1. INTRODUÇÃO
“A decisão judicial que atende a contrato de nanciamento bancário com alienação duciária em
garantia e ordena a prisão de devedora por dívida que se elevou, após alguns meses, de R$ 18.700,00
para R$ 86.858,24, fere o princípio da dignidade da pessoa humana, dá validade a uma relação negocial
sem nenhuma equivalência, priva por quatro meses o devedor de seu maior valor, que é a liberdade,
consagra o abuso de uma exigência que submete uma das partes a perder o resto provável de vida
reunindo toda a sua remuneração para o pagamento dos juros de um débito relativamente de pouca
monta, destruindo qualquer outro projeto de vida que não seja o de cumprir com a exigência do
credor (STJ, 2001).
O destaque na epígrafe é um excerto de voto proferido no Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do pedido de Habeas Corpus 12.547-DF. O leitor deve abstrair
do texto a questão relativa à prisão do depositário inel, hoje considerada ilícita pelo
Supremo Tribunal Federal, que pacicou a matéria e editou a Súmula Vinculante 25.
A emblemática decisão foi prolatada em sede de pedido de habeas corpus impe-
trado em favor da cliente de um banco que, nos autos de uma ação de busca e apreensão
convertida em depósito de um veículo nanciado através de um contrato de alienação
duciária, teve o decreto de sua prisão mantido pelo Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e Territórios por ser considerada depositária inel dada sua recusa em devolver
o automóvel. Em defesa da paciente, além de a lgumas questões de ordem processual e
material, foi alegado motivo de força maior para justicar a impossibilidade de devolução
do bem ao credor, considerando ter sido o veículo objeto de furto.
O ponto nodal da questão, na verdade, é a discussão acerca da dívida existente
devido à aquisição de automóvel para uso na prestação de serviço de taxi. A dívida
assumida mais do que quadruplicou no intervalo de apenas dois anos e entendeu o
Relator do remédio processual que a taxista, já contando com sessenta anos de idade
e com renda mensal de R$ 500,00 (quinhentos reais), teria consumida toda a renda a
1. Grande parte deste artigo foi escrita com base nos Capítulos I e II da Tese de Doutorado do autor, defendida
perante banca examinadora na UFPE em 15.02.2015, ainda não publicada, cujo título é A vulnerabilidade e sua
repercussão no superendividamento do consumidor.

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