O fenômeno do big data e a conexão entre a proteção de dados e o direito antitruste

AutorHenrique da Silva Telles Vargas
Páginas91-115
COMPLIANCE E PROTEÇÃO DE DADOS 
O FENÔMENO DO BIG DATA E A
CONEXÃO ENTRE A PROTEÇÃO DE
DADOS E O DIREITO ANTITRUSTE
Henrique da Silva Telles Vargas1
Sumário:
. INTRODUÇÃO. . O FENÔMENO DO BIG DATA: O OURO GARIMPADO. . INTERSECÇÃO
ENTRE A PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS E A DEFESA DA CONCORRÊNCIA. .. A
livre iniciativa na LGPD: fundamento ou objeto de proteção? .. Tratamento
dispensado pelo Direito Concorrencial à dominação de mercado com base na
coleta de dados em massa: Questionamentos. .. Processo Administrativo
n. ./-: O primeiro case julgado pelo CADE no tocante
às condutas unilaterais na economia digital. . CONCLUSÕES FINAIS.
1. INTRODUÇÃO
A informação deixou de ser um meio pelo qual se presta algo, passan-
do a ser, na atual fase da economia informacional, o próprio produto
e/ou a prestação dos serviços. A informação é um valor em si mesma e
não um meio para criar bens e prestar serviços.2 O crescimento expo-
nencial do f‌luxo de dados pessoais, assim como a expansão da tecnolo-
gia da informação e do acesso à internet em níveis globais, são peças do
que se denomina de Nova Economia.3
1 Mestrando em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC,
Florianópolis – SC (Brasil). Pós- graduado (LLM) em Direito Empresarial pela Fundação
Getúlio Vargas – 2018. Procurador Geral do Município de Garopaba/SC. Membro da
Comissão Estadual de Direito Empresarial – OAB/SC. Membro da Comissão Estadual de
Conformidade e Compliance da OAB/SC. E-mail: henrique.telles0@gmail.com.
2 CASTELLS, The rise of the network society: the information age: economy, so-
ciety and culture. 2. ed. Massachusetts: Blackwell, 2000. v. 1. p. 77.
3 Conquanto não haja um conceito único para o paradigma da “Nova Economia”,
Posner utiliza o termo para se referir principalmente a 03 (três) indústrias distin-
 Henrique da Silva Telles Vargas
O acesso em massa, obtenção e tratamento de dados em larga escala
é assunto sensível, pois há clara necessidade de garantir que os benefí-
cios desse acesso não sejam utilizados de forma indevida. Essa é uma
preocupação atual tanto das agências reguladoras nacionais como in-
ternacionais. De fato a posse de dados pessoais em larga escala confere
ao detentor um poder de mercado signif‌icativo, o qual pode interferir
sob duas óticas: a) vertical que está diretamente ligada ao consumidor;
e b) horizontal, ou seja, aos concorrentes de mercado.4
Nesse “novo” contexto social da Nova Economia e hiperconectivi-
dade, surge a necessidade de uma lei geral para a proteção dos dados
pessoais a f‌im de reequilibrar os interesses econômicos e da pessoa
humana, considerado este direito como um direito fundamental. No
Brasil, a Lei n. 13.709, de 14 de agosto de 2018 é o marco legal da pro-
teção de dados pessoais.
É nessa conjuntura que se realiza o presente estudo: para se delinear o
que é o Big Data, sua inf‌luência na ordem econômica, sua regulação atra-
vés da já existente LGPD, a qual se fundamenta na livre iniciativa5, mas
também a protege, e por f‌im, a necessidade que o Direito Concorrencial
auxilie nesta regulação de forma convergente com o sistema jurídico de
proteção de dados. Pode-se sustentar e justif‌icar a importância do olhar
do Direito Concorrencial ao tema nas palavras do Professor Frédéric
Jenny: “data is valuable, it comes in different forms, it can be used in
different ways. For this reason, it matters for competition. (…). In abuse
of dominance, data can be used to exclude competitors (…)”.6
tas, embora relacionadas: (i) fabricação de software de computador; (ii) empresas
baseadas na internet (provedores de acesso à internet, provedores de serviços da in-
ternet e provedores de conteúdo da internet, por exemplo); e (iii) serviços e equipa-
mentos de comunicação projetados para suportar os 02 (dois) primeiros mercados.
POSNER, Richard A. Antitrust in the New Economy. John M. Olin Program in Law
& Economics Working Paper, Chicago, n. 106, 2000. Disponível em: https://core.
ac.uk/download/pdf/234141608.pdf. Acesso em: 06 maio 2021.
4 A exemplo respectivamente: imposição de condutas unilaterais abusivas, ferindo
o direito do consumidor e criando barreiras à entrada de novos players no mercado.
5 Entre outros fundamentos, o presente estudo se debruça especif‌icamente sobre
a livre iniciativa.
6 Tradução livre do autor: os dados são valiosos, vêm em diferentes formas e po-
dem ser usados de diferentes maneiras. Por isso, é importante para a competição.
(…). Em caso de abuso de domínio, os dados podem ser usados para excluir con-
correntes. (…). Cf. Frédéric Jenny, palestra na “Conference on Competition and the
Digital Economy”, promovida pela OCDE em 03.06.2019.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT