Fontes

Páginas25-52
2
FONTES
2.1 FONTES DE DIREITO ADMINISTRATIVO
Segundo Norberto Bobbio, fontes do direito conf‌iguram “fatos ou aqueles atos
aos quais um determinado ordenamento jurídico atribui a competência ou a capa-
cidade de produzir normas jurídicas”.1 Para ser jurídica, é preciso que certa norma
derive de fenômenos reconhecidos pelo ordenamento como sua fonte de produção.
E para ser válida, não basta que a norma se harmonize com o ordenamento. Além de
materialmente lícita, é necessário que ela resulte de uma fonte reconhecida.
As fontes do direito variam de acordo com as diferentes áreas jurídicas. Al-
gumas valem para praticamente todas as disciplinas do direito interno, como as
fontes constitucionais; outras, porém, encontram aceitação exclusivamente em
certos campos do direito. Exemplo disso se vislumbra no “costume”, fonte de
direito internacional público e de direito comercial, mas inaceitável como fonte
típica de direito administrativo. Exemplos adicionais são as leis municipais ou
estaduais. Em matéria de direito processual judicial, civil, penal e do trabalho,
cabe ao Congresso legislar com exclusividade (art. 22, I da CF), salvo se a União
autorizar explicitamente os Estados a editarem normas nesses campos (art. 22,
parágrafo único da CF). Já no direito administrativo, admite-se a ação legiferante
dos três entes federativos.
Em virtude do princípio da auto-organização inerente à estrutura federativa
tripartite, as Constituições, as leis federais, as estaduais e as municipais são fontes
válidas de normas sobre assuntos relativos à Administração Pública. Não obstante,
são raros os estudos dedicados aos direitos administrativos estaduais e municipais.
Dadas a quantidade de Estados e Municípios na federação brasileira e a consequente
variedade e complexidade de fontes, a ciência do direito administrativo se apoia
principalmente nas normas federais e nacionais editadas pelo Congresso Nacional,
bem como nos julgados que as abordam. Na prática, contudo, o administrativista
não pode deixar de manusear fontes subnacionais ao lidar com casos e conf‌litos
relacionados à Administração Pública de um Estado ou Município.
1. BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico, 10ª ed. Brasília: Editora UNB, 1999, p. 45.
MANUAL DE DIREITO ADMINISTRATIVO – VOLUME I • Thiago Marrara
26
2.2 AS FONTES DIANTE DA AUSÊNCIA DE CODIFICAÇÃO DO DIREITO
ADMINISTRATIVO
O direito administrativo brasileiro é composto por um conjunto de normas
contidas em diplomas legislativos esparsos que não encontram sistematização em
um código geral de validade nacional. Isso o afasta do que ocorre no direito civil,
penal, processual civil, processual penal ou comercial, áreas em que códigos abran-
gentes assumem o papel de fonte primordial do direito e a legislação esparsa, embora
existente, detém importância reduzida a certos aspectos.
Essa característica fragmentada e complexa do direito administrativo nacional
se vincula fortemente tanto a uma cultura de não codif‌icação desse ramo, quanto ao
fato de a Constituição ter consagrado uma federação, da qual redunda a distribuição
de poderes legislativos sobre temas administrativos pelos três níveis políticos de
modo assimétrico. A estrutura de distribuição de competências depende de cada
assunto tratado, não havendo um padrão único para todos os capítulos do direito
administrativo. Por exemplo, para desapropriação, a competência legislativa do
Congresso é privativa; no tocante às contratações públicas, sua competência se
restringe à edição de normas gerais.
Mesmo que se desconsiderasse a federação, a codif‌icação ampla desse ramo
jurídico seria pouco recomendável, sobretudo diante da dinâmica dos modelos
de administração pública, da mutabilidade das tarefas estatais e das consequentes
mudanças que esses fatores ocasionam no direito positivo. Não é por outro motivo
que até em países unitários, como a França e Portugal, os códigos administrativos
existentes se limitam a certos temas. Ora eles tratam de bens públicos, de contratos
ou de processo administrativo, ora de temas setoriais, como a política ambiental.
No Brasil, a mesma lógica se repete: algumas leis sistematizam capítulos do direito
administrativo geral, como as leis de processo administrativo; outras congregam
normas de direito especial, como os códigos de águas, de f‌lorestas, de trânsito e
de mineração. Entretanto, não existe, nem poderia existir codif‌icação abrangente
a ponto de abarcar todo o direito administrativo geral ou o direito administrativo
especial em suas mais diversas facetas.
Diante desse cenário, a aplicação adequada do direito administrativo pres-
supõe que o jurista seja capaz de selecionar com facilidade as fontes relevantes
dentro do emaranhado de diplomas normativos que conformam o direito positivo.
Disso resulta a relevância de se conhecerem as técnicas e opções constitucionais
de divisão de competências e os instrumentos que o direito prevê como intro-
dutores de normas. Igualmente por força da fragmentação, da multiplicidade e
da complexidade das fontes do direito administrativo, a doutrina e os princípios
constitucionais da Administração Pública desempenham um papel imprescindível
na construção de uma visão lógica, sistêmica e racional da disciplina jurídica da
Administração Pública.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT