O idoso sob a ótica do direito do consumidor: um hipervulnerável e a sua necessária proteção

AutorCristiano Heineck Schmitt e Camila Possan de Oliveira
Páginas369-392
4
O IDOSO SOB A ÓTICA DO DIREITO
DO CONSUMIDOR: UM HIPERVULNERÁVEL
E A SUA NECESSÁRIA PROTEÇÃO
Cristiano Heineck Schmitt
Doutor e Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da UFRGS. Pós-graduado
pela Escola da Magistratura do Rio Grande do Sul-Ajuris. Professor da Escola de
Direito da PUCRS. Professor de Cursos de Especialização – Pós-graduação em
Direito, Membro da Comissão Especial de Defesa do Consumidor da OAB/RS.
Membro do Conselho Municipal de Defesa do Consumidor de Porto Alegre/RS.
Diretor do Instituto Brasilcon. Autor de livros e de artigos jurídicos, Membro da
Câmara de Saúde Suplementar da Agência Nacional de Saúde Suplementar –
ANS. Advogado.
Camila Possan de Oliveira
Mestre em Direito do Consumidor e da Concorrência na UFRGS. Especialista
em Direito Bancário, em Direito do Consumidor e em Direito Processual Civil.
Graduada em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS. Graduanda de Análise e
Desenvolvimento de Sistemas na Uniritter.
Sumário: 1. Introdução – 2. A mudança de paradigma nas relações contratuais: a proteção do
“mais fraco”; 2.1 A inuência do direito social sobre o direito contratual; 2.2 A vulnerabilidade
do consumidor no mercado de consumo – 3. A “hipervulnerabilidade” do consumidor idoso;
3.1 O reconhecimento de uma “hipervulnerabilidade” contratual do consumidor idoso; 3.2
Situações paradigmáticas de proteção especial ao consumidor idoso – 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
A defesa do consumidor, no ordenamento jurídico pátrio, trata-se de di-
reito fundamental expresso na Constituição Federal,1 sendo nela igualmente
apresentado como princípio conformador da ordem econômica,2 sendo um dos
fundamentos do Estado e instrumento para constituir-se em uma sociedade livre,
1. Assim, inciso XXXII do artigo da Constituição Federal. Acrescenta-se o fato de que a própria
Constituição Federal ter ordenado ao legislador ordinário, através do artigo 48 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, a redação de um diploma consumerista, o que ocorreu no ano de 1990,
muito embora o período de vacatio legis tivesse postergado a vigência da referida norma para o ano de
1991.
EBOOK TUTELA JURIDICA DA PESSOA IDOSA 2ED.indb 369EBOOK TUTELA JURIDICA DA PESSOA IDOSA 2ED.indb 369 04/10/2022 10:28:4504/10/2022 10:28:45
CRISTIANO HEINECK SCHMITT E CAMILA POSSAN DE OLIVEIRA
370
justa e solidária,3 que garanta o desenvolvimento nacional,4 que busque erradicar
a pobreza e a marginalização, reduzindo as desigualdades sociais e regionais,5
promovendo o bem de todos,6 sem discriminação.7
O consumidor, por sua vez, é reconhecido como ente vulnerável no mercado
e nas relações de consumo, como expressa o inciso I do artigo 4º do Código de
Defesa do Consumidor. Considerando-se o fato de que a Constituição Federal
de 1988 promove intensa reformulação no direito privado, ao conceber a ideia de
criação de um diploma de proteção aos direitos do consumidor, reconhecemos
que existe um nova denição de igualdade no direito contratual, ou seja, um
igualdade dos desiguais, a qual somente será alcançada com a intervenção estatal
nas relações particulares, “assegurando direitos aos mais fracos, por exemplo, os
consumidores, e impondo deveres para os mais fortes, como os fornecedores de
produtos e serviços na sociedade de consumo ou no mercado brasileiro.8
Não podemos tratar como um mero assistencialismo a tendência a pro-
teger o mais fraco – um favor debilis – na tutela de defesa do consumidor. O
que se objetiva com esta tutela especial, como ensinam Benjamin e outros, é
“a superação da ideia – comum no direito civil do século XIX – de que basta a
igualdade formal para que todos sejam iguais na sociedade”.9 Em verdade, ao
se pugnar por uma tutela efetiva de proteção do consumidor, a pretensão vol-
ta-se ao equilíbrio das relações negociais, o qual poderá ser maculado diante de
eventual abuso do detentor dos meios de produção, responsável pela inclusão
de bens e serviços no mercado.
Em razão disto, alguns questionamentos precisam ser levantados como: há
realmente uma “hipervulnerabilidade” de determinadas categorias de consumido-
res, especicamente, os consumidores idosos? Existem elementos normativos que
possam indicar a preocupação com esta categoria de indivíduos? Estaria havendo
um reconhecimento judicial desta situação especíca, promovendo uma nova
hermenêutica-jurisdicional no campo das relações contratuais?
7. Assim, caput do artigo 5º da Constituição Federal.
8. BENJAMIN, Antônio Herman V.; BESSA, Leonardo Roscoe e MARQUES, Claudia Lima. Manual de
Direito do Consumidor. São Paulo: Ed. RT, 2007. p. 30-31.
9. Manual... cit., p.31. Segundo Benjamin e outros, reconhece-se que “alguns são mais fortes ou detêm
posição jurídica mais forte (em alemão, Machtposition), detêm mais informações, são experts ou pros-
sionais, transferem mais facilmente seus riscos e custos prossionais para os outros, reconhecimento de
que os “outros” geralmente são leigos, não detêm informações sobre os produtos e serviços oferecidos no
mercado, não conhecem as técnicas de contratação de massa ou os materiais que compõem os produtos
ou a maneira de usar os serviços, são pois mais vulneráveis e vítimas fáceis de abusos” (idem).
EBOOK TUTELA JURIDICA DA PESSOA IDOSA 2ED.indb 370EBOOK TUTELA JURIDICA DA PESSOA IDOSA 2ED.indb 370 04/10/2022 10:28:4504/10/2022 10:28:45

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT