A proteção dispensada à pessoa idosa pelo direito consumerista é suficiente como uma intervenção reequilibradora?

AutorClaudia Lima Marques e Fernanda Nunes Barbosa
Páginas307-330
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A PROTEÇÃO DISPENSADA À PESSOA
IDOSA PELO DIREITO CONSUMERISTA É
SUFICIENTE COMO UMA INTERVENÇÃO
REEQUILIBRADORA?1
Claudia Lima Marques
Doutora e Pós-Doutora em Direito pela Universidade de Heidleberg, Alemanha.
Mestre em Direito pela Universidade de Tübingen e Especialista em Direito
Europeu pela Universidade do Sarre, Alemanha. Professora Permanente do
PPGD/UFRGS. Presidente do Committee on International Protection of Con-
sumers, ILA (Londres). Editora-Chefe da RDC (Brasilcon/RT). Advogada. E-mail:
dirinter@ufrgs.br.
Fernanda Nunes Barbosa
Doutora em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Professora da Graduação em Direito e do Mestrado em Direitos Humanos do
UniRitter. Editora da Série Pautas em Direito/Editora Arquipélago. Advogada.
E-mail: fernanda@tjnb.adv.br.
Ao se proteger o hipervulnerável, a rigor quem verdadeiramente acaba beneciada é a pró-
pria sociedade, porquanto espera o respeito ao pacto coletivo de inclusão social imperativa,
que lhe é caro, não por sua faceta patrimonial, mas precisamente por abraçar a dimensão
intangível e humanista dos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade.
(REsp 931.513/RS, 1ª Seção, j. 25.11.2009, rel. p/ Acórdão Min. Herman Benjamin, DJe 27.09.2010)
Sumário: 1. Introdução – 2. O idoso como consumidor hipervulnerável e a proteção do Código
de Defesa do Consumidor – 3. A proteção do idoso no cenário nacional pós Lei 10.741/2003
(Estatuto do Idoso) e o diálogo das fontes – 4. A insuciência da proteção da pessoa idosa no
crédito ao consumo e o superendividamento: a necessidade de aprovação do PL 3515/2015
– 5. Nota Conclusiva.
1. Nota da Coordenação: Artigo publicado anteriormente em TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado;
MENEZES, Joyceane Bezerra de. Gênero, vulnerabilidade e autonomia: repercussões jurídicas. 2 ed.
Indaiatuba, SP: Foco, 2021, p. 371-393 e anterior à promulgação da Lei 14.181, de 1º de julho de 2021,
de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e
dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. Para a presente publicação optou-se
por manter a integridade do texto.
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CLAUDIA LIMA MARQUES E FERNANDA NUNES BARBOSA
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1. INTRODUÇÃO
No Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geograa e Estatística (IBGE),
existem hoje 31,981 milhões de idosos (maiores de 60 anos), correspondendo a
15,4% de nossa população, sendo a população com mais de 80 anos já de 2,2%,
correspondendo a 4,524 milhões de pessoas.2 No ano de 2018, o IBGE divulgou
uma nova pesquisa sobre a projeção demográca brasileira, que aponta o rápido
e intenso processo de envelhecimento no país. Desde 2012, mais 4,8 milhões de
pessoas passaram para a condição de idoso no Brasil e o crescimento deste grupo
etário, em cinco anos, foi de 18%.3
Essa é uma tendência mundial, e que decorre tanto do aumento da expecta-
tiva de vida pela melhoria nas condições de saúde quanto pela questão da taxa de
fecundidade, que tem decaído.4 Ainda que o princípio democrático não induza a
um “governo da maioria”, mas, ao contrário, que sociedades de fato comprometidas
com valores democráticos devem ser plurais e inclusivas, será que esse aumento
quantitativo tem gerado um correspondente aprimoramento dos direitos, garan-
tias e respectivos mecanismos de defesa do idoso no país?
A Constituição Federal brasileira, já em seu Art. 3º aponta, como objetivos
fundamentais da República Federativa do Brasil: “I – construir uma sociedade livre,
justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza
e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o
bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras
formas de discriminação.” No Artigo 5º, inciso XXXII, impõe ao Estado o dever
de proteção dos consumidores: “O Estado, na forma da lei, promoverá a defesa
do consumidor.” No Art. 230, por sua vez, o legislador constituinte positivou ser
dever da família, da sociedade e do Estado “amparar as pessoas idosas, assegu-
rando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar
e garantindo-lhes o direito à vida.5 Verica-se aqui, de diferentes formas, o claro
mandamento de proteção do idoso, em especial se consumidor.
2. Os dados sobre o envelhecimento do Brasil são: População total Brasil: 207,853 milhões. População
60+= 31,981 milhões – 15,4% (Homens-14,170 milhões; Mulheres-17,811 milhões); População 80+=
4,524 milhões – 2,2% (Homens- 1,760 milhões; Mulheres-2,764 milhões). Fonte: Dados do IBGE a
partir do PNAD continuado, relatório anual, acessível: [https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/
populacao/17270-pnad-continua.html?edicao=24437&t=resultados]. Acesso em: 30.08.2019.
3. Disponível em: [https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/
noticias/20980-numero-de-idosos-cresce-18-em-5-anos-e-ultrapassa-30-milhoes-em-2017]. Acesso
em: 20.07.2019.
4. Disponível em: [https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/
noticias/20980-numero-de-idosos-cresce-18-em-5-anos-e-ultrapassa-30-milhoes-em-2017]. Acesso
em: 20.07.2019.
5. Na íntegra, dispõe o art. 230 da CF/88: “Art. 230. A família, a sociedade e o Estado têm o dever de
amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e
bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. § 1º Os programas de amparo aos idosos serão executados
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