Introdução

AutorAndré Cyrino
Ocupação do AutorProfessor Adjunto de Direito Administrativo (UERJ); Mestre e Doutor pela UERJ; LL.M. (Master in Laws) pela Yale Law School (EUA); Procurador do Estado (RJ) e Advogado
Páginas1-23
INTRODUÇÃO
1. Por que estudar a relação entre Constituição e regu-
lação da economia?
A EC nº 26/2001 incluiu o direito à moradia no elenco
dos direitos do art. 6º da Constituição. Qual o sentido e o
alcance de tal previsão constitucional? Qual o seu impacto
jurídico sobre a legislação ordinária e as políticas públicas
em geral? Animados pela constitucionalização do novo di-
reito, proprietários de um único imóvel passaram a postu-
lar em juízo o reconhecimento da revogação (não recepção)
do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/90, incluído pela Lei nº
8.245/91. Tal norma excepciona a regra da impenhorabili-
dade do bem único do fiador em contratos de locação, para
a satisfação do crédito do locador.
No RE nº 407.688-SP1, o Supremo Tribunal Federal
proclamou a constitucionalidade da referida exceção legal.
O Min. Cezar Peluso destacou em seu voto que a proteção
do direito à moradia (art. 6º, CF) pode abranger a possibi-
lidade de penhora do imóvel único do fiador. Segundo o
Ministro, a previsão legal promove o direito à moradia dos
locatários, na medida em que o estabelecimento de garan-
tias efetivas àqueles que são proprietários cria um ambien-
te de incentivos necessários à oferta de imóveis para loca-
ção. Essas garantias terão o condão de estimular a decisão
1
1 STF, RE nº 407.688/SP, rel. Min. Cezar Peluso, j. 08.02.2006.
dos proprietários por disponibilizar seus bens para aluguel,
mesmo quando os pretensos locatários só tenham como fia-
dor alguém que possua um único imóvel.
Com efeito, a ratio do legislador foi a de criar um am-
biente econômico que facilitasse o acesso à moradia por in-
termédio de contrato de locação. Considerando-se serem
muitos os brasileiros — em geral, os menos favorecidos —
que vivem em imóveis alugados, a preocupação do legisla-
dor se justifica. De fato, o legislador, em seus prognósticos
sobre o mercado de habitações, buscou viabilizar o acesso à
moradia de um grande número de pessoas que teriam enor-
me dificuldade para encontrar um fiador proprietário de
mais de um imóvel. Caso a lei não previsse a garantia em
questão, o direito à moradia de um grande contingente de
brasileiros poderia ser inviabilizado, seja porque menos
imóveis seriam oferecidos no mercado de locações, seja
porque o preço dos aluguéis seria afetado diante do incre-
mento do risco do inadimplemento (maior o risco, maior o
aluguel). Ressalte-se que a fiança, ao tempo da decisão do
STF, era o instrumento de garantia de cerca de 89% dos 6,2
milhões de contratos de locação no Brasil2. Num outro giro,
o direito de propriedade (ainda que de um único imóvel)
pode cumprir uma função social relevante no caso: a de for-
necer uma garantia eficiente para os contratos de locação,
de modo a promover um incentivo para a realização do di-
reito à moradia do locatário.
2
2 Segundo estatísticas do Sindicato da Habitação do Rio de Janeiro (SE-
COVI-RJ), cfr. informação retirada de: ARGUELHES, Diego Werneck.
Deuses pragmáticos, mortais formalistas: a justificação consequencialista de
decisões judiciais. Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006, p. 139.

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