A teoria da constituição econômica

AutorAndré Cyrino
Ocupação do AutorProfessor Adjunto de Direito Administrativo (UERJ); Mestre e Doutor pela UERJ; LL.M. (Master in Laws) pela Yale Law School (EUA); Procurador do Estado (RJ) e Advogado
Páginas73-144
CAPÍTULO 2
A TEORIA DA CONSTITUIÇÃO
ECONÔMICA
No broad rules will be adequate; principles of
interpretation do not operate like algorithms.
Law is not mathematics.”153
Cass Sunstein
2.1. Apresentação e conceito de Constituição econômica
Nesta parte do trabalho, estudaremos o papel do direi-
to constitucional positivo na economia, tendo por objeto
principal de análise a teoria da Constituição econômica,
vista como a solução teórico-normativa corrente de com-
preensão funcional da Carta Magna na realidade econô-
mica.
Direito e economia se relacionam numa tensão entre
ser e dever ser154. O direito (dever ser), quando lida com a
economia, arvora-se em instrumento de transformação do
ser, em instrumento de mudança da realidade. A Consti-
tuição econômica, neste sentido, o que foi (e é) radicaliza-
73
153 SUNSTEIN, Cass. The partial constitution, Cambridge: Harvard Uni-
versity Press, 1993, p. 156.
154 V. ORTIZ, Gaspar Ariño. Principios de Derecho Público Económico.
ed., Granada: Ed. Comares e Fundación de Estudios de Regulación, 2004,
p. 1.
do em alguns momentos, simboliza o anseio de transforma-
ção da realidade econômica do país. A Constituição econô-
mica significa a pretensão de criação de uma dada realidade
econômica. Tornar efetiva a Constituição econômica pres-
supõe interferir na realidade da economia de um país.
Como afirma Eros Roberto Grau155, concebendo-se a
Constituição econômica como o “conjunto de preceitos que
institui determinada ordem econômica (mundo do ser) ou
conjunto de princípios e regras essenciais ordenadoras da
economia, é de se esperar que, como tal, opere a consagração
de um determinado sistema econômico”.
Há diversos modos de ver o fenômeno em exame, o que
gera polêmica na doutrina especializada.156 Sabino Casse-
se157, por exemplo, refere-se a três sentidos distintos para
a expressão:
Primeiramente, para o autor italiano, “Constituição
econômica” designa as normas jurídicas formal ou material-
mente constitucionais, que versem sobre assuntos de con-
teúdo econômico, tais como as garantias à propriedade e à
livre iniciativa e aquelas relativas à empresa, cooperação e
desenvolvimento.
Uma segunda e mais ampla acepção partiria do pressu-
posto de que as relações entre o Estado e a economia não
podem ser baseadas apenas em normas. Constituição eco-
nômica seria, assim, um conjunto de institutos jurídicos
que sofrem as influências constantes da opinião pública,
sendo, portanto, constantemente mutáveis.
74
155 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988,
cit., p. 81.
156 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito econômico, São Paulo: 2003,
p. 74.
157 CASSESE, Sabino. La nuova costituzione economica, 3ª ed., Roma: Edi-
tori Laterza, 2005, pp. 3-5.
Finalmente, para Sabino Cassese, a expressão pode ter
um sentido ainda mais abrangente de modo a considerar
não apenas as leis e os institutos que possibilitam o diálogo
entre o Estado e a opinião pública, mas também a sua prá-
xis efetiva.
A par das divergências, é razoável sustentar que existe
uma coincidência de opiniões em torno da possibilidade de
se denominar como Constituição econômica os aspectos da
Constituição formal que disponham sobre a economia de
um país. Vital Moreira158, nesse sentido, conceitua Consti-
tuição Econômica como “o conjunto das normas e dos prin-
cípios constitucionais relativos à economia, isto é, que confi-
guram a ordem constitucional da economia”. P ara os nossos
fins, seguindo essa inspiração, quando aludimos à Consti-
tuição econômica, referimo-nos ao conjunto de regras,
princípios e postulados constitucionais que tenham por es-
copo a moldagem de um modelo de intervenção estatal na
economia. Trata-se do aspecto normativo do papel do Esta-
do no domínio econômico. É justamente tal configuração
de um sistema econômico pela Constituição o nosso objeto
de estudo.
Apresentado, brevemente, o sentido de Constituição
econômica, passaremos a analisar as relações existentes en-
tre a Constituição e o seu poder de conformação da econo-
mia. Afinal, se a Constituição é norma jurídica, cumpre
perquirir o seu conteúdo; o seu poder de transformar a rea-
lidade. Tal será o sentido jurídico da Constituição econô-
mica.
A nossa investigação passará pela experiência norte-
americana e pelo desenvolvimento da teoria na Alemanha,
75
158 MOREIRA, Vital. “A metamorfose da constituição econômica”, in Re-
vista de Direito do Estado, nº 2, 2006, p. 381.

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