Organização sindical

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Ocupação do AutorDesembargador do Trabalho de carreira do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região
Páginas420-433

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1. Registro sindical

Embora seja reconhecida a unicidade (art. 8º, II, da Constituição), o que limita a liberdade sindical1, e não seja permitidos indicato de empresa2, pelo menos teoricamente, parece, na prática, estar sendo desenvolvido o contrário. Diversamente dela, unidade sindical, quando surge um só sindicato por vontade própria e não por imposição de lei3, a unicidade é um critério legal que impede a existência de mais de um sindicato da mesma categoria na mesma base, representando um monopólio da representação.

Constata-se o aparecimento de infinitas categorias diferenciadas, fragmentando as anteriormente existentes. Categoria diferenciada é definida no § 3º do art. 511 da CLT:

§ 3º Categoria profissional diferenciada é a que se forma dos empregados que exerçam profissões ou funções diferenciadas por força de estatuto profissional especial ou em consequência de condições de vida singulares.

E existem vários sindicatos verdadeiramente de empresas já instalados, e alguns registrados perante o Estado, a partir de registro promovido com o advento da Instrução Normativa n. 05, de 15.02.1990, e presentemente regulado pela Portaria n. 326, de 01.03.2013. Esse registro oficial está em consonância com o Verbete 295 do Comitê de Liberdade Sindical da OIT:

Verbete 295 - O direito de reconhecimento mediante o registro oficial é um aspecto essencial do direito de sindicalização.

A Portaria n. 326/2013 cuida desse tema, relativo às entidades sindicais de primeiro grau (art. 1º), tendo os pedidos de registro e de alteração estatutária de entidades de grau superior permanecido sob as regras da Portaria n. 186, de 10.04.2008 (art. 50).

O registro é feito no Cadastro Nacional de Entidades Sindicais (CNES) do M.T.E., em observância ao decidido pelo STF no MI 144-8-SP, e a partir da Súmula n. 677 da Suprema Corte, que diz:

Súmula n. 677 - Até que lei venha a dispor a respeito, incumbe ao Ministério do Trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade.

Assim deve ser, não obstando a edição de lei futura, necessário o registro, podendo a solicitação para esse fim ser formulada por meio eletrônico para o endereço (art. 2º da Portaria n. 326/2013), cabendo à Coordenação-Geral de Registro Sindical (CGRS), da SRT, a análise desses pedidos.

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Efetuada a publicação do pedido de registro, entidade sindical do mesmo grau ou com pedido registro público no Diário Oficial da União, terá o prazo de trinta dias para eventuais impugnações, a partir da publicação, e, havendo controvérsia, passará por tentativa de mediação, no âmbito do Poder Executivo (art. 22 e seguintes da Portaria n. 326/2013), e, se inexistir solução, o Secretário de Relações de Trabalho indeferirá o registro impugnado (§ 9º do mesmo artigo).

Anteriormente, imediatamente após a impugnação, o processo de registro era encaminhado ao Judiciário para decidir, o que, em nosso entendimento, é o mais correto, afastando, efetivamente, a intervenção do Estado enquanto administração dessa atividade de ingerência nos sindicatos.

O sistema brasileiro de registro sindical guarda grande semelhança com o adotado em França. Ali, o regis-tro objetiva mera publicidade (art. L. 411-3, do Code du Travail). O liberalismo da lei francesa exige apenas o depósito na Prefeitura dos estatutos sindicais, com o nome dos primeiros dirigentes. Para uniões e federações, são exigidas mais duas formalidades: a indicação dos nomes e da sede social dos sindicatos componentes e os estatutos devem conter certas regras sobre a representação dos sindicatos aderentes nas assembleias gerais e nos órgãos administrativos. Se não houver o depósito, o sindicato não adquire personalidade, ficando impedido de estar em juízo e de constituir seção sindical, mas podendo concluir convenção coletiva, como assinalado por Lyon-Caen & Pélissier4.

No México, a LFT de 1970 determina que os sindicatos devem registrar-se na Secretaria de Trabalho e Previdência Social ou perante as Juntas de Conciliação e Arbitragem, conforme sejam de competência federal ou local (art. 365), e, na Secretaria, necessariamente as federações e confederações (art. 384). Nesse particular, no comentário de Trueba Urbina & Trueba Barrera, referindo-se aos prazos de sessenta dias para a autoridade competente se manifestar sobre o registro solicitado, e de três dias da solicitação para esse pronunciamento, se tiene por registrado el sindicato y desde ese momento goza de personalidad jurídica5.

O art. 39 da Constituição da Itália admite, segundo Santoro-Passarelli, que il princípio de la liberta sindacale é un’applicazione particolare del principio costituzionale de la libertà di associazione (art. 18)6, sendo livre a sua organização (1º parágrafo), devendo ser efetuado registro em escritórios locais ou centrais, conforme a lei (2º parágrafo), inclusive dos respectivos estatutos, que devem conter regras internas com bases democráticas (3º parágrafo). Visa esse registro apenas o controle de validade, no sentido de mero controle de legitimidade e não de mérito7.

Nos Estados Unidos da América, onde são intensas as relações coletivas, o National Labor Relations Act (Lei Nacional de Relações de Trabalho = Lei NLRA), a chamada Lei Wagner, de 1935, define sindicato e regula sua atuação, instituindo um sistema de registro de associações profissionais perante o Ministério Nacional do Trabalho, apenas para efeito de aquisição de personalidade jurídica8.

Na Argentina, a Constituição limita-se a prever a organização sindical livre e democrática, reconhecida pela simples inscrição em um registro especial (art. 14 bis, 1º parágrafo, final)9. Por esse preceito constitucional, é livre a organização (1º parágrafo), devendo ser efetuado registro em escritórios locais ou centrais, conforme a lei (2º parágrafo), inclusive dos respectivos estatutos, que devem conter regras internas com bases democráticas (3º parágrafo).

O modelo brasileiro alinha-se com a posição adotada pelo Comitê de Liberdade Sindical da OIT, que, no verbete n. 275, registra:

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Verbete 275 - Se as condições para conceder o registro equivalessem a exigir uma autorização prévia das autoridades públicas para a constituição ou para o funcionamento de um sindicato, se estaria diante de uma manifesta infração da Convenção n. 87. Não obstante, este não parece ser o caso quando o registro do sindicato consiste unicamente numa formalidade cujas condições não são de natureza que ponha em perigo as garantias previstas pela Convenção10.

É, porém, indispensável e necessário o registro civil, eis que a questão pode envolver uma entidade sindical que não seja no desempenho das atividades elencadas no art. 8º da Constituição, mas como uma pessoa jurídica comum. E então? Então, sem o registro civil, apenas com o registro sindical, será embaraçosa sua situação nas relações jurídicas fora da sua função primordial, qual a de cuidar dos interesses e dos direitos de toda a categoria e dos direitos individuais de seus integrantes. Questões como, v. g., uma ação de despejo movida pelo locador do imóvel ocupado por um sindicato, uma reclamação trabalhista intentada por um seu empregado, não terão, no polo passivo da relação, o sindicato, representante da categoria, mas o sindicato, pessoa jurídica de direito privado, cuja personalidade civil deverá ser provada mediante o registro comum, exigido a todas as pessoas dessa natureza.

Por outro lado, considerando a especificidade de sua atividade, o registro no M.T.E. tem a vantagem de identificar qual a entidade que, pelo menos em tese, representaria dada categoria, reconhecendo sua personalidade sindical, como observa Cássio Mesquita Barros Júnior11, embora para fim de autenticação, não de autorização. Trata-se de un mero controllo de legittimità, a que referiu Vicenzo Sinagra sobre o registro italiano dos sindicatos12. Nesses termos, não há impedimento para registro de dois ou mais sindicatos na mesma base territorial. Essa questão foge à competência do M.T.E., devendo ser resolvida pelas partes ou mediante ação judicial própria, intentada perante a Justiça do Trabalho, nos termos do art. 114, III, da Constituição, que define sua competência para questões dessa natureza.

Todavia, a personalidade jurídica civil do sindicato é adquirida não com esse registro especial, mas com o registro comum, semelhante a qualquer associação, como já assinalamos. A questão da representatividade, insista-se, que envolve necessariamente a participação em negociação coletiva e a distribuição da receita sindical, na orientação adotada pelo Comitê de Liberdade Sindical da OIT13, será resolvida, quando houver controvérsia, inclusive quanto ao recolhimento de contribuições, ou diretamente pelos interessados, ou mediante a ação própria, necessariamente na Justiça do Trabalho, conforme o inciso III do art. 114 da Constituição.

Dentro do campo do registro sindical, envolvendo diretamente a base territorial e, por corolário, a representatividade dos envolvidos, emerge o problema da sede do sindicato. Aparentemente aspecto sem maior relevância, o tema foi objeto de diversos enfrentamentos no M.T.E., quando da apresentação do pedido de registro de alguns sindicatos desmembrados. Concretamente, o caso do Sindicato dos Hotéis e Restaurantes dos...

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