Princípio da sustentabilidade

AutorAugusto César Leite de Carvalho
Páginas73-81

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Conforme já tivemos oportunidade de sustentar118, a expressão desenvolvimento sustentável consagrou-se, inicialmente, em documento enviado ao Clube de Roma, em 1974, por grupo de pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachussetts (MIT. Mas a ideia de sustentabilidade já estava presente, um pouco antes, no princípio 13 da Declaração de Estocolmo (1972:

"Com o fim de se conseguir um ordenamento mais racional dos recursos e melhorar assim as condições ambientais, os Estados deveriam adotar um enfoque integrado e coordenado de planejamento de seu desenvolvimento, de modo a que fique assegurada a compatibilidade entre o desenvolvimento e a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente humano em benefício de sua população"119.

A sustentabilidade está associada ao direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado que promova a sadia qualidade de vida, tal qual se reporta o art. 225 da Constituição. O seu art. 200, VIII da mesma carta política esclarece que a vida saudável, assim preconizada, inclui a proteção ao "meio ambiente de trabalho".

Compreender o Direito do Trabalho a partir dessa perspectiva ambiental atende à expectativa de ubiquidade ou transversalidade do Direito Ambiental (não há região do Direito que esteja imune à sua influência), ramo emergente da ciência jurídica que "trata de proteger a qualidade de vida, entendida em sentido amplo, de tal maneira que possa compreender a conservação da Natureza e a defesa do bem-estar físico, psíquico e material de toda a sociedade humana"120. Monereo e Rivas o dizem, arrematando:

"A ideia de desenvolvimento sustentável comporta em si a exigência de redefinir o conceito de progresso. Existe uma ruptura radical com a ideologia do progresso linear e com o paradigma tecnológico e econômico da civilização industrial moderna tal qual se vinha formulando. Aponta-se a necessidade de evitar o que se usa denominar progresso destrutivo."121

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No que concerne às relações laborais, o desenvolvimento sustentável é, em rigor, uma ideia elementar que se associa sobremaneira à convicção, sob as luzes vetoriais da dignidade da pessoa humana, de que não interessa ao atual padrão civilizatório o fomento incondicionado do emprego, senão que se devem proibir as condições de trabalho degradantes, aquelas que não considerem a preeminência do homem em qualquer processo produtivo. Como defende Villagrasa:

"O denominado desenvolvimento sustentável pretende compaginar e racionalizar o equilíbrio entre os objetivos económicos da produção industrial e a manutenção dos recursos naturais do planeta, em perspectiva de presente e de futuro, paliando as consequências negativas que os danos ambientais provocam sobre a biodiversidade ecológica"122.

Em igual direção, assinala Raimundo Simão de Melo:

"O desenvolvimento económico é aspiração de todos os povos, mas não se pode conceber um desenvolvimento predatório, sendo necessária a busca de um ponto de equilíbrio entre este e os demais interesses da sociedade, porque a preservação ambiental em todos os seus aspectos é outro precioso valor de que dependem as gerações presentes e futuras para sua coexistência digna. Não há campo mais fértil para a aplicação desse princípio do que no meio ambiente de trabalho, porque, enquanto o caput do art. 225 da Constituição Federal assegura a todos um meio ambiente equilibrado, o art. 1º da Lei Maior estabelece como fundamentos da República Federativa e do Estado Democrático de Direito, entre outros, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho"123.

Não em vão, o art. 170 da Constituição brasileira preceitua que a ordem económica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, em conformidade com os ditames da justiça social. Não consente, como se nota, que se cogite de liberdade de empresa sem responsabilidade social.

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Há dois desdobramentos do princípio da sustentabilidade que merecem especial destaque: a o da proteção preventiva; b o da responsabilidade pelo dano ambiental.

A proteção preventiva na perspectiva ambiental:

prevenção e precaução

O desenvolvimento humano comporta, em verdade, graus de sustentabilidade: quando a atividade econômica é imprescindível e o risco à saúde ou integridade física do trabalhador é tolerável, o sistema jurídico promove a mera monetização do dano potencial à condição humana e assegura, assim, o pagamento de adicionais de insalubridade ou periculosidade que servem de estímulo à adoção de meios que neutralizem ou eliminem a adversidade; quando o risco à higidez física do trabalhador supera níveis razoáveis de tolerância, inibe-se a atividade económica124, ou se a interdita125, pois mais forte que o valor do trabalho humano é o valor humano no trabalho.

A atuação do Estado, inclusive do Estado-juiz, na interdição de atividades que promovam o adoecimento, a mutilação ou a morte prematura do trabalhador tem matriz constitucional, dado que o art. 225, V da Lei Maior diz caber ao poder público "controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente".

Não é permitido à auditoria fiscal ou ao juiz, instados que sejam à vistoria ou à análise de local de trabalho insalubre ou de risco, omitir-se a pretexto de não haver regra legal descritiva da conduta ilícita. Se provocado, o juiz deve, ao contrário, interagir com outras áreas do conhecimento científico para prover jurisdição, à semelhança do que fez o Supremo Tribunal Federal ao decidir sobre a constitucionalidade da Lei n. 9.055/1995, que autorizava a produção e comercialização do amianto branco no Brasil. Ao decidir como relator na ADI 3937/SP, o Ministro Dias Toffoli revelou a importância da evolução da ciência na colmatação de normas jurídicas abertas:

"Quando Advogado-Geral da União, proferi parecer no sentido da constitucionalidade da Lei federal n. 9.055/95 (ADI 4.066 e pela inconstitucionalidade formal da Lei n. 3.579, de 7 de junho de 2001, do

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Estado do Rio de Janeiro, que dispõe sobre a substituição progressiva da produção e da comercialização de produtos que contenham asbesto."

"No entanto, a realização da referida audiência pública elevou o debate sobre a questão no Tribunal a outro patamar. Com efeito, a abordagem do tema sob diferentes perspectivas desvelou uma nova ordem de fatores a serem considerados no julgamento deste caso. Dentre eles, sobressai o fato de estarmos...

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