O processo de positivação da norma jurídica tributária e a fixação da tutela jurisdicional apta a dirimir os conflitos havidos entre contribuinte e fisco

AutorRodrigo Dalla Pria
Páginas63-94
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O PROCESSO DE POSITIVAÇÃO DA NORMA
JURÍDICA TRIBUTÁRIA E A FIXAÇÃO DA
TUTELA JURISDICIONAL APTA A DIRIMIR
OS CONFLITOS HAVIDOS ENTRE
CONTRIBUINTE E FISCO
Rodrigo Dalla Pria
1. Introdução1
As relações normativas existentes entre os sistemas jurí-
dicos material e processual se verificam nos três planos da
linguagem jurídico-positiva, a saber: o sintático, o semântico
e o pragmático. É neste último (pragmático), no entanto, que
1. Tomamos a liberdade de substituir, nesta 2ª Edição do “Processo Tribu-
tário Analítico”, o texto introdutório ao trabalho, para uma versão que, de
certa forma, parece-nos mais técnica e “atemporal” do que a primeira. Para
os leitores que não tomaram contato com a 1ª Edição da obra, transcrevo,
abaixo, o conteúdo completo da introdução original: “A falta de consenso dou-
trinário e jurisprudencial a respeito dos momentos e das circunstâncias em
que cada um dos inúmeros instrumentos processuais colocados à disposição
dos jurisdicionados devem ser manejados, vem gerando, em todo universo do
direito (público e privado), uma instabilidade que, imediatamente, acarreta
um desconfortável sentimento de insegurança jurídica e, em última instância,
acaba por macular a ideia de Estado de Direito.
Algumas ações, especialmente no âmbito tributário, têm sido manuseadas
de maneira promíscua e leviana, como se fossem instrumentos dotados de
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PROCESSO TRIBUTÁRIO ANALÍTICO
residem os critérios de fixação das espécies de tutelas jurisdi-
cionais especialmente delineadas pelo sistema jurídico para
compor cada uma das formas de manifestação da conflituosi-
dade jurídico-material.
Uma pretensão é juridicamente apta se, e somente se, tem
capacidade de “realizar”, pragmaticamente, o direito material
dito violado. Eis aí a noção de interesse processual, construída
a partir da ideia de “relação de adequação”, que vincula a
“patologia”, consubstanciada no direito material violado (ou
ameaçado), à espécie de tutela jurisdicional capaz de suplantá-la.
No âmbito da processualidade tributária, especificamen-
te, o vínculo de adequação que se estabelece entre o direito
material tributário conflituoso e os instrumentos processuais
previstos pelo regime geral e especial de direito processual
um ecletismo capaz de adaptá-las às mais variadas situações, sendo utiliza-
das como verdadeiros curingas. O exemplo clássico é a “plurieficaz” ação
declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária que, sob o manto
da imprescritibilidade, costuma ser admitida a qualquer momento: antes,
durante e depois da constituição definitiva do crédito e até mesmo após a
instauração do processo de execução fiscal.
Ora, se há uma ação multiuso, não seria necessária a previsão de outros ins-
trumentos processuais, cada um com rito e eficácia próprios, delineados de
maneira a compor os conflitos substanciais individualmente considerados.
Contribui para o agravamento desta situação a circunstância de que a noção
de autonomia da norma processual em relação à norma material estar sendo
objeto de distorções que acabam por infirmar o caráter uno e sistêmico do
direito positivo. Tem-se tratado o vocábulo autonomia como sinônimo de
independência, o que pressupõe, por via de consequência, a existência de
dois sistemas de direito, um substantivo e outro adjetivo.
São por estas razões que, tomando como premissa maior a teoria da norma
jurídica e o sistema de referência proposto por Paulo de Barros Carvalho e
Lourival Vilanova, tentaremos demonstrar, de maneira clara e racional, que
a eficácia do sistema jurídico-processual no cumprimento de sua função
precípua, i. é, a composição de litígios, induz um ajustamento preciso do
instrumento processual utilizado ao direito material que instrumentaliza,
levando em conta todas as suas peculiaridades. Para tanto, faz-se necessário
um breve apanhado das premissas sobre as quais serão edificadas as ideias
principais deste trabalho.”
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PROCESSO TRIBUTÁRIO ANALÍTICO
pode ser observado a partir da identificação do momento em
que se encontra o processo de positivação do direito tributário.
Neste contexto, e fazendo uso do sistema de referência e
das categorias jurídico-cognitivas fornecidos pelo Constructi-
vismo Lógico-semântico, conforme proposto por Paulo de
Barros Carvalho e Lourival Vilanova, tentaremos demonstrar,
de maneira clara e racional, que a eficácia do sistema jurídico-
processual no cumprimento de sua função precípua, i. é, a
composição de litígios, induz um ajustamento preciso do ins-
trumento processual utilizado ao direito material cuja efetiva-
ção se pretende atingir, levando em conta todas as suas pecu-
liaridades.
Para isso, no entanto, parece-nos oportuno um breve
apanhado das premissas sobre as quais serão edificadas as
ideias principais deste trabalho.
2. A norma jurídica completa
A norma jurídica é a estrutura hipotético-condicional
composta por antecedente (delineamento de um determinado
fato), denominado hipótese, cuja efetiva ocorrência dará ense-
jo a uma consequência, que, invariavelmente, será uma relação
jurídica que vinculará dois sujeitos de direito.
Esta estrutura possui composição dual, podendo ser des-
membrada em duas outras: a norma jurídica primária, que
prevê o nascimento de uma relação jurídica de direito material,
prescritiva de direitos e deveres entre os sujeitos que lhe inte-
gram; e a norma jurídica secundária, que surgirá do descum-
primento da relação jurídica de direito material, sendo esta sua
hipótese, dando oportunidade ao nascimento de outra relação
jurídica, agora de natureza processual, cuja finalidade será por
fim à conflituosidade verificada no âmbito substancial.
Nas palavras de Lourival Vilanova, norma primária (oriun-
da de normas civis, comerciais, administrativas) e norma se-
cundária (oriunda de norma de direito processual objetivo)

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