Ressignificações da curatela a partir do reconhecimento social da pessoa idosa com deficiência

AutorDóris Ghilardi e Larissa Tenfen Silva
Páginas401-423
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Capítulo 16
RESSIGNIFICAÇÕES DA CURATELA A PARTIR DO
RECONHECIMENTO SOCIAL DA PESSOA IDOSA COM
DEFICIÊNCIA
Dóris Ghilar di1
Larissa Tenfen da Silva2
1. Introdução
Refletir sobre os postulados e instrumentos jurídicos é um
exercício constante que remete o intérprete e o aplicador do Direito ao
desfio pela busca de novas respostas e reformulações necessárias do
sistema jurídico com intuito de aproximar a realidade jurídica das
necessidades e anseios da realidade social, oportunizando novas lentes para
ressignificações pessoais, sociais e/ou normativas.
Neste contexto, os vintes anos do Código Civil (Lei n.
10.406/2002) chegam para estimular a reflexão da própria legislação
civilista e sua transformação a partir da revogação do antigo Código Civil
de 1916, do seu sedimentado paradigma interpretativo e da recepção de
outras orientações e direitos advindos dos influxos da matriz
1 Doutora e Mestre em Ciências Jurídicas. Professora Adjunta da Universidade Federal de
Santa Catarina UFSC, vinculada ao Centro de Ciências Jurídicas (graduação) e ao
Programa de Pós Graduação em Direito PP GD (mestrado e doutorado), com projeto de
pesquisa vinculado ao Direito Privado. Coordenadora do Grupo de Pesquisa em Direito de
Família e Sucessões em Perspectiva GFAM. Fundadora da Rede de Pesquisa em Direito
de Família - REFAM.
2 Doutoranda em Direito de Família pelo Programa de Pós Graduação em Direito - PPGD
- da Universidade Federal de Santa Catarina UFSC. Mestre em Direito. Professora da
Graduação e Pós Graduação em Dire ito da Faculdade Cesusc (Florianópolis/SC).
Coordenadora do Grupo de Extensão em Direito das Famílias (GEDIFAM) do Curso de
Direito da Faculdade Cesusc. Advogada. Presidente da Comissão da Pessoa Idosa do
IBDFAM/SC e membro d as Comissões da Pessoa Idosa e das Famílias e Sucessões da
OAB/SC.
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constitucional. O reconhecimento social da pessoa humana e de suas
dimensões específicas, a partir da tutela de novos valores sociais
albergados sob a roupagem dos direitos fundamentais, em especial, do
princípio da dignidade, fornecem um arcabouço para revisitar os institutos
civilistas.
A afirmação do primado da repersonalização do Direito Civil vem
justamente neste sentido de valorização da pessoa humana e do seu
desenvolvimento para além da proteção e defesa somente de interesses
patrimoniais. A pessoa humana é alguém concreto, qualificada em cada
relação sociojurídica que participa concretamente, de acordo com o valor
social da sua atividade e protegida mediante o seu grau de vulnerabilidade.3
E aqui está o grande desafio para o Direito Civil que, a partir da
instrumentalização de seus institutos, deve reconhecer e promover as
dimensões e direitos deste sujeito concreto para promoção de sua
personalidade sob a ótica dos direitos fundamentais nos seus espaços de
sociabilidade privada e social nitidamente marcado pela presença da
diversidade e vulnerabilidade.
Neste cenário, a afirmação da autonomia passa a ser um importante
pressuposto para, ao mesmo tempo, permitir o autorreconhecimento do
sujeito sobre si e buscar realizar a sua personalidade por meio de suas
escolhas de vida boa, bem como para proporcionar o reconhecimento
externo/social deste sujeito, inclusive por meio do Direito, para então
assegurar-lhe o exercício e a construção concreta da sua autonomia dentro
de contextos relacionais e de interdependência diante de sua
vulnerabilidade.
A curatela, enquanto instituto civilista presente no Livro de
Família do Código Civil apto a ser aplicado para proteção das pessoas
idosas e com deficiência passa por este mesmo influxo havendo a
necessidade de averiguar a sua compatibilização com os demais sistemas
de proteção da pessoa humana presentes no Estatuto do Idoso e no Estatuto
da Pessoa com Deficiência sob a orientação da nova hermenêutica Civil-
Constitucional.
Além disso, faz-se necessário a compreensão de quem é o sujeito
a quem ela se destinada, no caso, a pessoa idosa com deficiência. Neste
3 M EIRELES, Rose Melo Vencelau. Autonomia P rivada e Dignidade Humana. Rio de
Janeiro: Renovar, 2009, p. 15.

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