A saúde suplementar no Brasil - importância do compliance em todos os segmentos do setor

AutorAngélica Carlini
Ocupação do AutorPós-Doutorado em Direito Constitucional (PUC-RS)
Páginas1-19
1
A SAÚDE SUPLEMENTAR NO BRASIL –
IMPORTÂNCIA DO COMPLIANCE
EM TODOS OS SEGMENTOS DO SETOR
Angélica Carlini
Pós-Doutorado em Direito Constitucional (PUC-RS), Doutora em Direito Político e
Econômico (Mackenzie), Mestre em Direito Civil (UNIP), Professora Colaboradora
do Programa de Mestrado e Doutorado em Administração da UNIP, Coordenadora
da área de Direito da Escola de Negócios e Seguros em São Paulo. Vice-Presidente do
Instituto Brasileiro de Direito Contratual – IBDCONT.
Sumário: 1. Introdução. 2. Saúde suplementar no Brasil e regulação anômala. 3. Possibilidades
de aprimoramento do setor com programas de compliance. 4. Conclusão. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A saúde suplementar no Brasil tem previsão constitucional expressa contemplada
no artigo 199, que determina que a assistência à saúde é livre à iniciativa privada. A
Constituição Federal brasileira, nesse aspecto, não trouxe inovação ao contrário, apenas
reconheceu que o fenômeno da iniciativa privada atuando em saúde suplementar já era
um fato concreto no país e que naquele momento histórico, não havia como retroceder
e proibir a atuação da iniciativa privada nesse setor.
A saúde privada havia sido criada para atenção de funcionários das indústrias, em
especial da automobilística, que haviam se estabelecido na região do Grande ABC no
Estado de São Paulo especif‌icamente em cidades de São André, São Bernardo e São Cae-
tano do Sul a partir da década de 1050. Com as indústrias automobilísticas ali instaladas,
estabeleceu-se uma ampla cadeia de indústrias de suprimentos que f‌icou localizada na
mesma região do Grande ABC, próximo à cidade de São Paulo e também do porto de
Santos, localização estratégica para alimentar o f‌luxo de produção industrial e de dis-
tribuição dos produtos.
Naquele momento histórico a saúde no Brasil era pública apenas para os trabalha-
dores que possuíam contrato registrado em carteira de trabalho. Pessoas que viviam na
informalidade, população rural e todos os que não tivessem carteira de trabalho assinada
pelo empregador não tinham acesso ao sistema público de saúde. Nesses casos dependiam
da saúde benef‌icente representada, principalmente, pelas Santas Casas de Misericórdia
ou tinham que pagar pelos procedimentos realizados em instituições privadas.
A Constituição Federal de 1988 determinou que a saúde é direito de todos e dever
do Estado e, a criação do Sistema Único de Saúde pela Lei n. 8.080, de 1990, foi essen-
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cial para estabelecer o acesso à saúde no Brasil de forma universal e igualitária. Em ou-
tras palavras, todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país têm acesso ao SUS,
independentemente de qualquer contrapartida direta. A contrapartida indireta é feita
por meio do recolhimento de tributos que, no Brasil, incidem principalmente sobre o
consumo o que faz com que todas as camadas de renda da população contribuam para
a sustentação da saúde pública.
A Lei n. 8.080, de 1990, que criou o Sistema Único de Saúde estabeleceu no artigo
4º, parágrafo § 2º, que a iniciativa privada pode participar do sistema público em caráter
complementar. Assim, à luz da Constituição Federal e da lei que regulamenta as ativida-
des do SUS, a iniciativa privada é formalmente autorizada a atuar no país e, em caráter
complementar ao sistema público e único adotado.
A iniciativa privada tem atuado como autoriza a lei e, na atualidade, possui cerca de
47.067.369 milhões de usuários de planos de assistência médica em todo o país. Além
disso, possui 25.900.492 milhões de usuários de planos exclusivamente odontológicos1.
A mesma fonte informa que a saúde privada no Brasil em 2019 recebeu R$
213.457.018.559 em receita de contraprestações e, gastou R$ 174.539.061.631 em des-
pesas assistenciais, o que corresponde a 81% de sinistralidade, ou seja, de pagamento
de procedimentos de saúde para os usuários.
Este artigo tem por objetivo ref‌letir sobre as necessidades da implantação e fun-
cionamento de programas de compliance no setor de saúde privada, levando em conta
exclusivamente as operações de empresas de seguro saúde e medicina de grupo, em
relação a seus fornecedores de serviços e produtos da cadeia de suprimentos, entre os
quais se encontram, médicos, fabricantes e distribuidores de equipamentos, indústria
farmacêutica, indústria de fabricação e distribuição de dispositivos médicos implantáveis,
entre outros players nacionais e internacionais.
Essa ref‌lexão sobre compliance na cadeia de suprimento de saúde privada no Brasil
adquire importância quando a realidade contemporânea comprova a existência de máf‌ias
de próteses, ou, da formação de associações de especialidades médicas para ditarem preços
unif‌icados para determinadas regiões do país, de forma a impedir os planos de saúde de
terem acesso a práticas de concorrência entre prestadores de serviços.
Por se tratar de setor relevante para a sociedade brasileira, com 72 milhões de
usuários em saúde e odontologia, por movimentar bilhões de reais em assistência, por
ser custeada exclusivamente pelos próprios usuários, é preciso analisar mecanismos
de compliance para toda a cadeia de suprimento e, a relevância de todas as diferentes
empresas atuarem de forma concatenada, sob pena de não serem obtidos os melhores
resultados para os usuários e, nem para a própria sociedade brasileira.
A ref‌lexão deste trabalho está ancorada na hipótese de que sistemas de compliance
integrados e previstos regularmente em contratos entre fornecedores, poderão ser ef‌i-
cientes para aprimorar as relações entre operadoras de saúde e fornecedores e, qual a
repercussão disso para os para os usuários.
1. ANS. Disponível em: [https://www.ans.gov.br/perf‌il-do-setor/dados-gerais]. Acesso em: 27.06.2020.
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