A situação carcerária brasileira e a efetivação de direitos fundamentais: por uma releitura constitucional e convencional do indulto

AutorHamilton Gonçalves Ferraz/Fábio Prudente Netto/Vitor Jorge Gonçalves Vasconcelos
Ocupação do AutorProfessor de Direito Penal e Prática Penal (UNESA - Nova Friburgo)/Graduando em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ)/Graduando em Direito na Faculdade Nacional de Direito (UFRJ)
Páginas150-183
150 • CAPÍTULO 6
A situação carcerária brasileira e a efetivação
de direitos fundamentais: por uma releitura
constitucional e convencional do indulto
The Brazilian Prison System Situation and the Fundamental Rights
Efectivit y: For a Constitutio nal and Conventional Clemency’s Rereading
Hamilton Gonçalves Ferraz1
Fábio Prudente Netto2
Vitor Jorge Gonçalves Vasconcelos3
Resumo: O presente artigo tem como objeto de análise a
prática de concessão de indulto por parte do Chefe do Poder Exe-
cutivo da União. Cumpre informar que a pesquisa busca (i) analisar
1
Professor de Direito Penal e Prática Penal (UNESA - Nova Friburgo). Ex-
-Professor Substituto de Direito Penal e Criminologia (UFRJ). Professor
da Pós-Graduação Lato Sensu em Criminologia, Direito e Processo Penal
(UCAM). Doutorando em Direito (PUC-Rio). Mestre em Direito Penal
(UERJ). Bacharel em Direito (UERJ). Pesquisador do Núcleo Interame-
ricano de Direitos Humanos da Faculdade Nacional de Direito (NIDH-
-FND). Foi coordenador do Projeto de Pesquisa Laboratório de Ciências
Criminais e Direitos Humanos (LABCCRIM-DH). Advogado.
2
Graduando em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universi-
dade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ). Foi Pesquisador bolsista pela
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro - FAPERJ,
junto ao Observatório da Justiça Brasileira (OJB/UFRJ) e Monitor da Dis-
ciplina de Direito Constitucional II (Direitos Fundamentais) na Universi-
dade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ). Atualmente é estagiário no
Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.
3
graduando em Direito na Faculdade Nacional de Direito (UFRJ). Atua
como membro dos grupos de pesquisa de Novo Constitucionalismo Lati-
no-Americano e de Democracia e Participação na América Latina, vincu-
lados ao Laboratório INPODDERALES. Foi monitor bolsista de Direito
Constitucional III (Organização do Estado e Poderes). É Assistente Técni-
co-Legislativo, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
HAMILTON G. FERRAZ & FÁBIO P. NETTO & VITOR JORGE G. VASCONCELOS • 151
quais condições de concessão dos indultos, os quais são concedidos,
costumeiramente, pelo Presidente da República, (ii) investigar quais
as decisões do STF e da Corte IDH envolvem a situação carcerária e
a sua inuência na realidade prisional brasileira e (iii) os limites do
indulto frente à necessidade de sua materialização de acordo com
a jurisprudência dos Tribunais citados anteriormente. Admite-se,
ainda, que a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem parti-
cipação ativa em tal cenário, uma vez que sua jurisprudência busca
a efetivação de direitos fundamentais e a promoção da dignidade
da pessoa humana no sistema carcerário. Com vistas à solução do
problema, soma-se o fato de o Supremo Tribunal Federal adotar a
teoria do Estado de Coisas Inconstitucional, em sede de julgamento
de Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 347.
Palavras-chave: Indulto. Jurisprudência. Estado de Coi-
sas Inconstitucional. Estado de Coisa Inconvencional. Sistema
Carcerário.
Abstract: is paper analyzes the clemency given by the
Head of State. It’s important inform about this research seeks (i) to
analyse in which conditions the clemency is given by the President,
(ii) to investigate which Brazilian Supreme Court’s and Interameri-
can Court’s decisions are about the prison system and their inuence
in the Brazilian prison reality and (iii) what are the limits of clem-
ency in front of the necessity of their materialization according to
Courts jurisprudence. e Interamerican Humans Rights Court has
active participation in this scenario, once their jurisprudence tries to
seek human rights eectiveness and the people’s dignity promotion
in the prison system. As well as, in order to solve the problem, Un-
constitutional State of ings theory was adopted by the Brazilian
Supreme Court, in the procedure called “Ação de Descumprimento
de Preceito Fundamental 347”.
Keywords: Clemency. Jurisprudence. Unconstitutional State
of ings. Unconventional Stateof ings. Prison System.
Introdução
152 • CAPÍTULO 6
Em dezembro de 2017, pouco tempo após a promulgação
do Decreto de indulto nº 9.246/2017, expedido pelo Ex-Presidente
Michel Temer, a Procuradoria Geral da República ingressou junto ao
Supremo Tribunal Federal com a Ação Direta de Inconstitucionali-
dade 5.874, questionando os limites e a abrangência do poder de in-
dultar – o qual, concretamente, foi criticado por sua “leniência sele-
tiva”, uma vez que beneciaria diretamente condenados ou acusados
no seio da chamada “Operação Lava-Jato”. Em que pese o rechaço
da ADI pela maioria da Corte, destaca-se que os Ministros Barroso,
Fachin e Cármen Lúcia subscreveram os questionamentos da PGR.
No início de 2019, já no atual governo Bolsonaro, os limites
e a abrangência do poder de indultar foram novamente colocados
em questão, uma vez que o atual Presidente da República, após er-
tar com a ideia de simplesmente não indultar ninguém, por singe-
las razões punitivistas de segurança pública e retributivismo, voltou
atrás e expediu o Decreto 9.706, o qual, na contramão de todos os
decretos anteriores, é marcado por seu rigor excessivo, contemplan-
do apenas situações mais graves de cumprimento de pena, na forma
de um indulto meramente humanitário. A PGR restou silente; todos
os Ministros do Supremo, silentes.
As críticas, as discussões e os silêncios recentes em relação
ao indulto levantam importantes questionamentos jurídico-penais e
constitucionais: o que é, de fato, o indulto? É um mero poder discri-
cionário? Quais seus fundamentos e nalidades num Estado (que se
pretenda) Democrático de Direito? A realidade prisional brasileira,
marcada por violações estruturais, sistêmicas e massivas de direi-
tos humanos e fundamentais, afeta em alguma medida os limites e
possibilidades de indultar e, consequentemente, seu próprio status
jurídico no direito brasileiro?
A presente pesquisa buscará responder a essas indagações
a partir da análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal
(STF) e da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH),
realizando uma releitura dos indultos frente à realidade do sistema
carcerário brasileiro.
Em um primeiro momento, serão vericadas as condições
de concessão dos indultos, sua disciplina constitucional e legal, le-
vantando-se todos os decretos de indulto a partir de 1988. Na se-
quência, serão investigadas as decisões do STF e da Corte IDH que
envolvem a situação carcerária e a sua inuência na realidade prisio-

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