A ação: Como exercer a pretensão em juízo

AutorValdemar P. Da Luz
Ocupação do AutorAdvogado; Doutor em Direito Civil
Páginas27-56
Manual de Iniciação à Advocacia
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1 PROVIDÊNCIAS PRELIMINARES
1.1 Aceitação da causa
A consulta constitui, indiscutivelmente, o primeiro passo para o estabeleci-
mento da relação cliente/advogado. Em regra, é nela que o cliente passa a conhecer
ou a conrmar seus direitos. O cliente quer informações sobre um contrato, o
que é necessário para abertura de um inventário, enm, saber de suas chances se
iniciar determinada demanda.
Como judiciosamente lembra António Arnaut, “saber escutar e compreender
quem nos procura e em nós cona, é virtude indispensável. Um caso objetivamente
insignicante pode ser para o cliente uma questão de honra. Uma queixa por
injúrias leves, uma cobrança de quantia ridícula, ou uma ação por dois palmos de
terra, poderá não ter, para o advogado, dignidade processual. Mas tem para o
cliente se sua motivação for séria”.1
No atinente à aceitação da causa, a ação somente deverá ser proposta: depois
de estimular a conciliação entre as partes, prevenindo, na medida do possível, a
instauração do litígio2; se for juridicamente viável e o cliente tiver provas legítimas
e irretorquíveis dos fatos que lhes servirão de fundamento.
Demais disso, cumpre ao advogado informar o cliente, de forma clara e
inequívoca, quanto a eventuais riscos da sua pretensão, e das consequências que
poderão advir da demanda. Cabe lembrar, ainda, a recomendação do Código de
Ética e Disciplina da OAB, art. 2º, no sentido que o advogado deve abster-se de
“emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a
dignidade da pessoa humana” e que, em caso de lide temerária, o advogado será
solidariamente responsável com o seu cliente, desde que coligado com este para
lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria3.
1.2 Exame e viabilidade da ação
Antes de decidir-se pelo ajuizamento da ação, é de todo razoável que o
advogado examine, em primeiro, se estão presentes as condições da ação; em
segundo, quais as chances de obter o provimento judicial.
1 Cf. ARNAUT, Antônio. Iniciação à advocacia. Coimbra: Coimbra Editora, 1993. p. 121
2 Conforme recomendação do art. 2º, parág. único, VI, do Código de Ética e Disciplina.
3 Estatuto da Advocacia, art. 32, parág. único.
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Valdemar P. da Luz
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Constituem condições da ação a legitimidade das partes e o interesse processual.
A inexistência de qualquer dessas condições acarretará, pois, a extinção do processo
sem resolução do mérito.
Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade (art. 17, CPC).
A legitimidade das partes (ou qualidade para agir) é concebida como a legitimidade
da parte (legitimatio ad causam ) para demandar sobre o objeto da ação ou, em
relação ao réu, legitimidade para responder à ação. Entende-se, nesse sentido,
que somente o titular do direito pode pleiteá-lo em juízo.
Ainda que esse titular seja um menor, ou incapaz, poderá ingressar em juízo,
desde que representado ou assistido por seu responsável.
O interesse de agir diz respeito tão-somente à necessidade de obter, através
do processo, a proteção ao interesse do autor. Na ensinança de Liebman o “interesse
processual, ou interesse de agir, existe quando há para o autor utilidade ou ne-
cessidade de conseguir o recebimento de seu pedido, para obter por esse meio,
a satisfação do interesse (material) que cou insatisfeito com a atitude de outra
pessoa”4.
Destarte, depende o interesse de agir ou a necessidade de obter a tutela
jurisdicional da violação do direito do autor, seja ele moral ou econômico.
Na ação reivindicatória, por exemplo, o interesse de agir manifesta-se na
necessidade de a parte recorrer ao judiciário, para fazer valer o seu direito de
propriedade, tutelado pelo art.1.228 do C. Civil, diante da resistência dos possui-
dores, sem justo título, em entregarem o imóvel reivindicado.
Em relação à possibilidade jurídica como condição da ação, anteriormente pre-
vista no Código de 1973 e que diz respeito ao enquadramento do fato ou do direito
pleiteado à norma jurídica existente no ordenamento jurídico, tema que havia sido
mitigado pelo Superior Tribunal de Justiça, o CPC de 2015 nada dispõe a respeito, en-
sejando a presunção de que, ora em diante, “tudo o que não é proibido é permitido”.
No pertinente ao estudo da viabilidade da ação, ou das possibilidades de
êxito da demanda, muitas vezes se faz necessário ao advogado não só munir-se
de bons compêndios doutrinários, mas igualmente promover profunda pesquisa
jurisprudencial, máxime nos tribunais do Estado em que atua. No entanto, ainda
que se adotem essas cautelas, não será demasiado alertar o cliente para os even-
tuais riscos de toda a demanda, por mais fácil que no princípio ela pareça.
4 Enrico Túlio Liebmann. Estudos sobre o Processo Civil Brasileiro, São Paulo, 1947. p. 125.
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