Art. 6º da Lei n. 13.467/17 (Direito Intertemporal)

AutorCarlos Eduardo Oliveira Dias - Guilherme Guimarães Feliciano - José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva - Manoel Carlos Toledo Filho
Páginas261-289

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Art. 6º Esta Lei entra em vigor após decorridos cento e vinte dias de sua publicação oficial. Brasília, 13 de julho de 2017; 196º da Independência e 129º da República. MICHEL TEMER Torquato Jardim Ronaldo Nogueira de Oliveira

Este texto não substitui o publicado no DOU de 14.7.2017

Comentários de José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva

Dada a importância da temática do direito intertemporal relacionado à Lei da Reforma Trabalhista tomamos a liberdade de transcrever, nesta obra, o quanto escrito por um de seus autores, José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva, em obra de sua autoria recentemente publicada pela LTr Editora, na qual desenvolveu estudo aprofundado sobre as várias questões de direito material e processual que precisam ser analisadas, não sendo pertinente que se faça apenas rápidos comentários à regra deste art. 6º, que, conquanto singela, alcança inúmeras situações jurídicas.

Segue, portanto, parte substancial do Capítulo 2 da obra Magistratura e temas fundamentais do direito: reforma trabalhista e direito intertemporal, 2017, p. 99-138.

Nota introdutória

Promulgada e publicada a Lei n. 13.467/2017, questão tormentosa que se coloca é a relacionada à data correta da vigência desta lei, que envolve aspectos de direito material e processual nas inúmeras regras advindas da denominada Reforma Trabalhista. Não basta perquirir sobre contagem do prazo de vacatio legis, para se ter em conta a data em que termina o prazo de vacância de 120 dias estabelecido no art. 6º da lei em comento e a data em que se inicia a efetiva vigência da novel lei de regência que altera (e/ou acrescenta) 104 dispositivos da Consolidação. Há inúmeras situações jurídicas que reclamam interpretação particular; a título meramente exemplificativo, o regramento sobre justiça gratuita, honorários de perito, honorários de sucumbência — no campo processual —, bem como a normativa a respeito de horas de itinerário, de banco de horas, sobre o criticado contrato intermitente — no campo do direito material do trabalho.

De partida, convém recordar a noção básica do instituto objeto de análise, em seguida definir a data "geral" de vigência da nova lei, para, em seguida, sem qualquer pretensão de esgotamento da

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extensa temática, proceder-se à abordagem dos aspectos mais importantes do direito transitório quanto a alguns institutos atingidos, primeiramente no campo do direito material e posteriormente quanto aos aspectos processuais.

Vigência da Lei n. 13.467/2017

Há que se distinguir entre os planos de validade, vigência e eficácia da lei.

A validade diz respeito ao aspecto formal da lei, ou, ainda, ao seu aspecto material. Como já se disse, na perspectiva da formalidade, há de se observar rigorosamente o processo legislativo, sob pena de inconstitucionalidade formal, caso em que a lei não será considerada válida. Também é possível analisar a validade na perspectiva material. Toda vez que a lei ignora uma norma ou um princípio constitucional, fala-se em inconstitucionalidade material. O plano de validade, portanto, diz respeito a essa esfera, ao processo legislativo e à constitucionalidade material da lei.

(...) Quanto à vigência, ela exige que se verifique um outro critério: a publicação da norma.

Destarte, o plano de vigência diz respeito à obrigatoriedade da lei, após sua publicação. Para que a lei obrigue é necessário que ela esteja em vigor e, assim, possa produzir efeitos. Normalmente, há uma coincidência entre a obrigatoriedade (vigência) e a eficácia, já na data de publicação ou vencido o prazo de vacatio legis para que a lei entre em vigor. Assim, em regra, a lei vigente produz seus efeitos. Entretanto, há exceções, como ocorre com as leis orçamentárias, que são publicadas e entram em vigor, mas produzem seus efeitos apenas no ano vindouro (...).

Assim sendo, nem sempre há coincidência entre a vigência e a eficácia. Essa sutil distinção se torna bastante clara quando se estudam as classificações das normas constitucionais, quanto à sua eficácia, sobretudo no direito constitucional, falando-se em normas de eficácia plena, limitada e contida ou restringível. (...) Em suma, eficácia formal diz respeito à aplicabilidade da lei.

A respeito da contagem do prazo de vacância e entrada em vigor da nova lei — vigência da lei —, de se ponderar o quanto segue:

De acordo com o art. 1º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, Decreto n. 4.657/1942, "Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada". No entanto, sabe-se que "Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, se inicia três meses depois de oficialmente publicada" (§ 1º).

Ocorre que a Lei Complementar n. 95/1998, ao estabelecer normas para a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis no país, modificou essa diretriz. Com efeito, o art. 8º desta fonte normativa disciplina que a vigência da lei promulgada deve ser indicada "de forma expressa", sendo que o prazo de vacatio legis assinado deve ser razoável, para que, da lei, seus destinatários tenham "amplo conhecimento". Entrementes, permitiu-se que as leis de pequena repercussão possam entrar em vigor "na data de sua publicação". Neste particular, muito interessante o § 1º do referido dispositivo, incluído pela Lei Complementar n. 107/2001, o qual estabelece forma de contagem do prazo de vacatio legis, merecendo ser transcrito: "A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral".

Sendo assim, a data correta da vigência da Lei n. 13.467 é o dia 11 de novembro de 2017, consi-derando-se que a lei foi publicada no Diário Oficial em 14 de julho, com prazo de vacatio legis de 120 dias. Incluindo-se o dia da publicação e o do vencimento do prazo, os 120 dias se esgotaram em 10 de novembro, entrando a lei em vigor no dia seguinte, 11 de novembro, um sábado. Não importa se não houve expediente forense nesse dia, porquanto não se trata de prazo processual, mas de vacância para

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a melhor compreensão do sentido e do alcance da novel legislação. De igual modo, não há falar em prorrogação da vigência para o primeiro dia útil seguinte, 13 de novembro. Enfim, para a contagem de prazo de vacância não se leva em conta distinção entre normas de direito material e processual, de maneira que toda a extensa normativa (104 artigos alterados e/ou acrescidos à CLT) teve início de vigência (formal) na mesma data, insista-se, 11 de novembro.

O princípio da irretroatividade da lei

Contudo, a solução não é tão fácil assim. Diante das peculiaridades do direito material trabalhista e por conta dos institutos de processo que sofreram alteração ou foram incorporados ao processo do trabalho, como os honorários de sucumbência, há de se perquirir inúmeras situações jurídicas, para não se cometer o desatino de violar o princípio da irretroatividade das leis, uma garantia constitucional albergada no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição da República Federativa do Brasil.

Com efeito, a lei válida e em vigor é, em regra, plenamente aplicável, estando apta à produção de seus efeitos — processuais e materiais —, na chamada eficácia formal da lei. Entretanto, quando da vigência da lei nova ainda haverá situações jurídicas reguladas pela lei revogada, gerando um conflito de leis no tempo. Na doutrina geral do princípio da irretroatividade da lei, de se ter em mente que

(... ) em regra, a lei apresenta uma disciplina para o presente e para o futuro, não sendo compreensível que o legislador procure disciplinar as situações pretéritas. Daí porque a lei nova, embora tenha efeito imediato (art. 6º da LIDB), deve respeitar o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. Esta regra é tão importante que vem consubstanciada na Magna Carta como um direito fundamental, insculpido no inciso XXXVI do seu art. 5º, que é ainda mais enfático: "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".

(... )

Essa matéria é muito importante na resolução de questões relacionadas aos contratos, especialmente nos de trato sucessivo e de prestação continuada. Nestes, quando da vigência da lei nova, por vezes os efeitos contratuais ainda não foram produzidos na sua inteireza. (...) Surge a questão: a nova lei alcança ou não o contrato que já foi celebrado? No direito do trabalho a doutrina majoritária afirma ser o contrato laboral de trato sucessivo, surgindo, invariavelmente, problemas jurídicos quando da vigência de novas leis reguladoras das relações trabalhistas.

Para a solução destas questões se faz necessário o recurso ao chamado direito intertemporal, entendido como o conjunto de regras e princípios utilizados para a solução dos conflitos de leis no tempo. E o princípio mais destacado nessa temática é, indubitavelmente, o da irretroatividade das leis, insculpido no dispositivo constitucional mencionado linhas atrás. Para a aplicação prática deste princípio, recorre-se às ideias de ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada. (... )

O ato jurídico perfeito é aquele cujos efeitos já foram consumados sob a égide da lei anterior, ou seja, o ato ou negócio jurídico que já produziu todos os seus efeitos, nos moldes do § 1º do art. 6º da LIDB. Aí reside a sua diferença em relação ao direito adquirido. Exemplificando: se o trabalhador adquiriu o direito ao gozo de férias e o empregador já lhe concedeu o referido gozo, bem como efetuou o pagamento correspondente, não há falar em direito adquirido, mas em ato jurídico perfeito, tendo em vista que o direito já não tem mais efeitos a serem produzidos.

Quanto ao direito adquirido (§ 2º do art. 6º) (...), pode-se afirmar que o direito adquirido é aquele que provém de um fato, o qual ainda não produziu todos os seus efeitos, mas

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