As diretivas antecipadas de vontade no contexto protetivo do envelhecimento ativo

AutorLuciana Dadalto e Natalia Carolina Verdi
Páginas195-212
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AS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE
NO CONTEXTO PROTETIVO DO
ENVELHECIMENTO ATIVO
Luciana Dadalto
Doutora em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina da UFMG, Mestre em
Direito Privado pela PUCMG, Consultora Jurídica e Advogada s. Administradora
do portal www.testamentovital.com.br
Natalia Carolina Verdi
Messtre em Gerontologia pela PUCSP, Especialista em Direito Médico, Odon-
tológico e Hospitalar pela Escola Paulista de Direito, Especialista em Direito da
Medicina pelo Centro de Direito Biomédico da Faculdade de Direito da Univer-
sidade de Coimbra. Advogada Autônoma. Professora, Autora do blog www.
portaldoenvelhecimento.com.br/category/direitos-do-longeviver/
Sumário: 1. Considerações iniciais – 2. Envelhecimento ativo e a autonomia no ordenamento
jurídico brasileiro – 3. Pessoa idosa, Estatuto da Pessoa com Deciência e a tomada de decisões
para o m de vida – 4. Documentos de diretivas antecipadas de vontade e envelhecimento
ativo – 5. Considerações nais.
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Dois casos recentes ao redor do mundo evidenciaram a importância da
discussão sobre Diretivas Antecipadas de Vontade feitas por pessoas idosas. Por
essa razão, o presente artigo optou por discutir o tema no contexto protetivo do
Envelhecimento Ativo a partir deles para, posteriormente, apresentar os argu-
mentos éticos, bioéticos e jurídicos que circundam a temática.
Caso 1: Beatrice Weisman, uma senhora americana de 83 anos, sofreu
AVC em junho de 2013 e cou internada algumas semanas no Hospital Geral de
Maryland. Ela havia deixado um documento no qual se recusava a ser mantida
viva por aparelhos (testamento vital) e dava poderes para seu marido, Willian
Weisman, tomar decisões sobre cuidados de saúde em seu nome (procuração
para cuidados de saúde)
Diante da piora do quadro clínico, em agosto de 2013, William se reuniu com
seus lhos e, juntos, decidiram deixar claro para a equipe médica que Beatrice não
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gostaria de ser reanimada. Como procurador para cuidados de saúde, Willian
realizou o comunicado e determinou a anexação, em prontuário, do testamento
vital, da procuração para cuidados de saúde e da explicitação da ordem de não
reanimação, feita pelo procurador.
Ocorre que em 28 de agosto de 2013 Beatrice teve uma parada cardíaca e foi
reanimada pela equipe de plantão, que não observou seus documentos de Diretivas
Antecipadas de Vontade (DAV) e nem a decisão do procurador para cuidados de
saúde. Durante o procedimento de reanimação a paciente teve costelas quebra-
das e formou-se um pneumotórax. Além da massagem cardíaca, a equipe usou
desbrilador e aplicou epinefrina no intuito de reanimá-la.
Após um ano da reanimação, seu marido faleceu. Graças aos esforços da fa-
mília, Beatrice ainda está viva, reconhece seus familiares, mas precisa de cuidados
especiais durante vinte e quatro horas.
Seu lho Cristian ajuizou em 2016 uma ação judicial contra o Hospital
pedindo o reembolso das despesas hospitalares, no importe de U$ 250.000,00
(duzentos e cinquenta mil dólares) e o custeio com os cuidados de saúde com a
paciente até a data de sua morte, no importe de U$180.000,00 (cento e oitenta
mil dólares por ano), alegando, em apertada síntese que: a) as vontades da pa-
ciente foram ignoradas pela equipe; b) o descumprimento dos documentos de
DAV gerou graves danos psíquicos ao procurador designado pela paciente, que
se sentia culpado pelo descumprimento de sua vontade; c) a família gastou todo
seu patrimônio para garantir qualidade de vida à Beatrice, que cou com muitas
sequelas, algumas incuráveis; d) a paciente nunca desejou car viva na condição
em que se encontra.
Segundo a petição inicial, houve negligência do hospital uma vez que
A Sra. Weisman sofreu indesejadas, violentas e dolorosas intervenções médicas dolorosa
no nal de sua vida, em violação dos seus desejos expressos. Seu marido sofreu o estresse
de cuidar de uma esposa inválida, situação que, em última instância o levou à morte. Agora,
sofrerá com uma morte articialmente prolongada, gerando enormes gastos nanceiros
para sua família além de outros encargos. Ademais, passará o restante de sua vida de forma
contrária a seus valores e desejos.1
O hospital alegou em sua defesa que a manutenção da vida não representa
dano e que, no caso em questão, a paciente teve uma recuperação surpreendente.
Contudo, ignora que três anos após o ocorrido a paciente ainda questione a razão
de viver nas condições às quais está submetida.
1. WEISMAN vs MARYLAND GENERAL HOSPITAL. N. 24-C-16-004199. Disponível em: [www.
thaddeuspope.com/images/WEISMAN_v_Univ_Maryland_July_2016_resucitate_contra_POLST_.
pdf]. Acesso em: 08.10.2018.
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