Caracterização do direito do trabalho

AutorMauricio Godinho Delgado
Páginas47-79
CAPÍTULO I
CARACTERIZAÇÃO DO DIREITO DO TRABALHO
I. INTRODUÇÃO
O Direito do Trabalho é ramo jurídico especializado, que regula certo tipo
de relação laborativa na sociedade contemporânea. Seu estudo deve se iniciar
pela apresentação de suas características essenciais, permitindo ao analista
uma imediata visualização de seus contornos próprios mais destacados.
É o que será feito neste primeiro capítulo deste Curso: aqui serão estu-
dados tópicos como de nição, denominação, conteúdo e função do Direito
do Trabalho. Serão examinadas, também, a área do Direito em que ele se
situa e a divisão interna que caracteriza o ramo justrabalhista.
Em seguida (Capítulo II), serão examinados os traços que envolvem a
relação desse ramo especializado com o conjunto geral do Direito. Trata-se
de problemas como: autonomia do Direito do Trabalho, seu posicionamento
no plano jurídico geral (natureza jurídica) e, nalmente, suas relações com
outros ramos do universo do Direito.
Firmada uma consistente visão característica do Direito do Trabalho, o
analista passará, então, à retrospectiva de sua evolução histórica, quer no
mundo ocidental (Capítulo III), quer no Brasil (Capítulo IV).
Estes quatro capítulos, portanto, completam a apresentação inicial ao
leitor desse ramo jurídico especializado, o Direito do Trabalho.
II. DEFINIÇÃO
De nir um fenômeno consiste na atividade intelectual de apreender
e desvelar seus elementos componentes e o nexo lógico que os mantém
integrados. De nição é, pois, a declaração da estrutura essencial de deter-
minado fenômeno, com seus integrantes e o vínculo que os preserva unidos.
Na busca da essência e elementos componentes do Direito do Trabalho,
os juristas tendem a adotar posturas distintas. Ora enfatizam os sujeitos
componentes das relações jurídicas reguladas por esse ramo jurídico espe-
cializado — trata-se das de nições subjetivistas, com enfoque nos sujeitos
das relações justrabalhistas. Por vezes enfatizam o conteúdo objetivo das
relações jurídicas reguladas por esse mesmo ramo do Direito: são as de ni-
ções objetivistas, que a rmam enfoque na matéria de conteúdo das relações
justrabalhistas. Há, nalmente, a elaboração de concepções mistas, que pro-
curam combinar, na mesma de nição, os dois enfoques acima especi cados.
48 M樋弼膝眉備眉疋 G疋尾眉匹琵疋 D微柊毘樋尾疋
A mesma variedade de perspectivas já se veri cou, a propósito, no
Direito Comercial (hoje, Direito Empresarial), de nido quer como “direito
dos comerciantes” (subjetivismo), quer como “direito regulador dos atos de
comércio” (objetivismo).
É subjetivista a de nição exposta por Hueck e Nipperdey: “... o Direito
do Trabalho é o direito especial de um determinado grupo de pessoas, que
se caracteriza pela classe de sua atividade lucrativa (...) é o direito especial
dos trabalhadores.(...) O Direito do Trabalho se determina pelo círculo de
pessoas que fazem parte do mesmo”(1).
É objetivista a de nição exposta por Messias Pereira Donato: “corpo
de princípios e de normas jurídicas que ordenam a prestação do trabalho
subordinado ou a este equivalente, bem como as relações e os riscos que
dela se originam”(2).
É de nição mista, por sua vez, esta construída por Octavio Bueno Ma-
gano. Expõe o autor que Direito do Trabalho é o “conjunto de princípios,
normas e instituições, aplicáveis à relação de trabalho e situações equipará-
veis, tendo em vista a melhoria da condição social do trabalhador, através de
medidas protetoras e da modi cação das estruturas sociais”(3).
Dos três enfoques utilizados para a construção de de nições, o menos
consistente, do ponto de vista cientí co, é, sem dúvida, o subjetivista. É que,
considerada a relação de emprego como a categoria fundamental sobre que
se constrói o Direito do Trabalho, obviamente que o ramo jurídico especiali-
zado não irá de nir-se, sob o ponto de vista técnico, a partir de qualquer de
seus sujeitos, mas a partir de sua categoria fundamental. Por outro lado, o
caráter expansionista desse ramo jurídico tem-no feito regular, mesmo que
excepcionalmente, relações jurídicas de trabalho que não envolvem exata-
mente o empregado(4) — o que torna o enfoque subjetivista inábil a apreender
todas as relações regidas pelo ramo jurídico em análise.
Não obstante suas de ciências, o enfoque subjetivista não é de todo
inválido. De fato, ao destacar a gura obreira, tem a virtude de enfatizar o
caráter teleológico do Direito do Trabalho, sua qualidade de ramo jurídico di-
rigido a garantir um aperfeiçoamento constante nas condições de pactuação
da força de trabalho na sociedade contemporânea.
(1) HUECK, Alfred e NIPPERDEY, H. C. Compêndio de Derecho del Trabajo. Madrid: Revista
de Derecho Privado, 1963, p. 21-22 (tradução efetuada).
(2) DONATO, Messias Pereira. Curso de Direito do Trabalho. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1982,
p. 6.
(3) MAGANO, Octavio Bueno. Manual de Direito do Trabalho. Parte Geral, 4. ed. São Paulo:
LTr, 1991, p. 59.
(4) Por exemplo, o trabalhador avulso. O tema das relações regidas pelo Direito do Trabalho será
examinado logo a seguir, no item IV deste capítulo, sobre o conteúdo do Direito do Trabalho.
49C弼膝菱疋 尾微 D眉膝微眉肘疋 尾疋 T膝樋簸樋柊琵疋
O enfoque objetivista de feitura da de nição do Direito do Trabalho é mais
satisfatório do que o anterior, em face da circunstância de se construir desde
a categoria jurídica essencial do Direito em questão: a relação empregatícia.
A ênfase no objeto, no conteúdo das relações jurídicas de prestação
empregatícia do trabalho, confere a tal concepção visão mais precisa sobre
a substância e elementos componentes desse ramo jurídico especializado.
Não obstante, o acentuado direcionamento teleológico do Direito do Trabalho
— e que consiste em seu quali cativo diferenciador perante outros ramos
jurídicos — pode se descolorir nas de nições objetivistas, com prejuízo ao
desvelamento da essência desse ramo jurídico especializado.
As concepções mistas, desse modo, têm melhor aptidão para o aten-
dimento da meta cientí ca estabelecida para uma de nição — apreender e
desvelar os elementos componentes de determinado fenômeno, com o nexo
lógico que os mantém integrados.
Nesse quadro, o Direito Individual do Trabalho de ne-se como: com-
plexo de princípios, regras e institutos jurídicos que regulam, no tocante às
pessoas e matérias envolvidas, a relação empregatícia de trabalho, além de
outras relações laborais normativamente especi cadas.
Já o Direito Coletivo do Trabalho pode ser de nido como o complexo de
princípios, regras e institutos jurídicos que regulam as relações laborais de
empregados e empregadores, além de outros grupos jurídicos normativamente
especi cados, considerada sua ação coletiva, realizada autonomamente ou
através das respectivas associações(5).
O Direito Material do Trabalho, compreendendo o Direito Individual e o
Direito Coletivo — e que tende a ser chamado, simplesmente, de Direito do
Trabalho, no sentido lato —, pode, nalmente, ser de nido como: complexo
de princípios, regras e institutos jurídicos que regulam a relação empregatícia
de trabalho e outras relações normativamente especi cadas, englobando,
também, os institutos, regras e princípios jurídicos concernentes às relações
coletivas entre trabalhadores e tomadores de serviços, em especial através
de suas associações coletivas.
Como o leitor já percebe, há certa divisão interna ao Direito do Trabalho,
englobando o segmento do Direito Individual e o do Direito Coletivo, que po-
dem (ou não) ser considerados separadamente. Esta divisão, contudo, será
mais bem examinada no item VII do presente Capítulo.
(5) Observe-se que Hueck e Nipperdey de nem Direito Coletivo do Trabalho como a parte do
Direito do Trabalho relativa às associações sindicais pro ssionais e empresariais, as pactua-
ções e disputas que entre si rmam. In: ob. cit., p. 243 (tradução efetuada).

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