Nova Lei das Cooperativas de Trabalho: Réquiem para a Fraude Trabalhista?

AutorGérson Marques/Ney Maranhao
Páginas162-167

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1. Introdução

Um dos temas que, historicamente, sempre ensejou maior cizânia doutrinária e jurisprudencial na seara laboral, seguramente, é o das cooperativas de trabalho.

Habitualmente assimiladas à fraude trabalhista, as cooperativas passam, com a promulgação da Lei n. 12.690/12, de 30 de abril de 2012, a ter uma nova regulação, que visa a elidir a utilização indevida deste instrumento da terceirização.

Inexorável prova neste sentido é o fato de que esta nova lei revogou o parágrafo único do art. 442 da CLT, objeto de imensa controvérsia no âmbito juslaboral1, pois apontado por considerável parcela da doutrina como responsável pelo acréscimo nos casos de fraude por meio das cooperativas de trabalho, ao afastar, de plano, o vínculo empregatício dos cooperados.

Rompeu-se, assim, com a revogação do mencionado dispositivo celetista, um dos pilares das fraudes trabalhistas: a alegação de que o vínculo empregatício do cooperado com o tomador de serviços seria juridicamente impossível, em função da previsão do hoje revogado parágrafo único do art. 442 da CLT.

Resta saber se este novo mecanismo regulatório, independente do rompimento deste sustentáculo da fraude, atingirá a efetividade que dele se espera, suprimindo, de vez, esta chaga social que é a fraude perpetrada por meio de falsas cooperativas.

2. Conceito e natureza jurídica

O combate às fraudes trabalhistas, pela nova lei das cooperativas de trabalho, pode ser apreendido desde a sua conceituação, conforme se verificará a seguir.

2.1. Da autonomia e da democracia

Neste sentido, a cooperativa de trabalho é definida, pelo art. 2º da Lei n. 12.690/12, como:

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a sociedade constituída por trabalhadores para o exercício de suas atividades laborativas ou profissionais com proveito comum, autonomia e autogestão para obterem melhor qualificação, renda, situação socioeconômica e condições gerais de trabalho.

Observa-se, desta definição, a nítida intenção do legislador de reforçar a autonomia do cooperado, afastando, assim, a possibilidade de fraude por meio de falsos cooperados, com vínculo empregatício oculto, por meio de uma relação subordinada, os quais não poderiam jamais possuir a autonomia expressamente prevista pelo novo dispositivo normativo.

Nota-se, neste sentido, todo um zelo do legislador em detalhar esta autonomia, que inclui a necessidade de um regime democrático no bojo da cooperativa, por meio de uma gestão coletiva e coordenada2.

O art. 6º da Lei n. 12.690/12 determinou, ademais, o número mínimo de sete sócios da cooperativa, mantendo, assim, o intuito de evitar a fraude, frequentemente perpetrada por meio de um reduzido número de cooperados que facilita o viés lesivo do instituto3.

Conclui-se, desse modo, por uma definição legal estipulando robustas autonomia e demo-cracia da cooperativa de trabalho, afastando qualquer tipo de subordinação do cooperado.

2.2. Da definição por exclusão

A definição das cooperativas de trabalho, prevista na Lei n. 12.690/12, além de apresentar elementos positivos, supraexaminados, possui alguns elementos negativos, exclusões de figuras que não podem ser equiparadas às cooperativas.

Trata-se do parágrafo único do art. 1º da lei, que afasta a forma jurídica da cooperativa de trabalho para as cooperativas de assistência à saúde, do setor de transporte regulamentado pelo Poder Público, de profissionais liberais laborando nos seus próprios estabelecimentos e de médicos cujos honorários sejam pagos por procedimento.

Buscou o legislador, destarte, afastar a figura jurídica da cooperativa de trabalho de alguns setores onde tradicionalmente são perpetradas fraudes, uma vez mais denotando o seu intuito de combater as irregularidades por meio deste instituto jurídico.

2.3. Das espécies e do objeto social

O art. 4º da Lei n. 12.690/12 prevê duas espécies de cooperativas de trabalho: de produção, quando constituída por sócios que contribuem com trabalho para a produção em comum de bens e a cooperativa detém, a qualquer título, os meios de produção; de serviço, quando constituída por sócios para a prestação de serviços especializados a terceiros, sem a presença dos pressupostos da relação de emprego4.

Isto não afasta, todavia, uma ampla liber-dade deferida às cooperativas de trabalho, que, apesar de somente poderem se revestir das duas formas supramencionadas, podem atuar em qualquer gênero de serviço, operação ou atividade, desde que previsto o objeto social no seu Estatuto Social5.

No mesmo sentido, as cooperativas de trabalho não podem ser impedidas de participar de procedimentos licitatórios que tenham por escopo os mesmos serviços, operações e atividades previstas no seu objeto social6.

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2.4. Princípios

O notório intuito de afastar as fraudes trabalhistas denota-se, igualmente, nos princípios e valores que norteiam as cooperativas de trabalho, na forma prevista pelo art. 3º da Lei
n. 12.690/12, todos indicando uma verdadeira gestão democrática, livre e autônoma7.

Destacam-se, dentre estes princípios, a preservação dos direitos sociais, do valor social do trabalho e da livre-iniciativa8, princípios constitucionais reproduzidos no novo texto legal, corroborando, assim, a preocupação do legislador em reforçar a visão principiológica que passa a predominar no nosso ordenamento jurídico9.

No mesmo viés, o inciso IX do art. 3º da Lei
n. 12.690/12 prevê como um dos princípios das cooperativas de trabalho a não precarização do trabalho, reforçando, portanto, a preocupação do legislador em preservar a qualidade do trabalho prestado no bojo das cooperativas.

3. Da vedação à intermediação de mão de obra

Resta evidente, dos elementos da nova lei das cooperativas de trabalho já examinados, que o intuito principal do legislador foi o de combater as fraudes trabalhistas, tão frequentemente perpetradas por meio desta figura jurídica.

Este intuito restou, outrossim, consignado, expressa ou tacitamente, em diversos outros dispositivos do novo texto normativo, a seguir analisados.

3.1. Vedação expressa e tácita

O art. 5º da Lei n. 12.690/12 vedou, expressamente, a utilização da cooperativa de trabalho para intermediação de mão de obra subordina- da, a tradicional forma de terceirização ilícita, para atividade-fim da empresa10.

Neste ponto, destarte, o legislador deixou de abordar indiretamente o tema, passando a combater, de modo expresso, a fraude trabalhista.

Outro exemplo deste combate expresso à fraude se encontra no art. 17, § 2º, da Lei
n. 12.690/12, que cria a presunção de inter-mediação de mão de obra em caso de relação contratual entre a empresa e a cooperativa de trabalho que demande trabalho fora do estabelecimento da cooperativa e não se submeta a uma coordenação com mandato de até um ano, eleita em reunião dos sócios da cooperativa, com estabelecimento...

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