Escravidão contemporânea e a proteção dos direitos humanos e fundamentais no brasil: o retrocesso contido na proposta do projeto de lei 3842/2012

AutorLuana Raquel Ramos dos Santos
Páginas155-178
Escritos Sobre Trabalho Escravo Contemporâneo
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ESCRAVIDÃO CONTEMPORÂNEA E A PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS E
FUNDAMENTAIS NO BRASIL: O RETROCESSO CONTIDO NA PROPOSTA DO
PROJETO DE LEI 3842/2012
Luana Raquel Ramos dos Santos
1
Resumo: Durante muito tempo o conceito de trabalho escravo esteve
intimamente ligado à restrição de liberdade ambulatorial. Atualmente,
contudo, a configuração do crime de submissão à condição análoga à de
escravo, previsto no artigo 149 do Código Penal independe desse requisito.
Após a alteração, em 2003, do referido artigo, operou-se uma considerável
ampliação do conceito de trabalho análogo ao de escravo no ordenamento
brasileiro, que passou a englobar, além do trabalho forçado, a submissão a
jornadas exaustivas e a condições degradantes. O Projeto de Lei 3842/2012,
contudo, pretende reduzir o conceito de trabalho análogo ao de escravo,
retirando do artigo 149 do CP a menção à jornada exaustiva e às condições
degradantes. Tal proposta representa perigoso retrocesso na proteção da
dignidade dos trabalhadores, na medida em que promove um retorno ao
antigo conceito que previa o cerceamento de liberdade como requisito
fundamental para a ocorrência do crime.
Palavras-chave: Trabalho Escravo. Dignidade Humana. Projeto de Lei
3.842/2012. Vedação do Retrocesso Social.
1 Introdução
A pesquisa que ora se apresenta tem por intenção a reflexão acerca da
seguinte problemática: a retirada dos termos “condições degradantes” e
“jornada exaustiva” do texto do artigo 149 do Código Penal, conforme proposta
do Projeto de Lei 3842/2012, configura retrocesso na proteção dos direitos
humanos e fundamentais?
1
Possui graduação em Direito pela Faculdade Católica de Uberlândia (2016). Advogada, possui
experiência na área de Direito, com ênfase em Direito do Trabalho. Pós-graduanda em Direito
Tributário pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI). E-mail: raquel_luana_13@hotmail.
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Neste intuito será preliminarmente desenvolvida tratativa acerca das
diversas formas de escravidão contemporânea no Brasil. Não obstante ter sido
abolida há mais de cem anos em todo o mundo, estima-se que, na atualidade,
mais de 20 milhões de pessoas sejam submetidas a alguma forma de trabalho
forçado (OIT, 2017 p. 1).
O trabalho perpassará pelo estudo e análise do Projeto de Lei
3842/2012, que pretende retirar os termos “condições degradantes” e “jornada
exaustiva” do conceito de trabalho escravo contido no artigo 149 do Código
Penal. Faz-se necessário correlacionar a questão à temática dos direitos
humanos e fundamentais, mormente à questão relativa à violação do princípio
da vedação do retrocesso quanto ao reconhecimento e efetivação dos direitos
fundamentais.
A questão do impacto ocasionado pela redução da amplitude do
conceito de trabalho escravo na efetivação de medidas de fiscalização e
combate ao trabalho escravo contemporâneo também será alvo de estudo, na
busca por elementos reflexão acerca do problema inicialmente proposto.
Por derradeiro, a pesquisa buscará fomentar a reflexão acadêmica
acerca da necessidade de manutenção do texto constante do artigo 149 do
Código Penal como instrumento de maior proteção dos trabalhadores contra
a submissão às diferentes modalidades de trabalho escravo.
Com relação à metodologia adotada para seu desenvolvimento, o
presente trabalho será realizado através de pesquisa de bibliografias,
documentos, das legislações internacional e brasileira vigentes, projetos de
leis, entre outros, valendo-se do método dedutivo e hipotético-dedutivo.
Finalmente, a pesquisa pretende demonstrar que a alteração proposta
pelo PL 3842/2012 viola o princípio da vedação ao retrocesso no
reconhecimento de direitos humanos e fundamentais, uma vez que, reduzindo
o espectro protetivo, somente trabalhadores submetidos a trabalhos forçados
seriam considerados escravos, mitigando assim, a possibilidade de alcance de
sua finalidade protetiva do ser humano e de sua dignidade.

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