Impossibilidade da securitização da dívida ativa no atual ordenamento jurídico brasileiro

AutorRafael Correia Fuso
Ocupação do AutorMestre em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP
Páginas275-317
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IMPOSSIBILIDADE DA SECURITIZAÇÃO DA
DÍVIDA ATIVA NO ATUAL ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO
Neste capítulo, nosso objetivo é aprofundar ainda mais o
estudo sobre a securitização, especificamente a utilização de
FIDC-NP (forma mencionada por instrução CVM) nas ante-
cipações de recebíveis de natureza tributária e não tributária
pelos entes políticos.
Fizemos um novo corte no sistema jurídico para tratar
da securitização da Dívida Ativa, não sendo objeto deste tra-
balho os contratos existentes com o Poder Público, créditos
tributários a vencer, créditos tributários parcelados pelos con-
tribuintes de débitos não inscritos, entre outros, que configu-
ram também recebíveis. Buscamos tratar da securitização da
dívida ativa em razão de configurar a maior fonte de receita
pública dos entes políticos, com pouca eficácia em termos de
recebimento desses créditos.
Constatamos neste estudo que, desde o início de 2009, Es-
tados, Municípios e o Distrito Federal têm aplicado a securiti-
zação no recebimento de recursos de longo prazo por meio da
denominada “securitização da dívida ativa”, envolvendo ante-
cipação de direitos creditórios. Todavia, foi editada regra pela
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RAFAEL CORREIA FUSO
Comissão de Valores Mobiliários338 incluindo a securitização
como operação de créditos diante da antecipação de receita
pública, nos termos do art. 167, IV, da CF/88, a despeito de
não concordarmos com esse enquadramento. Vejamos o texto
constitucional:
Art. 167. São vedados:
[...]
IV – a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despe-
sa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos im-
postos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recur-
sos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção
e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da
administração tributária, como determinado, respectivamente,
pelos arts. 198, § 2.º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às
operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art.
165, § 8.º, bem como o disposto no § 4.º deste artigo;
[...]
§ 4.º É permitida a vinculação de receitas próprias geradas pelos
impostos a que se referem os arts. 155 e 156, e dos recursos de
que tratam os arts. 157, 158 e 159, I, a e b, e II, para a prestação
de garantia ou contragarantia à União e para pagamento de dé-
bitos para com esta. (Destacamos).
Art. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:
[...]
§ 8.º A lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho
à previsão da receita e à fixação da despesa, não se incluindo na
proibição a autorização para abertura de créditos suplementares
e contratação de operações de crédito, ainda que por antecipa-
ção de receita, nos termos da lei.
Na “securitização da dívida ativa”, que busca antecipar
recebíveis fiscais e não fiscais já vencidos e não pagos, o de-
tentor do direito de receber o crédito (ente político) cede os
direitos creditórios, constituídos em razão de fatos jurídicos
já ocorridos, para securitizadora ou Fundo de Investimento
338. Instrução CVM 444/2006.
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TRIBUTAÇÃO DAS SECURITIZADORAS DE TÍTULOS
E VALORES MOBILIÁRIOS
em Direitos Creditórios, recebendo o ente político recursos
financeiros.
A cessão dos direitos creditórios realizada de forma de-
finitiva à securitizadora ou ao FIDC é considerada uma alie-
nação patrimonial, ou seja, trata-se da venda de um ativo
pertencente ao Poder Público, não possuindo nenhuma ca-
racterística de financiamento ou cessão de crédito que possa
gerar uma dívida do Poder Público com a securitizadora caso
não se inclua cláusula de recompra dos direitos creditórios
na operação, a despeito de guardar consigo a antecipação do
valor de um recebível pelo originador do crédito.
A discussão que teremos pela frente é se essa operação
de securitização está submetida ou não à Lei de Responsabili-
dade Fiscal e se possui sustentabilidade diante de Resoluções
editadas pelo Senado Federal.
Para tanto, será necessário analisarmos o Parecer da Pro-
curadoria da Fazenda Nacional 1.579/2014,339 que respondeu
consulta sobre o enquadramento da criação de Fundo de In-
vestimento em Direitos Creditórios (FIDC) pelo Município de
Nova Iguaçu-RJ no conceito de operação de crédito da Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF).
Destaca-se ainda que o Tribunal de Contas da União en-
frentou a securitização da dívida ativa por antecipações de re-
ceita, submetendo-se, liminarmente, à suspensão dos fundos
constituídos pelos entes políticos até o julgamento do mérito
da matéria.
Com o intuito de evitar a incidência da LRF, o Senado
Federal editou as Resoluções 11/2015 e 17/2015, alterando a
Resolução 43/2001, dispondo que a securitização de recebíveis
de dívida ativa não sejam consideradas “operação de crédito”.
A despeito de o legislador buscar permissão para que
a União, Estados, Distrito Federal e Municípios antecipem
339. Disponível em: . Acesso em: 30 ago. 2017.

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