Imunidade tributária musical e liberdade de expressão artística

AutorEduardo de Moraes Sabbag
Ocupação do AutorProfessor, Advogado e Autor de Obras Jurídicas; Doutor em Direito Tributário pela PUC/SP
Páginas863-894
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ΙΜΥΝΙ∆Α∆Ε ΤΡΙΒΥΤℑΡΙΑ ΜΥΣΙΧΑΛ
Ε ΛΙΒΕΡ∆Α∆Ε ∆Ε ΕΞΠΡΕΣΣ℘Ο
ΑΡΤ⊆ΣΤΙΧΑ
Eduardo de Moraes Sabbag1
I. INTRODUÇÃO
A Emenda Constitucional n. 75 – fruto da intitulada “PEC
da Música” e publicada em 15 de outubro de 2013 – acrescentou
a alínea “e” ao inciso VI do art. 150 da Carta Magna, prevendo,
assim, a imunidade musical. Segue o teor da nova alínea:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao
contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios: (...)
1. Professor, Advogado e Autor de Obras Jurídicas; Doutor em Direito Tri-
butário pela PUC/SP; Doutorando em Língua Portuguesa pela PUC/SP;
Mestre em Direito Público e Evolução Social pela UNESA/RJ; Professor de
Direito Tributário, de Língua Portuguesa e de Redação na Rede de Ensino
LFG/Anhanguera; Coordenador dos Cursos de Pós-Graduação em Direito
Tributário e Processo Tributário na Rede LFG/Anhanguera; Professor de
Direito Tributário da Universidade Presbiteriana Mackenzie/SP e da Uni-
versidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ/FND).
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TRIBUTAÇÃO: DEMOCRACIA E LIBERDADE
VI – instituir impostos sobre: (...)
e) fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no
Brasil contendo obras musicais ou literomusicais de autores
brasileiros e/ou obras em geral interpretadas por artistas
brasileiros bem como os suportes materiais ou arquivos
digitais que os contenham, salvo na etapa de replicação
industrial de mídias ópticas de leitura a laser.
O propósito do novel comando imunitório é desonerar de
impostos os fonogramas (a obra artística da produção de som) e
videofonogramas (a obra artística da produção de imagem e som),
musicais ou literomusicais, produzidos no Brasil, sem prejuízo
da extensão da imunidade tributária aos suportes ou arquivos
que os contenham. Desse modo, a obra intelectual do artista
musical, em sua inteireza, passa a ficar protegida da tributação.
Ademais, o poder constituinte derivado houve por bem
ao ofertar proteção à mídia física, a qual veicula materialmen-
te aquela obra intelectual. Trata-se dos suportes materiais ou
arquivos digitais, a saber, os CDs, os DVDs, os Blue-Rays e os
próprios celulares, tablets e similares.
Destaque-se que a norma imunizante em apreço, a par
do objetivo de reduzir a carga de impostos de tais produtos, ou
seja, propiciar a baixa de preços, tanto nos CDs, DVDs e Blue-
-Rays que contenham a obra artística musical, como também
nas músicas comercializadas pela internet ou via telefonia,
almeja, por certo, desestimular a comercialização clandestina
de “cópias piratas”. A propósito, em ambas as direções, a be-
nesse constitucional vem ratificar axiologicamente o acesso à
cultura e ao conhecimento, à semelhança da Imunidade de
Imprensa, prevista na alínea anterior (art. 150, VI, “d”, CF).
II. CONCEITO DE IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
Logo que se pensa na acepção do vocábulo imunidade,
tem-se a fácil constatação de que o termo corresponde a algo
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que é “livre de, dispensado de, resguardado de ou contra, isen-
to, incólume, liberado”.2
Tal conceito de exoneração pode ser naturalmente des-
locado para o âmbito semântico das imunidades tributárias.
Entretanto se faz necessário ter presente, de início, que a
maioria das normas imunizadoras de tributos – contempladas
sempre na Constituição Federal3 – decorrem dos sublimes
princípios e garantias constitucionais, os quais, dotados de
expressiva carga axiológica, são vocacionados a limitar o poder
de tributar das entidades impositoras.
Dessa forma, a norma imunizante, burilada pelo legis-
lador constituinte em nome do cidadão-destinatário, na estei-
ra de uma perspectiva finalística, visa preservar valores po-
líticos, religiosos, educacionais, culturais, sociais e éticos,
todos “considerados como de superior interesse nacional”4¯5,
colocando a salvo da tributação certas situações e pessoas –
físicas e jurídicas.
2. No plano lexicográfico, o clássico Aurélio registra o verbete imunidade
como a “condição de não ser sujeito a algum ônus ou encargo” (FERREIRA,
Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 2. ed., 24.
impr., Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1986, p. 927, verbete “imunidade”).
3. Sobre a necessidade de previsão constitucional para a norma de imunidade
tributária, ver, por todos, o parecer de FALCÃO, Amilcar de Araújo (Imuni-
dade e isenção tributária – Instituição de assistência social (Parecer). 9 de
setembro de 1961. Revista de Direito Administrativo, vol. 66, out./dez. 1961,
pp. 367-375/p. 368), que assim categoriza: “Uma coisa é certa em qualquer que
seja a hipótese: somente no texto constitucional são estabelecidas imunida-
des tributárias. É essa uma característica de ordem formal ou externa. Vale,
pelo menos, como critério negativo para o intérprete e para o aplicador: se a
hipótese não estiver prevista na Constituição, de imunidade não se tratará”.
Nas palavras do doutrinador, a Constituição, para a imunidade tributária, será
a sua “fonte normativa”, o seu “foco ejetor”, a “norma capaz de instituí-la”.
4. MELO, José Eduardo Soares de. Curso de direito tributário. 6. ed. rev. e
atual. São Paulo: Dialética, 2005, p. 146.
5. Nesse sentido, v. CHIESA, Clélio. A competência tributária do Estado bra-
sileiro – Desonerações nacionais e imunidades condicionadas. São Paulo:
Max Limonad, 2002, p. 203.

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