A inclusão da pessoa com deficiência nas constituições estaduais e na lei orgânica do distrito federal

AutorThiago Magalhães Pires
Ocupação do AutorDoutor e Mestre em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Professor Convidado dos Cursos de Pós-graduação em Direito Administrativo da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro - EMERJ (2014/2015) e em Direitos Fundamentais do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM em parceria com o Ius ...
Páginas3-18
A INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
NAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS
E NA LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL
Thiago Magalhães Pires
Doutor e Mestre em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro –
UERJ. Professor Convidado dos Cursos de Pós-graduação em Direito Administrativo da
Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro – EMERJ (2014/2015) e em Direitos
Fundamentais do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM em parceria
com o Ius Gentium Coninbrigae – IGC da Universidade de Coimbra, Portugal (2017).
Sumário: 1. Introdução – 2. A ordem constitucional brasileira e a pessoa com deciência; 2.1
A disciplina do tema no texto da Constituição de 1988; 2.2 Tratados internacionais com status
constitucional – 3. A proteção das pessoas com deciência nos estados e no distrito federal; 3.1
Discriminação; 3.2 Locomoção; 3.3 Direitos humanos em geral; 3.4 Participação e entidades re-
presentativas; 3.5 Educação; 3.6 Saúde; 3.7 Fomento; 3.8 Comunicação Social; 3.9 Funcionalismo
público; 3.10 Metas e planejamento – 4. Conclusão – 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Como se sabe, a Constituição de 1988 se preocupa de forma específ‌ica com a
inclusão das pessoas com def‌iciência, dedicando a isso um conjunto de dispositivos.
Mais recentemente, a eles se acrescentaram as normas da Convenção Internacional
sobre os Direitos das Pessoas com Def‌iciência que, tendo sido aprovada nos termos do
art. 5º, § 3º, da Carta Federal, tem status de emenda constitucional. É apenas natural
que o tema seja objeto de uma preocupação em um nível tão elevado: considerando
que as def‌iciências ainda são associadas a estigmas e limitações na sociedade, a efetiva
fruição dos direitos fundamentais por parte dessas pessoas depende do enfrentamento
da desigualdade que as prejudica – i.e., de um tratamento específ‌ico que considere
as particularidades da vida com def‌iciência.
Sem prejuízo disso, compete ao legislador desenvolver a matéria. Nessa linha, na
esteira da Convenção, o Congresso Nacional editou a Lei 13.146/2015, o “Estatuto
da Pessoa com Def‌iciência”. O que se deve observar, contudo, é que embora se espere
aqui – como em quase todas as áreas – algum protagonismo da legislação federal,
o tema se insere entre aqueles nos quais explicitamente se confere um espaço mais
relevante à competência legislativa dos Estados e do Distrito Federal: sujeitando-se
o tema à normatização concorrente (art. 24, XIV), cabe à União apenas a edição de
normas gerais (art. 24, § 1º), reservando-se à legislação estadual e distrital as com-
petências supletiva (art. 24, § 3º) e complementar (art. 24, § 2º).
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Isso não passou despercebido pelos legisladores estaduais e distritais, que
também têm dedicado alguma energia ao tema. Aliás, dada a relevância que ele tem,
é comum que as próprias constituições dos Estados e a Lei Orgânica do Distrito Fe-
deral (LODF) incorporem certas normas acerca da matéria, inclusive para ampliar
a proteção conferida pela Carta Federal.
É à apresentação dessas disposições que se dedica o presente estudo. Como as
ordens constitucionais brasileiras – nacional, de um lado, e distrital e estadual, de
outro – estão ligadas entre si, não se poderia examinar o tema sem antes expor, de
forma sintética, o que preveem a Constituição de 1988 e a Convenção Internacional
sobre os Direitos das Pessoas com Def‌iciência. Feito isso, o artigo passa a traçar um
panorama das disposições constitucionais estaduais e distritais a respeito do assunto.
O texto é expositivo e não se pretende crítico. Tampouco se fará um juízo sobre a
validade ou a adequada interpretação dos enunciados citados. A ideia é simplesmente
mostrar como os constituintes distritais e estaduais lidaram com a matéria, ampliando
a perspectiva para além do âmbito das normas nacionais.
2. A ORDEM CONSTITUCIONAL BRASILEIRA E A PESSOA COM
DEFICIÊNCIA
2.1 A disciplina do tema no texto da Constituição de 1988
Uma das grandes características da Constituição de 1988 é a marcada preocupa-
ção com a emancipação do ser humano e, assim com a inclusão de todos na política,
na economia, na sociedade, e na cultura. Além de situar em seu centro axiológico
a dignidade humana (art. 1º, III) – o valor e a autonomia de cada pessoa, quaisquer
que sejam suas condições ou suas características –, a Carta reaf‌irma o princípio da
isonomia em seu art. 5º, caput, e assume um compromisso com a construção de “uma
sociedade livre, justa e solidária” e a promoção do “bem de todos”, sem preconceito
ou discriminação, a f‌im de erradicar a marginalização e reduzir as desigualdades
sociais (art. 3º, I, III e IV). O quadro se completa com a af‌irmação da prevalência
dos direitos humanos na ordem internacional (art. 4º, II) e a adoção de um catálogo
amplo (e aberto) de direitos fundamentais.
Diante disso, não surpreende que as pessoas com def‌iciência tenham sido um
dos focos da Constituição. De forma específ‌ica, a Carta veda a discriminação dos
trabalhadores com def‌iciência “no tocante a salário e critérios de admissão” (art. 7º,
XXXI) e, como medida de ação af‌irmativa, impõe uma reserva de vagas em seu favor
nos concursos públicos (art. 37, VIII). Isso é bem razoável: se o objetivo é a inclusão
de todos1, o compromisso com a igualdade exige instrumentos de eliminação ou, ao
1. Trata-se de uma expressão da mudança de paradigmas que atingiu a matéria: se, de início, as pessoas com
def‌iciência eram excluídas do convívio social, recebendo atenção apenas com base em ações de natureza
assistencialista, hoje o que se enfatiza é a “percepção das competências e da participação social destas
pessoas” (BERNARDES, Liliane Cristina Gonçalves et al., Pessoas com def‌iciência e políticas de saúde no
Brasil: ref‌lexões bioéticas. Ciência & Saúde Coletiva, v. 14, n. 1, p. 31-38, jan./fev. 2009).
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