Licitude e antijuricidade

AutorLourival Vilanova
Páginas251-273
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Capítulo XI
LICITUDE E ANTIJURIDICIDADE
SUMÁRIO: 1. Enunciados de validade - 2. Saturação do con-
junto jurídico - 3. Validade e não validade - 4. Gradação da va-
lidade - 5. Nulidade em Kelsen - 6. Sobre Cossio e Schreier - 7.
Invalidade de lei - 8. Invalidade e nulidade - 9. Limites da tipi-
ficação - 10. Correspondência ao tipo – 11. Ainda sobre a cor-
respondência ao tipo - 12. A continuidade no heterogêneo - 13.
Ainda o suporte fáctico.
1. Enunciados de validade
Há enunciados de valor que se colocam fora do sistema
de normas jurídicas. Mas têm critérios de referência em ou-
tros sistemas normativos não jurídicos: éticos, políticos (ide-
ológicos), religiosos. Sem referência ou pertinência, inexis-
tem enunciados assim. E com seu contexto. Até um fonema
vocal, por exemplo, não é por si só: é fonético e não puro som
físico por sua relação com consoantes e outras vogais, que
fazem o contorno de antecessores e sucessores. E assim as
palavras, em seu contexto frasal. E as frases demarcam-se
dentro do texto.
Podemos emitir enunciados de validade sobre todo
um sistema, como sobre normas-membros desse sistema.
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CAUSALIDADE E RELAÇÃO NO DIREITO
Os denominados “juízos-de-valor” (value -judgements) em
Kelsen1 são enunciados intra-sistêmicos. A validade é rela-
ção-de-implicação entre normas. A relação de delegação,
como ele denomina, é, logicamente, relação implicacional.
Os chamados “atos de produção de normas” são fatos (ou
condutas) que se qualificam pelas normas objetivas que de-
les provêm e neles retroincidem, conferindo-lhes sentido ob-
jetivo, inserindo-os no interior do sistema. Se o sentido subje-
tivo de tais atos não objetivasse normatividade, o sistema os
eliminaria por nulidade, anulação ou método de invalidação.
Assim ocorre com as normas materialmente inconstitucio-
nais por conflitarem com normas formalmente rígidas, não
emendáveis, ou por defeito no processo de emenda. Se o ato
jurídico processual infringe regra de capacidade ou de legi-
timação, ou de licitude do objeto, a vontade processual não
põe norma objetiva que venha retrovalidar o ato. Ele não en-
tra no sistema como fato jurídico. Fica como puro fato, ou
é aproveitado, já agora a título de suporte fáctico de outras
normas, que liguem efeitos a algum componente fáctico
restante. Torna-se, então, fator na relação de causalidade
normativa.
Há que distinguir a invalidade das normas e a invalida-
de dos atos. Um ato é inválido se não corresponde ao esque-
ma descritivo do tipo – a hipótese fáctica – ou ao consequente
fáctico, sua eficacidade. E, além disso, requer que a norma
mesma seja válida. De norma não válida não pode decorrer
ato válido. Mas há, no sistema, normas válidas que são deli-
mitadoras de atos inválidos. São normas que preenchem a
parte complementar da antijuridicidade. As normas penais
1. Os juízos-de-valor em Kelsen compreendem dois tipos: a) os juízos jurídicos de
valor e b) os juízos de justiça (juristc value judgements/judgements of justice).
Aqueles verificáveis empiricamente, porque obtêm-se relacionando o fato com a
norma positiva; os últimos, inverificáveis, porque a norma que serve de parâmetro
é, dizemos nós, extra-sistêmica (moral, ético-política, de direito natural). V. Value
judgements in the science of law, What is justice? 1957, p. 229.

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