Tipos de relação jurídica

AutorLourival Vilanova
Páginas133-148
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Capítulo VI
TIPOS DE RELAÇÃO JURÍDICA
SUMÁRIO: 1. A relação sujeito/norma 2. Relacionalidade dos
direitos absolutos 3. Relações jurídicas primária e secundária
4. Múltiplas relações num só ato jurídico 5. Relações entre
relações jurídicas 6. Outras relações entre relações jurídicas
7. Relações jurídicas reciprocamente vinculadas.
1. A relação sujeito/norma
Não se justifica, porém, conceber (como o faz F. Cicala,
Il rapporto giuridico, p. 14, 17 e 65) a relação jurídica como
relação entre o sujeito de direito e a norma jurídica. Cicala
vê a mesma relação ideal entre o indivíduo e a norma moral,
entre o indivíduo e a norma religiosa, dar-se na relação jurí-
dica. Cremos que essa relação imediata se dê entre o orde-
namento ou sistema jurídico, como um todo, e seu domínio
tempo-espacial de validade, dentro do qual ocorrem fatos
naturais e fatos de conduta. Essa relação é ideal – quer dizer,
normativa – e fáctica. Tomamos o termo ideal como contra-
posto a causal-fáctico, à natureza como sistema de fatos in-
terligados pela causalidade natural. Mas tal relação assenta
no existencial – o conjunto de fatos, cortado do total dos fatos
para compor o universo do Direito.
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CAUSALIDADE E RELAÇÃO NO DIREITO
Em rigor, relação meramente ideal entre homem e nor-
ma não é relação jurídica. Sem a ocorrência de pelo menos
um fato, da natureza ou do homem – o homem é tanto natu-
reza quanto cultura: cultura inexiste sem normas –, a norma
jurídica do direito positivo em vigor não se realiza. Quer di-
zer, não passa de seu estado ideal de norma para a atuação
no mundo. Em outros termos: faltará o ponto de incidência,
o fato que em sua concreção aqui e agora corresponda à hi-
pótese fáctica (hipótese de incidência, como denominam os
tributaristas). V. Del Vecchio, Justice, droit, État, p. 225-252.
É bem certo, Cicala não chega ao ponto de suprimir o
fato, pois diz que a relação jurídica (II rapporto giuridico,
cit., p. 18) é uma relação entre o indivíduo e a norma jurídi-
ca, aplicável ao respectivo fatti specie. Ora o fato-espécie é
temporalmente e espacialmente concreto, e ele é o que serve
de interpolação entre sujeito e norma. A norma jurídica, ob-
servemos, não incide diretamente no homem total, mas no
sujeito de direito e conduta sua (ação/omissão). E há, sim,
incidência imediata da norma no dado, que é o homem. Dá-
se isso, justamente, na norma que toma o factum do nasci-
mento do ser humano com vida como o suporte factual do
ser sujeito de direito. É talvez o primeiro (logicamente, i. e., o
sistema de norma já constituído) fato e a primeira incidência
da norma. Daí em diante, a personalidade (o poder ser sujei-
to de direito, ativo ou passivo, em relações jurídicas) é pres-
suposto fáctico, imediato, ou mediato, de todo fato juridica-
mente relevante. O que não surpreende porque o homem faz
o direito para o homem. Quer se mencione, quer não, o ho-
mem está presente. Assim sendo, essa relazione ideale della
norma coisoggetti torna-se relação real, pela sua projeção no
fato-espécie.
Tem cabimento a observação de Kelsen de que não é o
homem, em sua concreta individualidade, que está dentro
do sistema jurídico. É a conduta sua, e ele mesmo, digamos,

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