Objeto da prova

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas42-59
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Manoel Antonio Teixeira Filho
Capítulo IV
Objeto da Prova
Os fatos. Conceito processual
O objeto da prova são os fatos (do latim factum, de facere = fazer, causar) narrados pelo
autor, pelo réu ou por terceiros, que na técnica processual se referem aos acontecimentos
jurídicos (fatos jurídicos naturais), ou aos atos jurídicos ou ilícitos (fatos jurídicos voluntários),
originadores do conito intersubjetivo de interesses. Daí por que o art. 369 do CPC se refere
à prova da “verdade dos fatos, em que se funda o pedido ou a defesa” (sublinhamos).
Em outro sentido, os fatos, se correlacionados com o direito, indicam o evento em si,
ou seja, aquilo que realmente ocorreu ou se alega haver ocorrido; já o direito atine à norma ou
ao princípio legal em que as partes fundamentam as suas pretensões. Aos litigantes incumbe
demonstrar apenas a veracidade dos fatos articulados, a m de que o juiz faça incidir,
concretamente, a regra jurídica apta para reger a espécie e, com isso, solver a controvérsia:
“da mihi factum, dabo tibi ius (“dá-me o fato e te darei o direito”) — proclama o vetusto
aforismo latino, que constitui uma espécie de síntese feliz da própria função jurisdicional.
O juiz, entrementes, não está obrigado a aplicar à espécie a norma legal em que a
parte assentou a sua pretensão; sendo assim, feita a prova do fato narrado, e reconhecida a
existência do direito, caberá ao julgador acolher o pedido, conquanto até mesmo por fun-
damento jurídico diverso do apontado pela parte, sempre que, evidentemente, este for o
caso. Trata-se, aqui, de necessária — e perfeitamente admissível — adequação dos fatos à
regra de direito positivo pertinente. Por outras palavras, incumbirá sempre ao juiz proceder
à categorização jurídica dos fatos, designadamente quando foram postos na inicial ou na
contestação sem qualquer técnica jurídica. O que ao juiz não se permite é o inverso: admitir
a existência de fatos que não foram alegados, a pretexto de aplicar o dispositivo de lei, ou a
norma jurídica, em que a parte apoiou o pedido. Repita-se: quod non est in actis, non est in
mu nd o”; todavia, se depois de ajuizada a ação algum outro fato constitutivo, modicativo
ou extintivo do direito surgir com ecácia para inuir no julgamento do feito, deverá o juiz
tomá-lo em consideração, por sua iniciativa ou a requerimento da parte interessada, no en-
sejo da prolação da sentença (CPC, art. 493), vericando, contudo, para que: a) não resulte
escoriado o princípio indeclinável do contraditório, que informa o processo moderno, e
possui assento constitucional (CF, art. 5.º, LV); b) a proibição legal da denominada decisão
surpresa (CPC, arts. 9.º e 10). Nem sejam contravindas as regras inscritas nos arts. 141 e
492, do mesmo estatuto processual, delimitadoras da quantidade de prestação jurisdicional
realizável e da natureza do correspondente provimento, respectivamente.
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Esclareça-se, além do mais, que a apreciação de tais fatos, pelo juiz, só será possível se
as novas alegações da parte: a) se relacionarem a direito superveniente; b) delas competir
ao juiz conhecer de ofício; ou c) por expressa disposição legal, puderem ser formuladas em
qualquer tempo e juízo (CPC, art. 342, I a III), como no caso de incompetência abs oluta ( CPC,
art. 64, § 1.º). Fora disso, qualquer outra alegação estará fulminada pela preclusão temporal,
que decorrerá da perda do momento processual oportuno para formulá-la.
A prova quanto aos fatos pode ser direta ou indireta. No primeiro caso, se demonstra
a existência do próprio fato narrado nos autos; no segundo, se põe em evidência um outro
fato, a partir do qual, “por raciocínio lógico, se chega a uma conclusão a respeito dos fatos d os
autos” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Fo-
rense, 1978. p. 518). A prova indireta é, por esse motivo, também denominada de indiciária
ou por presunção, sendo recomendável observar que a sua produção somente deverá ser
admitida na hipótese de não ser possível a prova direta, cuja ecácia processual é superior.
Fatos controvertidos, relevantes, determinados e pertinentes
Nas edições anteriores deste livro, armamos que nem todos os fatos devem ser objeto
da prova, mas, unicamente, os controvertidos, os relevantes e os determinados. Incluímos, agora,
os pertinentes. Conseguintemente, inexistindo contestação ao fato, este se torna incontroverso,
razão por que o problema se resume a uma simples aplicação do direito ao caso concreto.
O art. 341 do CPC, que consubstancia o princípio doutrinal da impugnação especica-
da(22), aliás, impõe ao réu “manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes
da petição inicial”, sob pena de serem presumidos verdadeiros os não contestados, salvo se
(1) não for admissível, a seu respeito, a conssão; (2) a petição inicial não estiver acompa-
nhada do instrumento público que a lei considerar da substância do ato; ou (3) se estiverem
em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto.
Já não vigora, portanto, em nosso sistema de direito positivo, a antiga armação de
que, se o autor não zer prova dos fatos alegados, o seu pedido será rejeitado, mesmo que o
réu não os tenha impugnado (“actore probante, qui convenitur, et si nihil praestat obtinebit”).
Modernamente, o encargo da prova não é atribuído, apenas, ao autor, mas dividido entre
as partes, conforme seja o interesse que possuam na admissibilidade, pelo órgão judicial,
quanto a serem verdadeiros os fatos narrados.
Concordamos, porém, com Moacyr Amaral Santos (Comentários ao Código de Processo
Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1977. p. 42), quando arma nada impedir que, a despeito de
alguns fatos não terem sido impugnados, determinadas circunstâncias exijam a sua prova,
como, e. g., no caso de o juiz necessitar formar, com mais segurança, o seu convencimento,
a sua certeza jurídica, enm.
Há de se observar, por outro lado, que sob certas circunstâncias a presunção de veracidade
dos fatos não expressamente impugnados não deve produzir, de plano, os efeitos processuais
(22) Trata-se, na verdade, do princípio da impugnação especicada dos fatos; o da eventualidade, mencionado no
texto, tem sede no art. 336 do CPC.
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