Pronunciamentos judiciais sujeitos à impugnação por recurso

AutorJúlio César Bebber
Ocupação do AutorJuiz do Trabalho no TRT da 24ª Região (MS)
Páginas57-79
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Capítulo 5
PRONUNCIAMENTOS JUDICIAIS
SUJEITOS À IMPUGNAÇÃO POR RECURSO
5.1. Noções gerais
Somente os pronunciamentos do juiz qualif‌i cados por conteúdo decisório são sus-
cetíveis de impugnação por meio de recurso. Não se sujeitam a recurso, por isso,
os atos praticados pelas partes, pelo Ministério Público e pelos auxiliares do juízo
(diretor de secretaria, of‌i cial de justiça, perito, contador etc.).
Para adequada compreensão dessa assertiva, ressalto que ato do juiz é o gêne-
ro do qual pronunciamento do juiz é espécie.
Os atos do juiz podem ser classif‌i cados da seguinte forma:
a) atos de documentação — são atos que se destinam a documentar certos fatos
(v. g., rubrica lançada em folhas dos autos);
b) atos reais — são atos de personalização da atuação do juiz (v. g., inspeção
judicial, condução de audiência);
c) pronunciamentos judiciais — são atos que resolvem o litígio ou questões, ou sim-
plesmente impulsionam o processo preparando-o para a resolução dos pedidos.
5.2. Classif‌i cação e conceitos dos pronunciamentos judiciais
Mesmo ciente do brocardo omnis def‌i nitio in jure civile periculosa est (toda
conceituação legal é perigosa), o legislador classif‌i cou e conceituou os pronuncia-
mentos judiciais (CPC, 203 e 204), objetivando a identif‌i cação da natureza jurídica
destes, a f‌i m de correlacioná-los com o sistema recursal. Graças a essa técnica, são
facilmente respondidas as seguintes perguntas: o pronunciamento judicial admite im-
pugnação? Se admitir, a impugnação é imediata e autônoma ou diferida? Qual a espécie de
recurso adequado à impugnação?
A CLT não classif‌i ca (tampouco conceitua) os pronunciamentos judiciais, em-
bora faça referências à decisão (CLT, 831; 832; 850 etc.), que é o gênero do qual os
demais pronunciamentos são espécie,(65) à sentença (CLT, 39, § 1º; 137, §§ 1º e 2º;
642-A, § 1º, I; 791-A; 832, §§ 5º e 6º; 852-G; 852-I; 855-D; 876, parágrafo único; 879,
caput e § 1º; 895, IV etc.) e à decisão interlocutória (CLT, 893, § 1º; 855-A, § 1º).
(65) Decisão “corresponde ao gênero, do qual a sentença constitui uma das espécies” (MOREIRA, José
Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. v. V, p. 215).
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É imprescindível, por isso, a adoção da classif‌i cação e dos conceitos do CPC
no direito processual do trabalho (CLT, 769; CPC, 15).
5.2.1. Sentença
O vocábulo sentença traduz a ideia de sentir (sentio, is se sum, ire), apreciar,
julgar.
Legalmente, porém, sentença designa “o pronunciamento por meio do qual o
juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe f‌i m à fase cognitiva do procedimento
comum, bem como extingue a execução” (CPC, 203, § 1º).(66)
Para a exata compreensão desse conceito deve-se considerar que:
a) a estrutura do processo é sincrética. O processo é único e está dividido em
duas fases principais: conhecimento e execução;
Apresso-me em esclarecer que pode haver fase intermediária ou incidental (v.g.:
fase de liquidação; fase de cumprimento voluntário da sentença), que justif‌i ca o
uso da expressão fases principais.(67)
(66) “O legislador do CPC-1973 conceituou sentença (“ato pelo qual o juiz põe termo ao processo,
decidindo ou não o mérito da causa” — art. 162, § 1º) e decisão interlocutória (“ato pelo qual o juiz,
no curso do processo, resolve questão incidente” — art. 162, § 2º). Como critério distintivo utilizou
as consequências (efeitos) de cada pronunciamento. O objetivo foi o de facilitar a identificação da
natureza do pronunciamento do juiz, interligando-o com o sistema recursal. Assim, “se o juiz põe termo
ao processo, cabe apelação. (...) Cabe agravo de instrumento de toda a decisão, proferida no curso do
processo, pela qual o juiz resolve questão incidente” (BUZAID, Alfredo. Exposição de motivos ao CPC).
Como a Lei n. 11.232/2005 instituiu o processo sincrético como regra, viu-se o legislador compelido
a mudar o conceito de sentença, definindo-a pelo seu conteúdo (“ato do juiz que implica alguma das
situações previstas nos arts. 267 e 269” do CPC”). Embora dogmaticamente a sentença deva ser definida
pelo seu conteúdo, não estava o sistema recursal a ela adaptado, reinando, assim, a discórdia entre a
letra da norma e a doutrina que, em grande esforço hermenêutico, tentava adaptá-la ao sistema recursal
[A “nova redação dada ao § 1º do art. 162 quer significar que o proferimento da sentença pode ensejar,
no máximo, o encerramento de determinadas atividades praticadas pelo juízo em primeiro grau de
jurisdição” (BUENO, Cassio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil. São Paulo:
Saraiva, 2006. p. 6)]. O CPC-2015, então, contornou esse problema ao definir a sentença pelo conteúdo
e pelo efeito, compatibilizando-o com o novo sistema recursal.
(67) Em sentido contrário e apegado à exigência de citação para a execução, como determinado no
art. 880 da CLT, Manoel Antonio Teixeira Filho entende que o sicretismo não se instalou no processo
do trabalho. Assim, o conceito do art. 204, § 1º, do CPC não se aplica ao processo do trabalho. Neste
a sentença põe fim ao processo e a execução é autônoma. Segundo ele, “por mais estranho que possa
parecer, no processo do trabalho subsiste o antigo conceito de sentença como o ato pelo qual o juiz põe
fim ao processo, examinando ou não o mérito da causa” (TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Comentário ao
novo Código de Processo Civil sob a perspectiva do processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2015. p. 235).
Diverso, porém, é o entendimento da 2ª Turma do TST (embora parta de premissa equivocada): “Isso
porque esse entendimento traz subjacente a superada ideia de bipartição entre ação de conhecimento e
ação de execução, que já não existia no Processo do Trabalho, caracterizado por uma relação processual
única, mesmo antes das reformas do CPC, que implicaram a consolidação do chamado processo sincrético,
identificado pela união de tutelas cognitivas e executivas, para declarar e satisfazer o direito em um
processo apenas, vindo a contribuir para a economia, celeridade e instrumentalidade processuais, de

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