A Arte Jedi de Viver: Emoções Políticas para uma Sociedade Justa

AutorRafael Lourenço Navarro
Ocupação do AutorFilósofo formado pela PUC Minas e Doutorando em Teoria do Direito no PPGD da PUC Minas.
Páginas179-200
A ARTE JEDI DE VIVER:
EMOÇÕES POLÍTICAS PARA
UMA SOCIEDADE JUSTA
Rafael Lourenço Navarro1
Como parte inerente da vida humana, emoções são partes constitutivas da
vida política de qualquer sociedade. E nas democracias liberais modernas isso não
é menos verdadeiro do que em outros períodos históricos. Com isso em mente,
a pensadora norte-americana Martha Nussbaum apresenta em seu livro Political
Emotions: Why Love Matters for Justice uma análise das emoções que podem in-
uenciar a vida política de uma nação. Emoções como o medo do desemprego,
asco ou repulsa pelos necessitados ou amor demasiado por valores guerreiros,
frequentemente tornam-se bastante intensos e tendem a arrastar multidões com
seu ímpeto.
Não é preciso, porém, que estas emoções cheguem ao ponto do antissemitis-
mo nazista para serem nocivas, ou que sejam invocadas por gurus, profetas ou re-
volucionários, como Gandhi, para gerar bons resultados. Emoções causam efeitos
duradouros e de larga escala em uma nação ou comunidade política em busca de
objetivos como justiça social e desenvolvimento. Como arma Nussbaum, emo-
ções “podem dar vigor e profundidade à busca destes objetivos, mas elas também
podem tirar esta busca dos trilhos, introduzindo ou reforçando divisões, hierar-
quias, e formas de negligência e obtusidade.22 A questão decisiva que pretendo
abordar é quais tipos de emoções podem ajudar uma sociedade a produzir formas
1 Filósofo formado pela PUC Mina s e Doutorando em Teoria do Direito no PPGD da PUC Minas.
2 “ey can give t he pursuit of these goa ls new vigor and dept h, but they can als o derail that
pursuit, introduci ng or reinforcing divisions, h ierarchies, and forms of neg lect or obtuseness.”
(Martha Nussbau m, Political Emotion s: Why Love Matters for Justice , Havard University
Press: 2015, p. 2)
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RAFAEL LOURENÇO NAVARRO
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de vida desejáveis e quais emoções ameaçam a diversidade de projetos de vida
boa, empobrecendo social e politicamente uma nação. O que se busca é apontar
para a política que vem33. Apresentar uma leitura sociopolítica onde uma pessoa
possa agir fundamentando-se em razões e respondendo a regras, assumindo res-
ponsabilidades e exercendo liberdade em harmonia com as emoções e sentimen-
tos humanos.
Para tanto, recorrerei a um fenômeno cultural de proporções globais que pos-
sui suas manifestações mais marcantes no cinema, Star Wars. Há muito tempo, em
uma galáxia muito distante, os Jedi e os Sith possuíam códigos que lhes indicavam
as regras para lidarem com suas emoções, e no contexto sociopolítico da Antiga
República, e posteriormente do Império Galáctico, inuenciaram profundamente
os acontecimentos políticos retratados nos lmes, séries de TV, jogos de video-
game, inúmeros livros e quadrinhos. A narrativa assumida focará em três guras
principais, Anakin Skywalker/Darth Vader, Obi-wan Kenobi e Luke Skywalker,
a m de produzir algum insight sobre a relação entre códigos, regras, técnicas e
emoções, tão cara e profusamente debatida no Direito.
E por que Star Wars como foco em um texto sobre Direito e Literatura?
Primeiramente, para defender a posição de que “literatura” é um termo que se for
entendido com um signicado muito estrito corre o risco de perder exatamente
o sentido que a corrente de pensamento “Direito & Literatura” pretende, a saber,
expandir as possibilidades de sentido de um texto ou narrativa. A proximidade
do cinema com o teatro, uma das formas clássicas da literatura, permite a classi-
cação do roteiro cinematográco como texto literário. A denição aristotélica de
que a literatura é a narrativa capaz de produzir catarse, de despertar emoções e
sentimentos no leitor/ouvinte, permite colocar o cinema na categoria que a cor-
rente Direito & Literatura chama de “literaturas marginais”.
Além disso, o projeto de Nussbaum, que se assume aqui como uma ferramen-
ta para a política que vem, mira em emoções e racionalidade pública. Com isso
em mente, o alcance de uma obra cinematográca como Star Wars faz dela uma
opção adequada e muito interessante, daí a escolha deste foco para o atual texto.
Interessante porque a gura do Jedi, nosso foco, representa tanto um modelo de
uma instituição tendo de se ver com questões políticas quanto com a relação entre
códigos normativos e formas-de-vida. Como diz Agamben:
3
Giorgio Agamben ao longo da sua obr a fala em uma “política que vem” para se referir a u m
modo de se pensar a ét ica e a política sem cair nos luga res comuns e jargões tradicionai s.
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