Compliance no direito tributário

AutorElizabete Rosa de Mello
Páginas87-103
COMPLIANCE NO
DIREITO TRIBUTÁRIO
Elizabete Rosa de Mello
Professora Adjunta de Direito Tributário da Universidade Federal de Juiz de Fora
Sumário: 1. Introdução – 2. Conceito de compliance e de integridade – 3. Programas de integridade
e estímulo à conformidade tributária – 4. A obrigação tributária como processo e a conformidade
aplicada aos procedimentos – 5. Conclusões – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O Sistema Tributário Brasileiro, na sua complexidade, apresenta desafios tanto
para o Ente da Federação (União, Estados-membros, Distrito Federal e Munícipios)
como para o sujeito passivo (contribuintes e responsáveis tributários). Para o Ente
da Federação, a Constituição da República Federativa do Brasil (Brasil, 1988), em
seus artigos 145-156, estabelece competência tributária para instituir seus próprios
tributos. Surge daí a dificuldade do exercício da capacidade tributária necessária para
arrecadar, fiscalizar e cobrar tributos. Já para o sujeito passivo, a dificuldade está em
cumprir as obrigações tributárias principais e acessórias devido ao emaranhado de
normativas.
Um meio de reduzir tais dificuldades é a instituição do compliance, que nada
mais é do que uma maneira de realizar atos conforme estabelecidos em leis, decretos,
regulamentos, procedimentos e afins. Um programa de compliance bem estruturado
constitui um instrumento adequado para nortear as condutas durante todos os pro-
cedimentos de cobrança, de fiscalização e de pagamento dos tributos, de forma que
sejam realizados conforme a legislação tributária. Serve, portanto, tanto ao sujeito
ativo, como ao sujeito passivo. O resultado é a prevenção de infrações e evasões
fiscais, além de reduzir a exposição do sujeito passivo a penalidades como multas e
juros moratórios. Trata-se, portanto, de uma vantagem dupla, que contempla ambos
os polos da relação jurídica tributária.
Por se tratar de um instituto cuja introdução no campo do Direito é recente,
apresentar sua conceituação constitui o primeiro passo para sua compreensão. Ao
lado da definição formal, discute-se o problema da “não conformidade” do processo,
que é a consequência de não se ter um programa de compliance bem estruturado, o
que afeta, também, tanto o Ente da Federação como o sujeito passivo. Como exem-
plificação dos esforços das autoridades governamentais para enfrentar a questão,
apresenta-se dois programas de integridade: o “Nos Conformes” do Estado de São
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Paulo e o “Pró-conformidade” da Secretaria da Receita Federal, apontando algumas
críticas.
Por fim, abordaremos a obrigação tributária como processo, uma forma de
fazer com que conformidade tributária esteja presente em todos os procedimentos,
desde a ocorrência do fato gerador até o pagamento por parte do sujeito passivo, ou
a execução fiscal por parte do Ente Federativo.
2. CONCEITO DE COMPLIANCE E DE INTEGRIDADE
O conceito de integridade precede o de compliance. Ser integro é a qualidade de
alguém ou de algo em que esteja presente a ética, a moral, o cumprimento irrestrito
de normas e procedimentos. Esses adjetivos constituem a estrutura basilar tanto do
empresário como do ente da federação. Não se pode falar em compliance sem ter em
mente que seu objetivo principal é garantir a integridade das partes.
Embora o compliance possa ser traduzido por “conformidade” é usual o emprego
no Brasil do termo na sua forma inglesa. Por essa razão utilizaremos indiferente-
mente ambos os termos daqui para a frente. Podemos então definir compliance como
conformidade ou submissão a uma norma. Quando se diz que alguma coisa ou fato
é conforme, ou compliance, estamos afirmando que tal situação se enquadra perfei-
tamente no que dela se esperava. Buscando um exemplo de uma situação tributária
que está presente no imaginário de brasileiros economicamente ativos, podemos
dizer que um contribuinte que entrega sua declaração de ajuste do imposto sobre
renda e proventos e qualquer natureza dentro do prazo, está em conformidade legal
quanto ao prazo.
Vanessa Alessi Manzi conceitua compliance como “[...] todo ato de cumprir, de
estar em conformidade e executar regulamentos internos e externos, impostos às
atividades da instituição, buscando mitigar o risco atrelado à reputação e ao regu-
latório/legal”1.
No âmbito empresarial para Alexandre Ferreira de Assumpção Alves e Caroline
da Rosa Pinheiro, a expressão compliance:
[...] se refere a um conjunto de procedimentos adotados por uma determinada sociedade, obje-
tivando otimizar o cumprimento de normas legais, regulamentos e políticas estabelecidos pela
organização, com o intuito de mitigar riscos e responsabilidades2.
Do ponto de vista normativo, cabe à Associação Brasileira de Normas Téc-
nicas (ABNT), a responsabilidade pela elaboração das Normas Brasileiras (ABNT
NBR), em esforço conjunto de seus Comitês Brasileiros (ABNT/CB), Organismos
de Normalização Setorial (ABNT/ONS) e Comissões de Estudo Especiais (ABNT/
1. MANZI, 2008, p. 15.
2. ALVES; PINHEIRO, 2017, p. 43-44.
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