Dano moral coletivo nas relações trabalhistas

AutorAndré Araújo Molina e Ney Maranhão
Páginas249-268
DANO MORAL COLETIVO
NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS
André Araújo Molina
Professor Titular da Escola Superior da Magistratura Trabalhista de Mato Grosso (ESMA-
TRA/MT), Professor convidado do Centro de Formação do Tribunal Superior do Trabalho
(CEFAST) e de diversas Escolas Judiciais de Tribunais Regionais do Trabalho. Doutor em
Filosoa do Direito (PUC/SP), Mestre em Direito do Trabalho (PUC/SP), Especialista
em Direito Processual Civil (UCB/RJ) e em Direito do Trabalho (UCB/RJ), Bacharel em
Direito (UFMT) e Juiz do Trabalho Titular no TRT da 23ª Região (Mato Grosso).
e-mail: aamolina@bol.com.br
Ney Maranhão
Professor Adjunto do Curso de Direito da Universidade Federal do Pará (Graduação e
Pós-Graduação stricto sensu). Doutor em Direito do Trabalho pela Universidade de São
Paulo (USP), com estágio de Doutorado-Sanduíche junto à Universidade de Massachu-
setts (Boston/EUA). Mestre em Direitos Humanos pela Universidade Federal do Pará
(UFPA). Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade de Roma – La Sapienza
(Itália). Professor convidado de diversas Escolas Judiciais de Tribunais Regionais do
Trabalho. Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Macapá (AP) (TRT da 8ª Região/PA-AP).
e-mail: ney.maranhao@gmail.com
Sumário: 1. Introdução – 2. A evolução do conceito de dano moral – 3. O dano moral coletivo
e a possibilidade de sua ocorrência na esfera laboral – 4. O dano moral coletivo trabalhista e
a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho – 5. Conclusões – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Neste texto, promovemos estudo técnico-científ‌ico do chamado dano moral
coletivo no âmbito das relações jurídicas de trabalho. Para tanto, inicialmente,
recuperamos a evolução do conceito de dano moral e, em seguida, cuidamos do
dano moral coletivo, propriamente dito, e das justif‌icativas viabilizadoras de sua
ocorrência também na esfera laboral. Após, analisamos o tema à luz da polêmica Lei
13.467/2017, que imprimiu a chamada Reforma Trabalhista, e estabelecemos diálogo
com o Tribunal Superior do Trabalho por meio de análise crítica de alguns de seus
principais acórdãos concernentes ao assunto.
2. A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE DANO MORAL
Inspirados pela visão patrimonialista do Código Civil francês de 1804, os juristas
do século XIX não admitiam os danos extrapatrimoniais como uma categoria autôno-
ma, sendo apenas com os estudiosos das décadas seguintes que se reconheceu a sua
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existência e ressarcibilidade, além dos prejuízos f‌inanceiros que eram gerados pelos
atos ilícitos. Aos novos prejuízos extrapatrimoniais autônomos foi dado o nome de
“dano moral”, em uma perspectiva negativista, como tudo aquilo que estava fora do
patrimônio, como bem se observa da doutrina de René Savatier: “(...) dano moral é
todo sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária”.1 Para essa
posição, a classif‌icação do dano levava em consideração o ente atingido. Se violado
um objeto, intitulava-se de dano patrimonial, mas se a violação alcançava ente que
não poderia ser apreciado monetariamente, como aspectos íntimos do ser humano,
então estava-se diante dos danos morais, razão pela qual embutiu-se no conceito dos
últimos as exteriorizações psíquicas da vítima da lesão.
Nessa perspectiva excludente e negativista dos danos morais, todo dano que
não conf‌igurasse dano emergente ou lucro cessante poderia candidatar-se a ser
identif‌icado como dano moral, desde que estivesse acompanhado de dor, vexame,
sofrimento etc.,2 cuja posição também recolheu elementos subjetivos relacionados
às repercussões sentimentais do ato ilícito sobre a vítima (pretium doloris).
Expoente da posição subjetiva clássica entre nós, Yussef Said Cahali conceitua
dano moral como tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo os
valores fundamentais inerentes à personalidade ou reconhecidos pela sociedade em
que a vítima esteja integrada, sendo evidenciado na dor, na angústia, no sofrimento,
na tristeza pela ausência de um ente querido, no desprestígio, na desconsideração
social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da pri-
vacidade, no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos e nas demais
situações de desgaste psicológico.3
A posição subjetivista dos danos morais propiciou um didático debate juris-
prudencial em torno da conf‌iguração ou não dessa espécie de dano no caso de um
passageiro de companhia aérea que teve a sua bagagem extraviada durante o trans-
porte para uma viagem de férias ao exterior.
No julgamento de segunda instância pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
foi mantida a sentença originária no sentido de rejeitar a indenização por danos mo-
rais, sob o fundamento de que “a simples sensação de desconforto ou aborrecimento,
ocasionado pela perda ou extravio de bagagens, não constitui dano moral, suscetível
de ser objeto de reparação civil.”
A decisão de rejeição foi mantida pelo Superior Tribunal de Justiça, mas pelo
argumento técnico de que a Convenção de Varsóvia veda o ressarcimento por danos
morais no transporte aéreo, embora tenha o Ministro Relator, a partir de suas per-
cepções subjetivas, discordado das conclusões do tribunal f‌luminense. Para o Mi-
nistro Eduardo Ribeiro: “Considero, ao contrário do acórdão, que o aborrecimento,
1. Savatier, Traité de la responsabilité civile, n. 525.
2. Facchini Neto e Wesendonck, Danos existenciais, p. 232.
3. Cahali, Dano moral, p. 22-23.
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