Dentro da bolha: política identitária na era da hiperconectividade
Autor | Gabriela Campos Alkmin |
Páginas | 42-63 |
42 • Revolução Informacional - capítulo 3
Dentro da bolha: política identitária
na era da hiperconectividade
Gabriela Campos Alkmin
Resumo
O trabalho pretende oferecer uma contribuição para as
análises críticas da chamada “política identitária” a partir das con-
tribuições da losoa informacional. Após a apresentação de um
breve conceito de “política identitária” e de suas principais críticas
teóricas, busca-se compreender como a ampliação do uso de Tec-
nologias da Informação e Comunicação revolucionou as sociedades
contemporâneas, constituindo uma realidade híbrida entre o real e
o virtual. Nesse contexto, defende-se que as disputas políticas basea-
das na identidade são cada vez mais presentes no ciberespaço, espe-
cialmente nas redes sociais, o que sugere a facilitação da criação de
laços de solidariedade política entre usuários. Contudo, a partir da
análise do funcionamento e dos objetivos das plataformas virtuais,
pondera-se que essas redes dicultam os diálogos com o diferente
e a constituição de alianças políticas abrangentes, que extrapolem
o pertencimento identitário. Isso porque, para manter a atenção do
usuário por mais tempo, essas plataformas criam ltros-bolhas de
conteúdo personalizadas para cada pessoa, selecionando aquilo que
conrma preconcepções e endossa opiniões prévias. Assim, sugere-
-se que esse mecanismo diculta a criação de diálogos e o estabele-
cimento de objetivos coletivos comuns para além de uma armação
identitária individualizante.
Introdução
Nos últimos anos, as demandas de grupos politicamente
minoritários1 têm sido conduzidas, cada vez mais, de uma maneira
que pressupõe e arma o pertencimento identitário de seus sujeitos.
Utilizo o termo “politicamente” para demarcar que essas populações não
são numericamente minoritárias, mas se caracterizam como minorias no
sentido de que representam interesses não-hegemônicos do ponto de vista
histórico, social, político e cultural.
Gabriela Campos Alkmin • 43
Nesse sentido, observa-se que grande parte das lutas feministas,
antirracistas e LGBT+ – para citar apenas alguns exemplos –
apostam na semelhança da identidade como fator de aglutinação
política, constituindo o que se tem chamado de “política identitária”.
A política identitária, então, é a forma de atuação política
que se utiliza de categorias de identidade para conduzir ativismos,
disputar narrativas culturais e apresentar reivindicações perante o
Direito, o Estado e outras instâncias do poder. Essa estratégia tem
sido objeto de análises críticas que questionam o potencial transfor-
mador da aposta identitária, ao mesmo tempo em que uma série de
movimentos sociais conduzidos por grupos minoritários reiteram
a necessidade da armação da identidade como pressuposto para a
ação política.
Em anos recentes, a ampliação dessas demandas na esfera
pública pôde ser notada tanto nas experiências físicas/o-line, quan-
to em experiências virtuais/on-line2. Com a crescente incorporação
de Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) a nossas vidas,
criando uma realidade hiperconectada que Luciano Floridi (2014)
denomina de “onlife”, as redes sociais tornaram-se palco recorren-
te das disputas identitárias contemporâneas. Nesse sentido, uma
análise crítica da política identitária deve levar em consideração a
maneira como essas plataformas digitais funcionam; como esse fun-
cionamento inuencia o comportamento de seus usuários e qual o
impacto disso para as demandas políticas que são vocalizadas no ci-
berespaço, especialmente em uma época de hiperconectividade.
Neste trabalho, buscarei apresentar, brevemente, algumas
das questões que a compreensão da realidade onlife impõe ao estudo
da política identitária e para a crítica que tem sido desenvolvida a
seu respeito. É preciso explicitar, desde já, que este trabalho não se
propõe a investigar as implicações diretas do uso de TICs e de re-
des sociais para construção da identidade pessoal ou do self – uma
discussão profícua que tem sido empreendida por diversos autores
(CHENEY-LIPPOLD, 2011; DURANTE, 2011; SCHECHTMAN,
2014; TURKLE, 2011). Procurarei, por outro lado, avaliar a maneira
como as plataformas virtuais, em especial as redes sociais, em razão
É possível traçar diferenças entre real e o-line, bem como entre virtual
e on-line, mas, para a nalidade deste trabalho, esses âmbitos podem ser
considerados equivalentes. Para essa discussão, ver: DURANTE, 2011.
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO