Direitos políticos

AutorAndré Del Negri
Ocupação do AutorMestre em Direito Constitucional pela UFMG
Páginas161-213
Capítulo
8
DIREITOS POLÍTICOS
Sumário: 8.1 Aspectos preliminares em teoria da Democracia
e Direitos Políticos – 8.2 A ideologia da democracia pela maio-
ria – 8.3 Democracia pelos co-construtores da norma – 8.4 O
Processo Constitucional como discurso institucionalizado – 8.5
Peculiaridades dos direitos políticos – 8.5.1 Sufrágio – 8.5.2
Voto – 8.6 Outros aspectos descritivos em direitos políticos
8.6.1 PlebiscitoeReferendo:algunsapontamentosdescritivos-
1.6.2 Brevíssimas considerações críticas – 8.6.3 Condições de
elegibilidade:casosdeperda e suspensão dos direitos políticos
8.7Casos deinelegibilidade– 8.7.1Inelegibilidadeabsoluta
8.7.2Inelegibilidaderelativa–8.8 Sistemas eleitorais – 8.8.1
Sistema majoritário – 8.8.2 Sistema proporcional – 8.8.3 Siste-
ma distrital – 8.9 Partidos políticos – 8.10 Sistema de governo:
cogitaçõesterminológicas– 8.10.1 Parlamentarismo – 8.10.2
Presidencialismo – 8.10.3 Neoparlamentarismo
8.1 ASPECTOS PRELIMINARES EM TEORIA DA DEMOCRACIA E
DIREITOS POLÍTICOS
Antes de procurar delimitar os contornos técnicos dos diretos
políticos,édeproveitopercorrer,brevemente, a análise da palavra
“política”,quecomparecevezessemcontanalinguagemusual,com
inúmerasroupagens,como“direitopolítico”,“regimepolítico”,“sis-
temapolítico”,“políticadecrédito”,“políticahabitacional”,“política
desegurança”,“políticamigratóriaˮ,entreoutrascongurações.
Emborasejaabundantementeutilizada,sabe-sequeapolítica visa es-
tabelecer“metasaseremalcançadasqueestão,geralmente,associadasao
crescimentoeconômico, e aspectos que dizem respeito ao bem-estar da
coletividade.Favoreceouprotegealgumametacoletivadacomunidade”.1
1 MACIEL,Gabriel deDeus. Teoria do processo e legitimidade decisória: dis-
cursode aplicaçãoe argumentaçãode adequabilidade nodireito democrático.
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teoria da constituição e direito constitucional
andré del negri
call e put
Claro,que,aforaasreexõeslosócas,aPolítica passa pela nor-
matização do Direito.
Adespeitodessaobservação,detecta-se,que,oDireito,materiali-
za a conversão do poder político em direito político, o qual se presta
aregulamentar “metas”, que interessamàcoletividade ligando-se à
construção da uma estrutura de relações de representatividade.
Nessa linha, desservem ao Direito Constitucional, na democracia,
os estudos dos Direitos Políticos mediante avaliação de que o eixo
da democracia se encontra no voto.2Sobram escritos epessoas que
sustentam que “democracia é o governo do povo, pelo povo e para o
povo”(fraseproferidaporAbrahamLincoln,16ºpresidentedosEs-
tadosUnidos, nodiscurso deGettysburg,em1863).É umaretórica
que nem chega perto da tensão que a palavra democracia carrega.
Conceitos como esse, disfarçados de democracia, transformaram-se
na tragédia do Holocausto. O tema é muito mais complexo. Aliás, a
palavra povo exige certa precaução já sinalizada por Friedrich Müller,
conforme análise no Capítulos 1, deste livro.3
A Constituição de 1988 trouxe a democracia de volta, se é que o
Brasilumdiatevedemocraciaestávelesegura.Outranãoéasensibi-
lidade de Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982),4 que ao comentar
2006. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade
CatólicadeMinasGerais,BeloHorizonte,2006,p.23.
2 Muitos ditadores deram mostras de farsas eleitorais ao longo dos períodos his-
tóricos.Note-sequeKimJong-um,daCoreiadoNorte,em2014,foieleitocom
100% dos votos. Além disto, depostos presidentes conseguiram marcas singu-
lares de votação. Deste modo, na Síria, Bashar al-Assad, em 2007, teve o apoio
de97,2% deseus compatrícios.Poresses resultados,ou bempróximo aisso,
chegaramospresidentesdaTunísia,ZineelAbidineBemAli,edoEgito,Hosni
Mubarak,commargenssuperioresaos94%.Emvistadisso,SaddamHussein,
em 1995, fora aprovado por 99,96% dos iraquianos e, em 2002, conseguiu a
façanhadeatingiros100%.Apósessequadro,nadamaispodemosfazersenão
mencionar que o eixo da democracia não se encontra no voto. Cf. DEUTSCH,
David. The beginning of innity: Explanations thattransform theworld.New
York:Viking,2011,p.345.
3 MÜLLER, Friedrich. Quem é o povo?: a questão fundamental da democracia.
Tradução de Peter Naumann. São Paulo: Max Limonad, 2000.
4 HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das
letras, 1995, p. 160.
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ascondiçõesdevidapolíticabrasileirachamouaatençãoparaofato
de que “a democracia no Brasil foi sempre um lamentável mal-en-
tendido. Uma aristocracia rural (e semifeudal) importou-a e tratou de
acomodá-la, onde fosse possível, aos seus direitos e privilégios, os
mesmos privilégios que tinham sido, no Velho Mundo, o alvo da luta
daburguesiacontraaaristocraciaˮ.
De conseguinte, se considerar que a democracia brasileirafoicingi-
daemseuspontoshistóricos,bastarelembraroperíododedistorçãola-
mentável de 1964 a 1985. Há alguns anos, entretanto, estamos sofrendo
a falta de implementação das regras do Estado Democrático de Direito,
porqueaimensamaioriadosescritoresaindanãotrabalha indexadaa
ummarcoteóricodesenvolvidodentrodoreferidoparadigmajurídico.
As poucas universidades grandes e pensantes, no Brasil, por intermédio
dapós-graduação,começaram, nos últimos anos, a tomar iniciativas
para desenvolver novas teorias e expansão do conhecimento.
De certo modo, os Estados Unidos foram um dos primeiros pa-
íses, na modernidade, a enfrentar sérios problemas de racismo.
No século XX, a luta contra o terrorismo provocou preocupações com
asminoriaseaeconomiatornou-seomeiocientícomaisadequado
para comprovação da exclusão social. Até em que ponto as pessoas
vãocompactuarcomaarmaçãodequeademocraciaéogovernoda
maioria?Quantotempolevarápara rejeitarmosdenitivamente essa
visão de que onde “uma maioria governa, a minoria não teria direitos
assegurados?”Porque,então,falarem“minoriasedemocraciano
Brasil?”5 Visto isso, cuidou Andréa Alves de Almeida6dedenir -
tidoscontornosem relaçãoaoassunto,citandoFröbel,7 que “o prin-
cípio da maioria deve conviver com um espaço discursivo em alto
nível para garantir o exercício da minoria, que não poderá estar priva-
dadetentar,pormeiodapropagandateórica,aposiçãodemaioria”.
Pode-se acrescentar mais: “nesse sentido, o princípio da maioria deve
5 CATTONI, Marcelo Andrade. Minorias e democracia no Brasil. Revista ele-
trônica da PUC MinasVirtuajus.Disponívelem:.
Acesso em 15 dez. 2005.
6 ALMEIDA, Andréa Alves. Espaço jurídico processual na discursividade meta-
linguística. Curitiba:EditoraCRV,2012,p.114.
7 FRÖBEL, Julius. System der sozialen politik. Manhein, 1874. Reimpressão:
Aallen, Scientia, 1975. Teil 2. Teil 2.
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