Efeitos da condenação trabalhista no âmbito previdenciário: necessidade do recolhimento das contribuições e do cumprimento das obrigações acessórias

AutorJoão Batista Lazzari - Valéria Gaurink Dias Fundão
Páginas121-135

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valéria gaurinK dias Fundão 2

Introdução

Este artigo coloca em foco a importância do recolhimento das contribuições previdenciárias decorrentes da condenação pecuniária no âmbito trabalhista, bem como do correto cumprimento das obrigações aces-sórias a cargo do empregador, tendo em vista que as verbas salariais ou de prestação de serviços auferidas devem repercutir em sua totalidade em favor do segurado mediante a inclusão das informações no CNIS (Cadastro Nacional de Informação Social).

A falta de sintonia entre o resultado da decisão da Justiça do Trabalho e o sistema previdenciário decorre, também, da ausência de postulação para a retificação da GFIP nas competências que envolvem a condenação judicial. A consequência desse relapso costuma surgir no momento em que são postulados os benefícios junto ao INSS, ocasião em que são conferidos os períodos trabalhados e os salários de contribuição constantes no CNIS.

É fato que, normalmente, o trabalhador quando procura o INSS e requer algum benefício, considera baixo o valor da renda mensal, mas não entende o real motivo. Nesse contexto, examinar-se-á o prejuízo econômico que o segurado sofre no cálculo do salário de benefício.

O trabalhador se socorre da Justiça do Trabalho porque no período laborado identificou ausência de anotação da CTPS ou falta de pagamento de verbas a que tinha direito e, consequentemente, as contribuições devidas ao INSS não foram recolhidas.

É da Justiça do Trabalho a competência para executar, de ofício, as contribuições sociais incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho, pagos ou creditados, a qualquer título à pessoa que lhe preste serviços, mesmo sem vínculo empregatício, nos termos do art. 114, VIII, da Constituição da República, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/2004. Desse modo, cabe à Justiça do Trabalho intimar a empregadora/contratante condenada a apresentar em Juízo a Guia de Recolhimento da GFIP.

E, ainda, é inaceitável que a empresa descumpra a legislação, o que ocasiona prejuízos aos empregados/beneficiários, como também ao erário. Portanto, deve a Justiça do Trabalho ficar atenta a esse descumprimento da lei na execução previdenciária, não deixando de aplicar a astreinte, em benefício do

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trabalhador e oficiar a Receita Federal para aplicação das multas cabíveis.

Trataremos, pois, nos capítulos que se seguem das questões atinentes ao recolhimento das contribuições nas ações trabalhistas e à forma de cálculo e revisão dos benefícios previdenciários.

No primeiro momento, será abordado o histórico legislativo das contribuições previdenciárias e a Emenda Constitucional n. 45/2004 que estabeleceu, de forma clara e precisa, que a Justiça do Trabalho é competente pra executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir.

A realização do presente estudo encontra justificativa no fato de que milhares de trabalhadores que ingressam com ações trabalhistas e obtêm o reconhecimento de vínculo empregatício e/ou o direito ao pagamento de parcelas de natureza salarial, ainda necessitarão ajuizar nova ação judicial contra o INSS na Justiça Federal para fins previdenciários, o que representa uma falta de racionalidade do sistema.

Evolução histórica da competência da justiça do trabalho no que se refere à contribuição previdenciária

Inicialmente, se faz necessário traçar a evolução histórica da competência da Justiça do Trabalho no que se refere à contribuição previdenciária.

Determinou o art. 12 da Lei n. 7.787, de 30.06.1989, a obrigação do recolhimento das contribuições previdenciárias na hipótese de extinção dos processos trabalhistas, in verbis:

Em caso de extinção de processos trabalhistas de qualquer natureza, inclusive a decorrente de acordo entre as partes, de que resultar pagamento de vencimentos, remuneração, salário e outros ganhos habituais do trabalhador, o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social será efetuado in continenti.

A palavra in continenti significa sem demora, de imediato. A lei, porém, não estabeleceu qual é o prazo para o recolhimento da contribuição previdenciária, entendendo-se que será o mais rápido possível (MAR-TINS, 2003).

Nesses termos, a partir da própria sentença ou acordo trabalhista, fazia-se incidir as alíquotas legais das contribuições. E mais, caso não fosse possível distinguir entre as várias espécies de verbas objeto de acordo, como ganhos habituais e indenizações (estes últimos não sujeitos à incidência das contribuições), a Autarquia passaria a ser autorizada a fazer incidir a alí-quota sobre todo o montante.

Pontua Ana Maria Aparecida de Freitas:

Observa-se, então que ainda não havia a competência material da Justiça do Trabalho para executar a contribuição previdenciária, mas, apenas, o dever de a autoridade judiciária velar pelo recolhimento do tributo, mas, sem qualquer poder de coerção, nas hipóteses em que o devedor não procedia a comprovação do recolhimento, nos autos.3

Em 1990, o TST editou o Provimento n. 1, de 20.01.1990, determinando a observância do art. 12 da Lei n. 7.787/1989, dispondo que a Justiça do Trabalho não possuía competência para compelir executivamente cobranças de contribuições previdenciárias, já que a Constituição Federal atribuía esse dever à Justiça Federal.

A Lei n. 8.212/1991 (Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS) incorporou o art. 12 da Lei n. 7.787/1989, em seu art. 43, o qual apenas fazia menção ao pagamento de remuneração ao segurado e não mais a pagamento de vencimentos, remuneração, salários e outros ganhos habituais do trabalhador (MARTINS, 2004, p. 15).

Posteriormente, a Lei n. 8.620, de 05.01.1993, ofereceu nova redação aos arts. 43 e 44 da Lei n. 8.212/1991. O art. 43 da Lei n. 8.212 passou a estar assim especificado:

Nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob pena de responsabilidade, determinar o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social.

Já o parágrafo único do art. 43 determinou o seguinte:

Nas sentenças judiciais ou nos acordos homologados em que não figurarem, discriminadamente, as parcelas legais relativas à contribuição previdenciária, esta incidirá sobre o valor total apurado em liquidação de sentença ou sobre o valor de acordo homologado.

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O art. 44 teve sua redação ampliada:

A autoridade judiciária exigirá a comprovação do fiel cumprimento ao disposto no artigo anterior, inclusive fazendo expedir notificação ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, dando-lhe ciência dos termos da sentença ou do acordo celebrado.

Desta forma, o Juiz do Trabalho não apenas determinava o imediato recolhimento das contribuições previdenciárias, sob pena de responsabilidade, mas passava a velar pelo seu fiel cumprimento, fazendo expedir notificação ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, dando ciência dos termos da sentença ou do acordo celebrado, a fim de que a Autarquia Previdenciária cuidasse de cobrar, perante a Justiça Federal comum, a contribuição previdenciária decorrente da reclamação trabalhista, caso o devedor não houvesse comprovado nos autos o regular recolhimento.

Vê-se também ato da Corregedoria da Justiça do Trabalho no art. 10 do Provimento n. 2, de 18 de agosto de 1993:

Não poderá ser controvertida perante a Justiça do Trabalho qualquer pretensão alusiva às obrigações do demandado pertinentes às contribuições previdenciárias, ressalvada a definição da natureza jurídica das parcelas devidas ao empregado e a correspondente incidência do desconto da contribuição previdenciária.

No período que vai até a vigência da Emenda Constitucional n. 20, de 15.12.1998, a atuação do Juiz do Trabalho consistia em verificar a existência de débito previdenciário e, caso não fosse quitada espontaneamente pelo empregador, não sendo possível a execução da contribuição previdenciária nos próprios autos do processo trabalhista, era expedido um ofício ao INSS.

O INSS, após receber as informações do Juiz do Trabalho, procedia na forma do disposto na Ordem de Serviço Conjunta DAF/DSS n. 66, de 10.10.1997, analisando se existiam parcelas sujeitas à incidência de contribuição previdenciária, fixando prazo para o recolhimento das contribuições devidas, se fosse o caso e, por fim, lavrava a Notificação Fiscal de Lançamento de Débito (NFLD).

Portanto, caso não fossem pagas no prazo estipulado, as parcelas sujeitas à incidência de contribuição previdenciária pelo empregador, ocorreria a inscrição na dívida ativa, possibilitando sua execução em favor de Previdência perante a Justiça Federal.

Com o advento da Emenda Constitucional n. 20/1998, foi acrescentado o § 3º ao art. 114 da Constituição Federal, ampliando a competência ali prevista ao dispor que: “Compete ainda à Justiça do Trabalho executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir.”

Assim, das decisões emanadas da Justiça do Trabalho, além da execução das verbas trabalhistas em si, devidas ao empregado, devem ser executadas as demais verbas, de natureza previdenciária, decorrentes da relação de emprego.

A norma, oriunda do poder constituinte derivado, suscitou intensa controvérsia doutrinária, chegando-se a cogitar de sua inconstitucionalidade, sob a alegação de violação do princípio da separação dos Poderes, do juízo natural e, ainda, do princípio do devido processo legal...

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