História do Brasil

AutorRodrigo Goyena Soares
Páginas339-418
1. O PERÍODO COLONIAL
1.1. A conguraç ão territorial da América
Portuguesa
Os velhos, as mulheres, os meninos que não têm forças,
nem armas com que se defender, morrem como ovelhas
inocentes às mãos da crueldade herética, e os que podem
escapar à morte, desterrando-se a terras estranhas, per-
dem a casa e a pátria. […] Não fora tanto para sentir, se,
perdidas fazendas e vidas, se salvara ao menos a honra;
mas também esta a passos contados se vai perdendo;
e aquele nome português, tão celebrado nos anais da
fama, já o herege insolente com as vitórias o afronta, e o
gentio de que estamos cercados, e que tanto o venerava
e temia, já o despreza.
VIEIRA, A. Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal
contra a Holanda. In: BOSI, A. (org.) Essencial Padre Antônio
Vieira. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 248.
(Diplomacia – 2019 – IADES) Considerando as dimensões eco-
nômica, social e política da América portuguesa, julgue
(C ou E) os itens a seguir.
(1) Condenada por intelectuais da igreja como Antônio
Vieira, a escravidão indígena foi proibida logo no pri-
meiro século de colonização da América portuguesa.
Sintomas da mudança do padrão de mão de obra
indígena para o africano ao longo do século 16 foram
o m das bandeiras, na capitania de São Vicente, e o
início da edicação de reduções jesuíticas, como a
de Sete Povos das Missões.
(2) A escassez de meios, nas forças armadas regulares de
Portugal, para guarnecer suas possessões no ultramar
motivou as elites coloniais a organizarem meios de
defesa próprios, geralmente sem instrução militar
formal. Exemplos disso são a construção, com mão
de obra indígena, de um enorme galeão a mando de
Salvador Correia de Sá e Benevides para a própria
empresa de reconquista de Angola, e a expulsão, pelas
ordenanças da cidade do Rio de Janeiro, dos invasores
franceses liderados por Jean-François Duclerc.
(3) A descoberta de ouro e a consequente circulação de
riquezas na capitania das Minas Gerais atraiu grande
número de migrantes para a região, propiciando o
surgimento de um ambiente cosmopolita e intelectual-
mente sosticado. Nesse contexto, a abertura das pri-
meiras grácas na América portuguesa – autorizadas
pelo Marquês de Pombal no âmbito de um conjunto
de medidas ditas esclarecidas, que visavam a atualizar
a relação entre Metrópole e Colônia – contribuiria
para catalisar a circulação dos ideais revolucionários
do Iluminismo francês entre a elite letrada local.
(4) Anulando o Tratado del Pardo de 1761, o Tratado de
San Ildefonso de 1777 retomava o princípio do uti
possidetis consagrado no Tratado de Madri de 1750
e conrmava, para a Coroa portuguesa, os territórios
ocupados no centro-oeste e na Amazônia por meio
de bandeiras, entradas e monções.
1: Errado. No período inicial da colonização, produziram-se duas
tentativas de sujeição dos indígenas. Uma delas derivou de simples
cálculo econômico e consistiu na escravização pura e simples. A
outra foi orquestrada pelas ordens religiosas, especialmente a jesuíta,
e retratou um esforço de transformar o indígena em “bom cristão”,
o que signicava forçar a aquisição de hábitos de trabalho próprios
à Europa – em tudo, pois, opostos à escravidão. Se é verdade que,
formalmente, a escravidão indígena foi proibida em 1570, as leis para
tal foram recorrentemente burladas. Os indígenas, ainda conforme a
medida de 1570, poderiam car submetidos à escravização em caso
de “guerras justas”, quais sejam, guerras consideradas defensivas ou
punidoras de práticas antropofágicas. Apenas no período pombalino,
em 1758, a Coroa portuguesa determinou a libertação denitiva do
gentio – embora a prática já estivesse em franco desuso. Por sua vez, a
importação de mão de obra africana e escravizada somente se adensou
a partir do século XVII – quando as bandeiras emergiram e, também,
quando se intensicou a presença jesuíta.
2: Certo. As elites coloniais foram parte ora conitante, ora coadjuvante
da Coroa no processo de colonização. Organizaram mecanismos de
defesa própria, com mão de obra local, de forma a proteger tanto a
América portuguesa quanto os interesses econômicos coloniais. A refe-
rência a Salvador Correia de Sá e Benevides, por três vezes governador
da capitania do Rio de Janeiro, concerne ao episódio em que se destacou
como comandante da frota que, em 1647, reconquistou Angola e São
Tomé e Príncipe, então sob ocupação holandesa. A missão partiu do
Rio de Janeiro e foi nanciada, em grande medida, pela Câmara local.
O segundo episódio retratado no item diz respeito à expedição de Jean-
-François Duclerc, que partiu em 1710 de La Rochelle em direção ao Rio
de Janeiro, na expectativa de capturar o ouro que era por ali escoado.
Sem êxito, Duclerc terminou assassinado no Rio de Janeiro em 1711.
3. Errado. Embora seja certo que o descobrimento de ouro ensejou inédito
dinamismo cultural na capitania de Minas Gerais, notadamente com o
advento do barroco mineiro, a imprensa permaneceu proibida na colônia
até a transmigração da Coroa, em 1808. Além disso, o período pombalino
(1750-1777) coincidiu com o declínio da região aurífera, havendo, pois,
inexata, ainda que subjacente, correlação de fatores no item.
4. Certo. Face menos explícita do Tratado de 1777 foi a recondução e
consolidação dos ganhos boreais e centrais obtidos com o Tratado de
Madri, em 1750. Na porção sulina, no entanto, o Tratado de Santo Ilde-
fonso foi mais prejudicial a Portugal, visto que se entregou à Espanha
Colônia do Sacramento sem obter, em troca, Sete Povos das Missões.
Gabarito: 1E, 2C, 3E, 4C
(Diplomacia – 2018 – CESPE) Tendo em vista que, como colônia
de Portugal, o Brasil fazia parte do mercantilismo da Idade
Moderna, que tinha no sistema colonial um dos fatores
fundamentais do processo de acumulação primitiva da
Europa nos séculos XVI, XVII e XVIII, julgue (C ou E)
os itens a seguir, acerca das características básicas da
produção brasileira no período colonial.
05. HistóriA do BrAsil
Rodrigo Goyena Soares
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RODRIGO GOYENA SOARES
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(1) Exercida sob o modelo de latifúndio autossuciente,
a produção gerava excedentes que propiciavam um
vigoroso comércio entre as capitanias.
(2) Prevalecia a monocultura agroexportadora, princi-
palmente de açúcar, com predomínio do latifúndio
da terra e do trabalho escravo (indígenas e africanos)
generalizado.
(3) No período em apreço, em que predominava a plu-
ricultura de produtos, a produção aurífera mineira
era voltada para a metrópole, e as indústrias básicas,
como a metalurgia, empregavam uma pequena par-
cela de trabalhadores livres.
(4) A posse da terra era concedida exclusivamente a
proprietários de pequeno e médio porte; predominava
o trabalho escravo e a produção manufatureira livre
destinava seus produtos à venda por comerciantes
portugueses na Europa.
1: Errado. O modelo produtivo era o do latifúndio monocultor e
agroexportador, portanto, não era autossuciente. Embora houvesse,
consoante a tese de João Fragoso, mercado interno e comunicação
entre capitanias, especialmente a partir do século XVIII, não vigorava
um comércio interno dinâmico, já que muito solapado pelas transações
externas.
2. Certo. Roberto Simonsen notabilizou-se, na historiograa, por
constituir a teoria dos ciclos econômicos. Consoante essa acepção, a
formação econômica brasileira teria passado por sucessivos períodos
de desenvolvimento econômico encabeçados, em turnos cronológicos,
por produtos responsáveis por essa pujança (SIMONSEN, 1937).
• 1500-1600: período caracterizado pelo extrativismo vegetal, fundado
na exploração do pau-brasil, no litoral, mediante mão de obra indígena.
• 1550-1700: período caracterizado pela atividade agrícola, fundada na
exploração do açúcar, no litoral, mediante mão de obra escrava, fosse
indígena ou africana.
• 1680-1750: período caracterizado pelo extrativismo mineral, fundado
na exploração de ouro e de diamantes, no atuais Estados de Minas
Gerais, de Goiás, do Mato Grosso e parte do Mato Grosso do Sul,
mediante mão de obra escrava africana.
• 1830-1950: período caracterizado pela agricultura cafeeira, locali-
zada nos Estados do Rio de Janeiro, de São Paulo e de Minas Gerais,
mediante mão de obra escrava e livre; esta ligada aos cativos africanos,
aquela aos imigrantes europeus e asiáticos.
A historiograa recente contestou a teoria de Roberto Simonsen ao
sustentar a coexistência de culturas produtivas. Não haveria um ciclo
econômico determinado, mas multiplicidade e complementariedade
de atividades econômicas. Nesse sentido, destacou-se a existência de
um precoce mercado interno produtor e consumidor, que muito teria
contribuído para a expansão econômica no período colonial. Essa visão
historiográca salienta a existência de culturas complementares – e
periféricas – às destacadas por Simonsen, notadamente:
• Extração das drogas do sertão, no interior amazonense, durante os
séculos XVI, XVII e XVIII.
• Desenvolvimento da pecuária, muito responsável pela interiorização
da economia colonial. Nesse sentido, não teriam os portugueses
somente se assentado no litoral, como “grandes conquistadores de
terras, [que] não se aproveitam delas, mas contentam-se de as andar
arranhando ao longo do mar como caranguejos”, na expressão de Frei
Vicente do Salvador. A pecuária promoveu, para além do deslocamento
das atividades produtivas do litoral para o interior, a economia do
vestuário, dos transportes e da alimentação, forçando a progressiva
integração do mercado interno por intermédio da via uvial. O rio São
Francisco desempenhou papel basilar na vinculação da economia do
Nordeste à do Sudeste.
• O fumo, por último, contribuiu sobremaneira para o desenvolvimento
da economia do Recôncavo Baiano no decorrer do século XVIII.
3: Errado. Embora existisse, conforme antes assinalado, não predomi-
nava a pluricultura produtiva. Por sua vez, a produção aurífera, voltado
para a metrópole, empregava sobretudo mão de obra cativa – e as
indústrias básicas como a metalurgia simplesmente inexistiam.
4: Errado. A posse da terra, concedida por intermédio do instituto das
sesmarias, era sobretudo de latifundiários, e não de proprietários de
pequeno ou médio porte. Por sua vez, a produção manufatureira livre,
muito rudimentar, atendia ao mercado interno e, algumas vezes, servia
como moeda de troca por africanos escravizados.
Gabarito: 1E, 2C, 3E, 4E
(Diplomacia – 2018 – CESPE) A principal autoridade em todos
os domínios coloniais portugueses era o rei, que, na
administração desses domínios, contava com o auxílio
do Conselho Ultramarino e da Mesa de Consciência e
Ordens. Tendo em vista que, apesar do auxílio dessas ins-
tituições, a organização administrativa do Brasil colonial
funcionava de modo precário, julgue (C ou E) os seguintes
itens, relativos às causas dessa precariedade.
(1) As distâncias, a consequente lentidão das comu-
nicações, e a falta de aparato humano burocrático
dicultavam o controle da população e a observância
restrita das leis.
(2) Embora fosse consensual e geogracamente cons-
tatável, a unidade territorial brasileira aparecia o-
cialmente visível apenas nos títulos do vice-rei e do
príncipe do Brasil.
(3) O processo administrativo era excessivamente
centralizado: todas as decisões de maior ou média
envergadura administrativa passavam pelo crivo de
Portugal; de tudo se queria saber em Lisboa e por tudo
se interessavam o Conselho Ultramarino e a Corte.
(4) A Coroa Portuguesa, do início ao m da colonização,
procurou manter o controle total sobre o empreendi-
mento colonial, motivo pelo qual resistiu às investidas
da iniciativa privada (ou particular), no sentido de
assumir papel exclusivo na exploração econômica
da colônia.
1: Certo. As primeiras décadas da colonização portuguesa na América
caracterizaram-se pela relativa ausência de ímpeto administrativo.
Dizia-se ser uma terra sem metais preciosos, o que alijava o interesse
da metrópole pela colônia americana. Desenvolveram-se, no entanto,
as primeiras atividades produtivas, especialmente, aquelas vinculadas
ao comércio de peles, de animais e do pau-brasil. Fernão de Noro-
nha destacou-se pelo estanco da madeira que dera nome à colônia
portuguesa na América. Passadas três décadas após a expedição de
Pedro Álvares Cabral, organizou-se o primeiro esforço colonizador por
intermédio das Capitanias Hereditárias, em 1532. O sucesso parcial
da expedição de Martim Afonso de Sousa, em 1530, reascendia os
ânimos quanto à ocupação territorial da colônia; anal, as primeiras
mudas de cana-de-açúcar trazidas ao Brasil pareciam render dividendos
econômicos. Dom João III não hesitou. Entregou quinze capitanias a
dalgos portugueses, tornando-os donatários das posses coloniais na
América. Em que pese o sucesso ou fracasso desta ou daquela capitania,
todos atendiam ao escopo metropolitano consubstanciado pela tríade
ocupar, explorar e defender. As quinze porções de terra foram entregues
por intermédio de Cartas de Doação e do Foral, ambos documentos
jurídicos que visavam assegurar direitos e deveres aos donatários. A
exploração das terras deveria seguir os comandos da Lei de Sesmarias,
e parte dos dividendos extraídos deveriam ser entregues à Coroa. Nesse
sentido, a historiograa recente, pelo menos no que concerne à coloni-
zação de 1500 a 1549, caracteriza a presença portuguesa na América
como fruto de uma iniciativa descentralizadora. Haveria transferência
em benefício dos donatários da tríade administrativa entabulada por
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05. HISTÓRIA DO BRASIL
Lisboa. Se é verdade que há dissenso historiográco quanto ao êxito
das Capitanias de São Vicente, de Pernambuco, de Ilhéus e da Bahia
de Todos os Santos, não é matéria de discórdia o fracasso da inicia-
tiva descentralizadora. Alguns dalgos donatários sequer rumaram
para a colônia, permanecendo em Portugal, e, de lá, orientando a
administração de suas respectivas porções de terras. Em resposta,
Lisboa procedeu à centralização dos negócios coloniais. Constituiu-se
o governo-geral, com sede em Salvador, em 1549. Tomé de Sousa foi
nomeado primeiro Governador-geral do Brasil. Criaram-se as primeiras
Capitanias Reais, como a da Bahia, que passaram a coexistir com as
Hereditárias. O aparelho burocrático adensou-se com a constituição
de novas entidades administrativas. O Ouvidor-mor encarregar-se-ia
das questões de justiça; o Provedor-mor, das temáticas tributárias e
nanceiras; e o Capitão-mor, dos assuntos militares. A Coroa deveras
passava a assumir o ônus da colonização. Em 1551, fundou-se o
bispado da Bahia, dando início à presença jesuíta no Brasil, não sem
vincular a colônia à jurisdição religiosa do Santo Ofício. A inquisição,
nesse sentido, faria sua incursão na América portuguesa, embora os
julgamentos fossem realizados pelo Tribunal de Évora. Mais tarde,
em 1609, fundou-se o Tribunal da Relação da Bahia, o que signicava
trazer a lei para as localidades coloniais. O esforços centralizadores
adensaram-se após as expedições francesas e holandesas no Brasil.
Cindiu-se o território colonial em dois Estados em 1621. Ao Norte, a
administração colonial seria exercida pelo Estado do Maranhão, cuja
capital era São Luís. Ao Sul, os negócios da América portuguesa cariam
sob os comandos do Estado do Brasil, com sede em Salvador. Nesse
sentido, criaram-se a Companhia Geral do Comércio do Brasil, em 1649,
e a Companhia do Comércio do Maranhão, em 1682. Na esfera local,
os povoados que alcançassem o estatuto de vila passariam a possuir
uma Câmara Municipal. Tratava-se do espaço por excelência de diálogo
entre os interesses locais e as diretrizes da Coroa. As câmaras não eram
unicamente legislativas. Julgavam, executavam e administravam. Às
posturas municipais, instrumento legislativo das câmaras, somava-se
o direito de arrecadação tributária. Para a Coroa lusitana, o Tratado de
Tordesilhas não poderia constituir barreira perene à interiorização da
América portuguesa. Estimulou-se a ocupação territorial do atual Brasil
mediante a consolidação de três eixos de expansão.
• Ao Norte, as missões jesuíticas ocuparam o vale do rio amazonas,
abrindo passo para a exploração das drogas do sertão. Durante a União
Ibérica, e não sem vínculo com a fundação da França Equinocial, fundou-
-se o Forte do Presépio, na cidade de Belém, em 1616. Seria a entrada
atlântica ao caudais amazônicos. O reinado de Castela mostrou-se
leniente com a expansão portuguesa, visto que a barreira dos Andes
impedia o escoamento aurífero espanhol por intermédio do rio Amazo-
nas. Nesse sentido, os castelhanos preferiram deslocar a extração de
ouro via o atual Panamá e, num segundo momento, por intermédio da
Bolívia, o que robusteceria o porto de Buenos Aires, fundado em 1536.
• Ao Sul, a lógica da colonização mediante a constituição de cidades
adensou-se com a fundação de Colônia de Sacramento em 1680, século
e meio após, portanto, o surgimento de Buenos Aires. Notabilizou-se a
presença jesuíta na região dos Sete Povos das Missões.
• O terceiro eixo, embora contasse com o estímulo real, agenciou-se
graças à ação dos bandeirantes. Adentraram-se os territórios de São
Vicente, de Goiás, do Mato Grosso e de Minas Gerais. As expedições
bandeirantes cindiram-se em três tipos. Havia as entradas – promovidas
pela iniciativas tanto pública quanto privada –, as bandeiras – que eram
campanhas levadas a cabo por paulistas com apoio, novamente, público
e privado – e as monções – que caracterizavam expedições uviais.
As expedições bandeirantes buscavam capturar índios para, assim,
escravizá-los, o que opunha colonos a jesuítas, estes então proibidos
de portar armas. Mas não só. Os bandeirantes capturaram africanos
foragidos e destruíram as comunidades de resistência quilombola, entre
elas a de Palmares, que existiu entre 1580 e 1680, na Capitania de Per-
nambuco. Ainda no sentido econômico, os bandeirantes apressaram-se
em extrair as drogas do sertão, para lá carregando a pecuária que
fosse necessária para os mantimentos das entradas e das bandeiras.
No nal do século XVII, o grande escopo bandeirante voltou-se para a
região aurífera de Minas Gerais, onde poderiam enriquecer à custa dos
braços por eles escravizados. A interiorização colonial promovida pelos
bandeirantes contribuiu para superar o mito da ilha Brasil, segundo
o qual o rio Amazonas se ligaria à foz do rio da Prata por intermédio
de auentes, entre eles os rios Paraná e Paraguai. A interiorização da
colônia deixava claro que a Coroa não detinha o controle dos espaços
vazios, fossem de homens ou de leis. A expansão territorial, nesse
sentido, criou novos interesses, trazendo à tona novos atores, como
os bandeirantes, que passaram a integrar uma rede social de controle
e de dependência (FRAGOSO, 2010). Se imperava a língua-geral entre
bandeirantes e indígenas, havia imbricações de interesses, fossem
conitantes ou não, entre esses atores sociais. Da mesma forma,
não escapava à Coroa os rumos contrários aos colonizadores que os
colonos poderiam tomar, mas não por isso deixaria de haver interesses
convergentes. É precisamente nessa ordem de ideias que Ilmar Rohloff
Mattos arma haver inter-relação entre metrópole e colônia, e não um
suposto pacto colonial ou um contrato leonino em benefício de Lisboa.
Se fosse um pacto, haveria de se supor a assinatura de cláusulas de
entendimento, o que não foi o caso. Naquele então, a própria exis-
tência da metrópole muito se condicionava à pujança econô- mica da
colônia. Não se quer dizer com isso que não houvesse desequilíbrio
em detrimento da colônia, mas decerto não fora um contrato. Melhor,
tratava-se de uma relação de controle e de dependência. Controle, visto
que não escapava à metrópole a perpetuação dos interesses de Lisboa
no Brasil. Dependência, pois havia mais interesses interligados do que
subordinados: é a partir dessa perspectiva que Fernando Novais se opõe
à dualidade analítica de Caio Prado Júnior, que vislumbra, no Brasil,
uma colônia de exploração, e não de povoamento (NOVAIS, 1997). A
expansão territorial desdobrou-se em dois sentidos, representativos das
novas teias de interesses díspares ou coincidentes, articuladas pelos
atores coloniais. No plano interno, a partir de meados do século XVII,
eclodiram sedições coloniais, em grande parte associadas às relações
de controle e de dependência. No externo, a superação do Tratado de
Tordesilhas tornou a opor Portugal e Castela, e dessa oposição surgiram
novos tratados lindeiros.
2: Certo. Embora de redação truncada, o item sugere que, embora a
unidade territorial estivesse ocialmente constituída em títulos reais, a
administração, na prática e na informalidade, era disputada e contestada,
conforme sugerido na explicação do item anterior.
3: Certo. O item, novamente, sopesa as diferenças entre o poder formal
e o poder real. Centralizado após a constituição do governo-geral, o
processo administrativo era caracterizado pelo forte crivo real, que se
interessava por todas as decisões de maior ou média envergadura. A
prática administrativa, no entanto, revelou-se mais conituosa, como
também apontado nos itens anteriores.
4: Errado. O item torna a insistir na mesma tensão entre poder da
Coroa e poder colonial. Como antes salientado, Lisboa não resistiu às
investidas da iniciativa privada, no sentido de assumir papel exclusivo
na exploração econômica colonial. Pelo contrário, e nos limites da
garantia de seus interesses, buscou a cooperação das forças coloniais.
Gabarito: 1C. 2C, 3C, 4E
(Diplomacia – 2017 – CESPE) No que se refere a fatores que
contribuíram para a conguração do território da América
portuguesa colonial, julgue (C ou E) os itens a seguir.
(A) Sertanistas de São Paulo penetraram no interior da
América do Sul nos séculos XVI e XVII, viabilizando
a ocupação da região pelos portugueses.
(B) Pelo Tratado de Madri, de 1750, a Espanha aceitou a
posse portuguesa do Mato Grosso, da Amazônia e da
margem oriental do rio da Prata.
(C) Com o Tratado de Badajoz, de 1801, a posse da região
dos Sete Povos, no oeste gaúcho, passou à Espanha,
mas o território foi retomado pelos portugueses
em1816.
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