A inclusão de novos sujeitos ao contrato social: uma revisão do conceito de justiça no estado de direito brasileiro

AutorEricka Nedes dos Santos e Waleska Marcy Rosa
Páginas67-84
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A INCLUSÃO DE NOVOS SUJEITOS AO CONTRATO SOCIAL:
UMA REVISÃO DO CONCEITO DE JUSTIÇA NO ESTADO DE
DIREITO BRASILEIRO
Erika Neder dos Santos
Waleska Marcy Rosa
Sumário: Introdução. 1. Contrato social: a não observância da diversidade
humana. 2. A necessidade de Inclusão social como um atributo da Justiça. 3.
Contrato social e capacidades: a necessidade de prevalência da diversidade na
definição da Justiça Social. 4. A inclusão das Teorias das Capacidades no
Estado de Direito. Conclusão. Referências.
Introdução
As teorias de justiça liberais, principalmente a Teoria da Justiça de John
Rawls, objetivam analisar quais os principais fundamentos que devem orientar
a construção da sociedade para que a mesma possa ser considerada justa. Em
Uma Teoria de Justiça, Rawls1 pretendeu antecipar os princípios fundantes de
uma sociedade preordenada de forma que pessoas munidas com certas
características, escolhessem esses preceitos para pautar a sociedade. Nessa
situação, os indivíduos sairiam do estado de natureza, cuja existência seria
prévia ao Estado, e optariam, voluntariamente, por abrir mão de determinados
direitos, em prol da segurança da coletividade, através dos poderes conferidos
à instituição Estatal.
Essa condição de “livres, iguais e racionais”2, na forma defendida por
Rawls, somada à cobertura pelo “véu da ignorância”3, seriam suficientes para
a criação de uma sociedade condizente com a justiça. Entretanto, Rawls ao
analisar as desigualdades que poderiam ocorrer dentro da sociedade, posterga
quaisquer questões sobre elas para as instituições posteriormente criadas pelo
1 RAWLS, John. Uma teoria da justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
2 RAWLS, John. Idem, p.12/13.
3 RAWLS, John. Idem, p. 146.
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Estado4, mais especificamente deixando a cargo do poder legislativo regular
essas situações, não mencionando essas diferenças no momento do contrato
social.
Nussbaum5, em sua versão da Teoria das Capacidades, pretende
revisitar essas questões de justiça pois entende que essas características de
“livres, iguais e independentes”6 não são comuns à maioria das pessoas, de
forma que deixar a cargo dessa minoria a escolha dos princípios fundamentais
do Estado não permite atingir a justeza social.
Nussbaum pretende a reformulação dessa teoria da justiça, uma vez que
entende que um dos grandes problemas sobre a origem da justiça, política e
social, está na sua equiparação entre aqueles que fazem o pacto e para quem o
pacto é feito. As pessoas com deficiência ainda não são consideradas da
mesma fora que as demais e, assim, acabam por não possuírem representantes
na defesa dos princípios da justiça aplicáveis a elas e efetivamente não se
tornam protegidas com medidas que otimizem seu tratamento e diminuam as
barreiras sociais que as impedem de serem protagonistas sociais7.
A Constituição Federal brasileira, atual eixo axiológico de todo o
ordenamento jurídico brasileiro, dispõe, logo no artigo 1º, que a República
Federativa do Brasil se constitui em Estado democrático de direito tendo como
fundamento, entre outros, a dignidade da pessoa humana. Essa união entre
Estado democrático de direito e a dignidade humana reacende a importância
da proteção dos direitos da pessoa com deficiência e do seu protagonismo na
vontade social.
Nesse sentido, o estudo pretende, então, demonstrar a posição de
Martha Nussbaum no tocante à antecipação dos interesses das pessoas com
deficiência no momento do contrato social através da incorporação da
Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência como um aditivo
contratual de modo a garantir a real denominação de Estado de Direito no
tocante ao Estado brasileiro. Essa análise se justifica ao se pretender conferir
maior protagonismo às pessoas com deficiência na atuação tanto da vontade
social quanto da direção e condução de suas próprias vidas.
4 RAWLS, John. Idem, p. 211 et seq.
5 NUSSBAUM, Martha. Fronteiras da justiça: deficiência, nacionalidade, pertencimento à espécie.
São Paulo: Martins Fontes, 2020, p. 12.
6 LOCKE, John. Segundo trata do, capitulo 2, parágrafo 4, capitulo 8, parágrafo 98. Apud
NUSSBAUM, Martha. Idem, p. 12.
7 NUSSBAUM, Martha. Op. cit, p. 121.

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