Tolerância como forma de enfrentar a crise da Lei e a judicialização das relações pessoais

AutorDayne Aguiar Teixeira
Páginas273-296
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TOLERÂNCIA COMO FORMA DE ENFRENTAR A CRISE DA LEI
E A JUDICIALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES PESSOAIS
Dayane Aguiar Teixeira
Sumário: Introdução. 1. Nascimento e desenvolvimento da tolerância. 2. Duas
concepções do conceito de tolerar. 2.1 Tolerância como permissão. 2.2
Tolerância como respeito. 3. O novo sentido de tolerar. 4. Estado de Direito
(formal). 4.1. Elementos normativos essenciais. 5. Crise na soberania da lei e a
racionalização do Direito. 6. Judicialização das relações pessoais. 7. Tolerância
para enfrentar a crise da lei e a Judicialização das relações pessoais.
Considerações Finais. Referências.
Introdução
O artigo discorrerá sobre a origem e o desenvolvimento do termo
tolerância, centrando-se em duas das quatro concepções apresentadas pelo
filósofo e teórico político Rainer Forst e propondo uma nova concepção.
Pretende-se abordar as considerações da doutrina a respeito, apresentando
críticas e reflexões no tocante a evolução do conceito de tolerar.
Ademais, objetiva-se demonstrar as diferentes concepções de Estado
de Direito, notadamente a concepção formal do termo, seus elementos
normativos essenciais, bem como a crise de soberania da lei, destacando as
razões e consequências de sua atual crise, e a utilização de um novo conceito
de tolerância, defendido pela autora, como meio para combater tal colapso.
A pesquisa caracteriza-se como exploratória quanto aos objetivos e
quanto aos procedimentos, apresentando um estudo de caráter bibliográfico,
aquele que explica um tema ou problema com base em referências teóricas já
elaboradas e publicadas. Tal pesquisa objetiva oferecer maior familiaridade
com o problema, tornando-o mais explícito. Quanto ao procedimento técnico,
a pesquisa bibliográfica objetiva a busca de solução do problema a partir de
material já produzido, composto basicamente de artigos científicos e livros.
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O trabalho vai ponderar, ainda, acerca da Judicialização das relações
pessoais, comprovando a atual invasão do Direito na vida social e justificando-
se ao demonstrar que o enfraquecimento da soberania da lei tem trazido ao
Poder Judiciário determinadas questões que antes lhe eram estranhas.
A hipótese a ser confirmada ou refutada consubstancia-se na
possibilidade da utilização do novo conceito de tolerância como forma de
combate à crise de soberania da lei e à Judicialização das relações pessoais.
1. Nascimento e desenvolvimento do termo tolerância
O conceito histórico de tolerância transcorre por diversas correntes
filosóficas. Inicialmente, o termo foi tratado como possibilidade de
convivência pacífica entre duas ou mais religiões. Tolerar era visto como a
possibilidade de aceitação das convicções alheias. Dessa forma, não revelava
uma relação de isonomia entre os indivíduos, ao revés, traduzia uma relação
de desigualdade, haja vista que aquele que se julgava superior, tolerava o
inferior, sendo com este “benevolente”.
Durante o período da idade moderna na Europa, o sentido mais
relevante do conceito de tolerância articula as esferas religiosa e política. O
valor ético de tolerância surgiu em meio a diversidade de posições religiosas
possivelmente existentes dentro de um mesmo Estado. Contudo, tolerância,
primeiramente vista em seu aspecto religioso, não chegou a ultrapassar, os
limites da identidade do próprio cristianismo como a única religião verdadeira.
Na esfera política o conceito de tolerância inicialmente revelou um
discurso sobre a diversidade nos chamados valores universais iluministas,
como os direitos fundamentais do homem; mas, em verdade, não levaram em
conta todos os tipos de diversidades de uma sociedade multicultural. Dessa
forma, o termo tolerância adquire especial relevância no período iluminista da
humanidade como reação à intolerância religiosa, intensificada na Reforma
Protestante e, posteriormente, na Contrarreforma Católica.
As referências filosóficas básicas do período de concepção do termo
tolerância são a “Carta sobre a tolerância”, publicada por John Locke em 1689,
e o “Tratado sobre a tolerância”, publicado por Voltaire em 1762. Nesta época,
tanto a Igreja Católica, no espírito da Contrarreforma, quanto o Protestantismo
já haviam demonstrado exorbitantes pendências justamente com bases na
intolerância.

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