Liberdade testamentária e manifestação de vontade em meio eletrônico: novos contornos 20 anos depois da promulgação do Código Civil de 2002

AutorJosé Luiz de Moura Faleiros Júnior
Ocupação do AutorDoutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo - USP/Largo de São Francisco. Doutorando em Direito, na área de estudo ?Direito, Tecnologia e Inovação', pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Mestre e Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU. Especialista em Direito Digital, em Direito Civil e ...
Páginas109-126
LIBERDADE TESTAMENTÁRIA E
MANIFESTAÇÃO DE VONTADE EM MEIO
ELETRÔNICO: NOVOS CONTORNOS 20 ANOS
DEPOIS DA PROMULGAÇÃO DO CÓDIGO
CIVIL DE 2002
José Luiz de Moura Faleiros Júnior
Doutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo – USP/Largo de
São Francisco. Doutorando em Direito, na área de estudo ‘Direito, Tecnologia e
Inovação’, pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Mestre e Bacharel
em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU. Especialista em
Direito Digital, em Direito Civil e Empresarial. Associado do Instituto Avançado
de Proteção de Dados – IAPD. Membro do Instituto Brasileiro de Estudos de
Responsabilidade Civil – IBERC. Advogado e Professor.
Sumário: 1. Introdução – 2. Novas tecnologias, uxos informacionais incessantes e a vontade
– 3. A manifestação de vontade em meio eletrônico: é necessária uma reforma? – 4. Uma pro-
posta de revisão pontual: a segurança jurídica e as assinaturas eletrônicas – 5. Considerações
nais – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O paradigma do papel, há tempos debatido pela doutrina especializada
como um desao a ser superado na evolução da transformação digital rumo a
uma sociedade paperless, atingiu novo patamar de repercussão, no Brasil, entre
os anos de 2020 e 2021. Em termosestatísticos, já se constatou o crescimento
exponencial da prática de atos notariais eletrônicos, especialmente testamentos,
por sistemas tecnológicos que se valem da Internet, decomunicação audiovisual
e de criptograa para instrumentalizar a manifestação de vontade,expressada
pelo cidadão, até o tabelião ou registrador – que goza de fé pública –, para que o
ato notarial respectivo, ao invés de ser lavrado nos moldes tradicionais, o seja em
meioeletrônico. Esse fenômeno transformador vem sendo atribuído às conse-
quências da pandemia de SARS-CoV-2 (Covid-19), que eclodiu no ano de 2020.
Como forma de garantir o atendimento a demandas variadas e, ainda, para
viabilizar a continuidade do atendimento ao público pelas serventias extrajudi-
ciais, com a esperada segurança jurídica, o Conselho Nacional de Justiça editou,
em 26 de maio de 2020, seu Provimento 100, que implementou o sistema “e-No-
tariado” no Brasil. A partir dele, várias mudanças estruturais passaram a nortear
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a célere transformação digital de cartórios e tabelionatos brasileiros, sem que
houvesse, contudo, efetiva reforma do Código Civil.
Partindo dessa justicativa, o presente estudo explorará o tema-problema
narrado, considerando a necessidade ou não de reforma legislativa especíca, para
que alguns dos implementos desvelados pelo inovador sistema “e-Notariado” não
padeçam de eventual nulidade de forma, em decorrência do meio adotado para
a instrumentalização da vontade.
A hipótese versada é a de que, embora desejável, uma reforma legislativa es-
pecícaaos dispositivos do Código Civil não é indispensável para a continuidade
das atividades já iniciadas pelo sistema “e-Notariado”, com segurança e eciência,
ainda que seja evidente a possibilidade de aprimorá-lo.
A pesquisa, em termos metodológicos, se baseará no método indutivo, par-
tindo deaveriguação especíca de nuances estruturais do referido sistema, para
atingir o plano mais abstrato da própria lei e de uma possível reforma. Ao nal,
uma conclusão será apresentada, no intuito de indicar os resultados obtidos com
a pesquisa, e uma proposta de revisãoespecíca será exposta, com o objetivo de
recrudescer o modelo já existente e em operação no país para lavratura de atos
notariais eletrônicos.
2. NOVAS TECNOLOGIAS, FLUXOS INFORMACIONAIS INCESSANTES
E A VONTADE
As Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) já provocaram uma
revolução: “não há dúvida de que informações estão sendo geradas agora, mais do
que nunca. Não há dúvida também de que o mecanismo para gerar essas informa-
ções, armazená-las, recuperá-las, processá-las e divulgá-las é de qualidade e caráter
nunca antes disponíveis”.1 Insosmavelmente, a Internet propiciou a exploração
das estruturas sociais emergentes nos domínios da atividade e da experiência hu-
manas2 e a liberdade testamentária tem sido diretamente impactada p ela pujança
da transformação digital, inclusive pelo fato de ser o testamento, essencialmente,
um instrumento de comunicação entre a pessoa falecida e as que caram.3
Se, no Brasil, a doutrina aponta fatores que causam verdadeira ‘fuga dos
testamentos’, como os custos tributários e a ampla oferta de instrumentos alter-
nativos para o planejamento sucessório, a exemplo dos seguros de vida, dos trusts
1. SCHILLER, Herbert I. e communications revolution: who benets? Media Development, Nova York,
v. 30, n. 4, 1983. p. 18-20.
2. BERNERS-LEE, Tim. Long live the web. Scientic American, Nova York, v. 303, n. 6, p. 80-85, 2010. p. 80.
3. ANDRADE, Gustavo Henrique Baptista. O direito de herança e a liberdade de testar: um estudo com-
parado entre os sistemas jurídicos brasileiro e inglês. Belo Horizonte: Fórum, 2019. p. 75.
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