Liquidação de sentença no processo trabalhista

AutorPaulo Cesar Baria de Castilho
Ocupação do AutorAtuou como perito judicial contábil trabalhista e é mestre em Direito Tributário pela PUC de São Paulo e Doutor em Direito do Trabalho pela mesma Universidade
Páginas21-33

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1.1. Natureza jurídica

Superado o processo de conhecimento e com o trânsito em julgado da sentença condenatória, o devedor é citado para pagar o quantum apurado em regular liquidação de sentença (inclusive as contribuições previdenciárias), em 48 horas, sob pena de penhora. Isto é o que prescreve o art. 880 da CLT, com a redação dada pela Lei n. 11.457/07.

Inicia-se assim, com a citação, o processo de execução.

Observe-se, portanto, que, entre o trânsito em julgado da sentença e o início, propriamente dito, do processo de execução, existe um período em que são praticados atos processuais para determinar-se o efetivo quantum debeatur.

Esta fase intermediária entre o processo de conhecimento e o de execução é conhecida como liquidação de sentença.

Francisco Antonio de Oliveira esclarece-nos sobre o tema, afirmando que "a liquidação de sentença constitui incidente da fase cognitiva. Sua natureza é declaratória, posto que apenas o an debeatur é conhecido. Há incerteza no que respeita ao quantum. Conhecido este, ela se torna integrativa da execução" (A execução na Justiça do Trabalho. 2. ed. São Paulo: RT, 1991. p. 52).

Cultores do Direito, tais como Fraga, Liebman, Couture, Amílcar de Castro, Rezende Filho, Jorge Americano, Carvalho Santos, Pinto do Amaral e outros, consideram a liquidação um "ato ou processo preliminar ou preparatório" para a execução.

O insigne Pontes de Miranda conceitua a liquidação de sentença como um "processo incidente dentro do processo de execução" (cit. de Francisco Antonio de Oliveira, ob. cit., p. 52).

A CLT preceitua que a parte somente promoverá a execução quando a sentença for líquida, caso raro de ocorrer na justiça especializada. Sendo a sentença ilíquida - que é o normal - somente após a liquidação da sentença (art. 879, caput) é que será possível executar o devedor.

Assim, temos que "a liquidação serve de traço de união entre a sentença condenatória, que lhe será a ponte, e a execução, que será seu objetivo" (Mendonça Lima, cit. por Francisco Antonio de Oliveira, ob. cit., p. 53).

Manoel Antonio Teixeira Filho conclui que "A doutrina predominante vê a liquidação como uma fase preparatória da execução. Essa também é a nossa opinião, pois a liquidação foi instituída, finalisticamente, para tornar possível a execução da obrigação expressa no título executivo judicial; daí o sentido preparatório de que ela se reveste (Comentários ao Novo Código de Processo Civil, sob a perspectiva do Processo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2015. p. 702).

Contudo, em que pese a discussão doutrinária sobre o assunto, certo é que a liquidação da sentença é norteada pelo princípio da imodificabilidade e o da inovabilidade da sentença liquidante. Isto equivale dizer que "a sentença exequenda é intocável no processo de liquidação" (CARRION, Valentin. Comentários à CLT. 14. ed. São Paulo: RT, p. 669) não se admitindo qualquer inovação da coisa julgada.

Lembra Fadel que "no processo de liquidação, não se pode discutir de novo o mérito da causa, nem apreciar a justiça ou injustiça da sentença, nem reexaminar a prova em que ela se fundou. Nessa

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fase, só se pode mesmo é explicitar, declarar o que já está na sentença, mas que, por ser ela ilíquida, deve ser aclarada" (Sérgio S. Fadel, cit. por OLIVEIRA, Francisco Antonio de, ob. cit., p. 53).

Concluindo, temos que na liquidação de sentença é defeso às partes a discussão da matéria de mérito, conforme preceitua o art. 879, § 1º, da CLT, prevalecendo, assim, in totum, o comando que emerge da r. sentença de mérito.

1.2. Diferenças em relação ao processo civil

No caso específico da liquidação e execução da sentença, há algumas diferenças entre aquela praticada no processo cível e aquela do processo trabalhista.

Procurando centrar foco no objeto de estudo proposto na presente obra, interessa-nos, especialmente, fazer breves considerações quanto ao tema da correção monetária e dos juros de mora.

O índice de atualização monetária utilizado para corrigir os valores resultantes das condenações judiciais na Justiça do Trabalho, por força do art. 39, caput, da Lei n. 8.177/91, passou a ser a TRD - Taxa Referencial Diária. Com sua extinção pela Lei n. 8.660/93, passou-se a adotar a TR - Taxa Referencial (embora a TR não seja um índice de atualização monetária, conforme já decidiu o STF - Supremo Tribunal Federal nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADIn 493-0 - DF, publicada na JSTF-Lex 168/70).

Em razão da decisão proferida nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade - Processo n. TST - ArgInc - 479-60.2011.5.04.0231 - o C. TST - Tribunal Superior do Trabalho decidiu declarar a inconstitucionalidade por arrastamento da expressão "equivalente à TRD - Taxa Referencial Diária" contida no art. 39, da Lei n. 8.177/91, por força da ratio decidendi definida pelo STF - Supremo Tribunal Federal nos autos da ADIn n. 4.357/DF, além de outras, determinando a aplicação do IPCA-E - Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial, como novo índice de atualização dos créditos trabalhistas apurados em liquidação de sentença.

Decidiu ainda o C. TST - Tribunal Superior do Trabalho, atribuir efeitos modulatórios à decisão, determinando a aplicação do IPCA-E a partir de 30 de junho de 2009, observada, porém, a preservação das situações jurídicas consolidadas resultantes dos pagamentos já efetuados nos processos judiciais, em andamento ou extintos, em virtude dos quais foi adimplida e extinta a obrigação, ainda que parcialmente, sobretudo em decorrência da proteção ao ato jurídico perfeito (arts. 5º, XXXVI, da Constituição Federal e 6º da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro - LIDB).

Contudo, este tema ainda não está pacificado, vez que, em decorrência da Medida Cautelar acolhida na Reclamação Constitucional n. 22.012 do Rio Grande do Sul, o STF - Supremo Tribunal Federal, por meio de liminar concedida pelo Ministro Dias Toffoli, decidiu suspender os efeitos da decisão proferida pelo C. TST - Tribunal Superior do Trabalho acima referida, inclusive da nova "tabela única" de atualização editada pelo CSJT - Conselho Superior da Justiça do Trabalho que continha o índice de atualização com base no IPCA-E. Em outras palavras, voltou-se a utilizar a TR - Taxa Referencial como indexador na atualização de créditos trabalhistas decorrentes de liquidação de sentença judicial.

No processo cível (quando o processo se desenvolve na justiça estadual) adota-se outros índices, tais como, atualmente, o INPC do IBGE.

Em relação aos juros de mora, na justiça especializada adota-se a taxa de 1% ao mês, pro rata die (art. 39, § 1º, da Lei n. 8.177/91). Na área cível, o art. 406 do Código Civil determina que, na falta de juros convencionados em contrato ou em lei específica, adota-se a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional que, atualmente, é a taxa SELIC - Sistema Especial de Liquidação e Custódia, conforme disciplina o art. 30 da Lei n. 10.522/02.

Por fim, se a lei não dispuser de forma diversa, os juros devidos para pagamento de tributos será de 1% ao mês, conforme disciplina o art. 161, § 1º, do CTN. Este é o percentual que, na prática, tem sido utilizado na esfera civil.

Estes temas da atualização monetária e dos juros de mora aplicáveis aos débitos trabalhistas serão analisados com mais profundidade nos Capítulos Atualização Monetária e Juros de Mora, adiante.

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Quanto ao procedimento da liquidação de sentença no processo trabalhista, certo é que o tema está disciplinado no art. 879 da CLT e sua aplicação prática, como sói acontecer, depende do juízo liquidante, especialmente quanto à faculdade de determinar ou não às partes para que apresentem seus cálculos, contrapondo-se, por outro lado, à remessa direta dos autos ao perito para elaboração da conta quando esta for complexa (art. 879, § 6º, da CLT).

Com a Lei n. 8.898/94 - que, à época, inovou a liquidação de sentença do processo civil - também tentou agilizar esta "fase" processual, com nítido propósito de aliviar o trabalho que se acumulava nos chamados setores de "contadoria", especialmente no Judiciário federal, conforme observa Francisco Antonio Zem Peralta (A liquidação de sentença depois da Lei 8.898/94. São Paulo: LTr, 1995. p. 22). A partir da referida lei, o credor interessado pode efetuar pessoalmente os cálculos que entende devidos, instruindo o pedido de execução com a memória discriminada e atualizada do cálculo, conforme previa o art. 604 do Código de Processo Civil, o qual foi revogado pela Lei n. 11.232/05, que detalhou o procedimento de liquidação e cumprimento de sentença no processo civil, introduzindo os art. 475, letras "A" até "R".

Com esta inovação, para a maioria dos autores, a liquidação de sentença por cálculo do contador foi eliminada do processo civil, devendo o próprio credor apresentar a memória discriminada e atualizada do cálculo, com a clara intenção de agilizar o processo nesta "fase" processual.

No novo Código de Processo Civil, introduzido pela Lei n. 13.105/15, coube ao art. 509 e seguintes disciplinar a matéria. Determinou ainda, em seu § 3º, que "O Conselho Nacional de Justiça desenvolverá e colocará à disposição dos interessados programa de atualização financeira.

Verifica-se pelos textos normativos acima citados e pelo entendimento da nossa melhor doutrina, que a liquidação trabalhista se diferencia daquela utilizada no processo civil. Contudo, ambas apontam para um caminho comum, mais moderno: a efetividade do processo e sua duração razoável. Isso deve ser levado em conta e incentivado, por todos os agentes...

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