Softwares

AutorGustavo Fossati, Isael Meneses
Páginas321-352
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Softwares
TRIBUTAÇÃO DA ECONOMIA DIGITAL NA ESFERA MUNICIPAL | VOLUME 3322
18.1 Sumário executivo
A tributação envolvendo os softwares suscita vários debates antes mesmo
dos anos 2000. Antes da virada do milênio e da edição da Lei Complementar
Federal no 116/03, existia o entendimento, ratificado à época pelo Supremo
Tribunal Federal, que sobre os softwares poderia haver duas sistemáticas tribu-
tárias distintas.63
Em breve resumo, o STF, por ocasião do julgamento do RE no 176.626,64
decidiu que o ICMS somente poderia incidir sobre a venda de cópias ou exem-
plares dos programas de computador, produzidos em série e comercializados no
varejo. Na ocasião, a Corte Suprema entendeu que apenas o software de pra-
teleira materializava o corpus mechanicum da criação intelectual do programa,
constituindo, assim, mercadoria posta no comércio. De outro lado, o software
customizado, sob encomenda, representava um bem incorpóreo, não sendo equi-
parável à mercadoria. Nesse caso, o programa de computador seria objeto de
licenciamento ou cessão de direito de uso, sendo tributado pelo ISS.
Em 2010 foi julgada a medida cautelar na ADI no 1.945,65 quando se ava-
liou a constitucionalidade de lei do Estado de Mato Grosso, na qual se previa
regra de incidência do ICMS sobre operações com programas de computa-
dor, realizadas por transferência eletrônica de dados. Na ocasião, foi decidido
que seria possível a incidência do imposto sobre a aquisição de software via
download, sendo irrelevante a existência ou inexistência de um bem corpóreo
ou mercadoria em sentido estrito. O fundamento maior utilizado para justificar a
legitimidade da incidência foi a necessidade de se adaptar o Direito a situações
novas, notadamente aquelas trazidas pela evolução tecnológica. Na prática, a
transferência do software de prateleira continuava existindo, mas agora de for-
ma eletrônica, por meio de estabelecimentos virtuais, dispensando-se o CD ou
disquete como suporte físico para o programa ou para a música.
Com o advento da LC no 116/2003, que trouxe a nova regulação nacional
para o ISS, uma nova lista de serviços foi criada, com um item inteiro voltado
para “serviços de informática e congêneres”. Entre esses serviços, há men-
ção expressa a “licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de
63 Ver amplamente sobre a temática da economia digital e a evolução regulatória do software em
FOSSATI, Gustavo. Constituição tributária comentada. 2a ed. São Paulo: RT, 2021. p. 304ss.
64 Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1a Turma, j. 10.11.98.
65 Red. para acórdão Min. Gilmar Mendes, Pleno, j. 26.05.2010.
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computador” (item 1.05). Isso trouxe um significado muito claro para o deba-
te: a competência tributária sobre programas de computador foi avocada para
o legislador municipal, e os licenciamentos de programas de computador pas-
saram a sofrer a incidência do ISS.
No final de 2015, foi publicado o Convênio ICMS no 181, autorizando 19
Estados a conceder redução de base de cálculo nas operações com softwares,
programas, jogos eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres. A
autorização para a concessão de redução na base de cálculo do ICMS possibi-
litou que a carga tributária correspondesse ao percentual de, no mínimo, 5%
do valor da operação, relativo às operações com softwares, programas, jogos
eletrônicos, aplicativos, arquivos eletrônicos e congêneres, padronizados, ainda
que fossem ou pudessem ser adaptados, disponibilizados por qualquer meio, in-
clusive nas operações efetuadas por meio de transferência eletrônica de dados.
Observe-se que, através desse Convênio, os Estados partem da premissa de
que a tributação das operações com bens digitais pelo ICMS sempre foi possí-
vel, antes mesmo da sua edição. Isso porque o Convênio não veio para instituir
a tributação, mas sim um benefício fiscal sobre uma tributação preexistente.
No final de 2016, os municípios conseguiram articular-se no Congresso
Nacional e obtiveram a aprovação da LC no 157/2016, que acrescentou à lista
anexa da LC n
o
116/2003 os serviços de computação na nuvem e de streaming.
Com isso, os municípios garantiram a receita da tributação de uma importante
fatia do mercado da economia digital, por meio do ISS.
Em 2017, foi aprovado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária
(CONFAZ) o Convênio ICMS no 106/2017, com a principal intenção de não dei-
xar mais dúvidas quanto à incidência ampla e abrangente do ICMS nas operações
com bens digitais. Esse Convênio disciplina os procedimentos de cobrança do
ICMS incidente nas operações com bens e mercadorias digitais comercializadas
por meio de transferência eletrônica de dados e concede isenção nas saídas an-
teriores à saída destinada ao consumidor final. Fica claro que a pretensão dos
Estados é de lhes assegurar a manutenção da receita da tributação sobre supos-
tas operações de “circulação de mercadorias” no âmbito digital.
Em fevereiro de 2021, o Pleno do STF concluiu o julgamento da ADI 1.945,
tendo decidido que “a tradicional distinção entre software de prateleira (padroni-
zado) e por encomenda (personalizado) não é mais suficiente para a definição da
competência para tributação dos negócios jurídicos que envolvam programas de
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