Ação de petição de herança

AutorArnoldo Camanho de Assis
Páginas629-644
Capítulo 25
AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA
Arnoldo Camanho de Assis
SUMÁRIO: 1. Noções gerais. 2. Natureza da ação. 3. Competência. 4. Legiti-
midade ativa e passiva. 5. Procedimento. 6. Proteção cautelar aos bens da heran-
ça. 7. A sentença e seu cumprimento. 8. Prescrição e decadência. 9. Considera-
ções finais.
1. NOÇÕES GERAIS
“Ação” é o direito público, subjetivo, abstrato, unissubsistente, de exigir
do Estado a prestação jurisdicional. A ação é sempre dirigida contra o Estado
em desfavor de alguém. O autor não tem ação contra o réu – tem ação contra
o Estado para pedir algo em face do réu. De todas as características do direito
de ação que se foram incorporando ao conceito por força de sua evolução his-
tórico-doutrinária lenta e gradual, talvez a mais interessante de todas seja o
fato de se considerar a ação como sendo um direito unissubsistente. Isso sig-
nifica que a ação é um direito que se exaure com o seu exercício. Em outras
palavras: proposta a ação, a ação se acaba, se gasta, se exaure, deixa de existir,
morre. Isso ocorre porque, como, em termos práticos, a ação tem dupla fina-
lidade – abrir as portas da justiça e fazer nascer o processo –, no momento em
que o autor propõe a ação1, esta cumpre seu duplo papel, permitindo, pois,
que o autor acesse a justiça, fazendo nascer, a partir daí, a relação de direito
processual2. Daí para frente, não se fala mais de ação, já que a ação, ao ser
exercitada, se exaure, acaba, morre. Há de se falar em processo.
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1 É imprescindível lembrar que, nos termos do art. 263, do CPC, a ação considera-se
proposta tanto que a petição inicial seja despachada pelo juiz, ou simplesmente distribuí-
da, onde houver mais de uma vara.
2 Em termos históricos, é curioso notar que o revogado Código de Processo Civil de
1939 dispunha, em seu art. 196, que “a instância começará pela citação inicial válida
(...)”. Restringindo os comentários apenas a essa parte do artigo, perceba-se que, por for-
ça de tal dispositivo, a relação processual (ou seja, a instância, no linguajar do velho Có-
digo), começava apenas e tão somente quando o réu fosse validamente citado. Se o autor
propusesse ação, o juiz mandasse emendar a inicial, a emenda não fosse feita e o juiz in-
deferisse a inicial (art. 160, do CPC de 39) – tudo antes da citação do réu –, não teria
Por isso é que, com rigor técnico-processual, é equivocado escrever algo
como “tenho uma ação em andamento na 19ª Vara Cível” ou “estou acompa-
nhando uma ação na 6ª Vara de Família”, já que, como se viu, a ação deixa de
ter existência no momento em que é proposta. Ação não tem andamento,
não tem tramitação; processo, sim.
Por outro lado, e tomados os três tipos de processos que o ordenamento
jurídico brasileiro contempla (o processo de conhecimento, o de execução e
o cautelar), a regra geral é a de que o processo de conhecimento tem por fi-
nalidade a jurisdição de conhecimento; o processo de execução objetiva a
prestação de jurisdição de execução e o processo cautelar se presta a alcançar
a jurisdição cautelar3. Por isso, e como regra geral, não se teria como, por
exemplo, extrair tutela jurisdicional de conhecimento a partir de um proces-
so de execução. Nem tutela jurisdicional executiva de um processo cautelar.
E assim por diante.
Em outra ocasião4, salientamos:
Daí a importância que se deve dar ao pedido que o autor formula em sua pe-
tição inicial. ‘Ao pedido’, ressalte-se, e não ‘ao nome da ação’5. Por isso é
que, quando o autor propõe a ação e deduz o pedido que quer ver apreciado
pelo juiz, naquele momento, mesmo que nem se dê conta disso, ele está de-
finindo qual o tipo de processo que sua ação fez nascer. Também está defi-
nindo, por exclusão, quais os provimentos jurisdicionais que não podem ser
deferidos na via que acabou de ser aberta. De igual forma, ficam definidos,
até mesmo, os dispositivos do Código de Processo Civil que podem e que
não podem ser utilizados para a resolução de problemas surgidos naquele
processo. Assim, se o autor propõe ação em que pede a condenação do réu ao
pagamento de determinada soma, ficou definido que aquele é um processo
de conhecimento (único por meio do qual, em tese, se chega ao provimento
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sequer chegado a haver processo! Hoje, como se sabe, o processo surge com a propositura
da ação – não com a citação do réu, que é ato processual que serve para complementar a
relação de processo. Ora, se a citação é ato que complementa, que aperfeiçoa o processo,
é porque o processo, evidentemente, já existia antes dela. E é por isso que o juiz, hoje, ao
indeferir a petição inicial antes da citação do réu, extingue o processo (art. 267, inciso I,
do CPC), que, portanto, já existe antes mesmo de o réu ser citado.
3 Em boa verdade, o mais correto seria afirmar que o processo cautelar serve à tutela
de urgência, que pode ser essencialmente cautelar ou pode ostentar natureza satisfativa.
4 ASSIS, Arnoldo Camanho de. Tutela cautelar no processo de conhecimento. Revis-
ta de Doutrina e Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territó-
rios, Distrito Federal, v. 69, maio/ago. 2002.
5 A natureza da ação é determinada pelo conteúdo do pedido formulado, sendo irre-
levante o nomen iuris que lhe tenha atribuído o autor, principalmente em face dos prin-
cípios da mihifactum, dabotibiius e iuranovitcuria (...)”. (STJ, REsp. n. 100766/SP, Rel.
Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, publicado em 15.06.1999.

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