Uma introdução ao fenômeno jurídico sucessório

AutorGustavo Pereira Leite Ribeiro
Páginas603-627
Capítulo 24
UMA INTRODUÇÃO AO FENÔMENO
JURÍDICO SUCESSÓRIO
Gustavo Pereira Leite Ribeiro
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito de sucessão e suas espécies. 3. Morte
como causa da sucessão. 3.1. Morte real. 3.2. Morte presumida. 4. Abertura da
sucessão. 4.1. Tempo da abertura da sucessão. 4.2. Lugar da abertura da suces-
são. 5. Destinatários da sucessão e os excluídos. 5.1. Indignidade. 6. Aceitação e
renúncia da herança. 6.1. Aceitação. 6.2. Renúncia.
1. INTRODUÇÃO
A existência jurídica da pessoa natural termina com a morte, conforme
teor da primeira parte do art. 6º do Código Civil. Assim, a constatação da
morte determina a supressão da personalidade jurídica conferida ao ser hu-
mano pelo sistema legal. Por consequência, o falecido deixa de ser destinatá-
rio de normas jurídicas, não podendo mais ser considerado sujeito de direitos
ou de obrigações.
Algumas situações jurídicas, reputadas intransmissíveis, são extintas com
o falecimento do seu titular, como ocorre com o poder familiar (art. 1.635,
I, CC), com a sociedade conjugal (art. 1.571, I, CC), com o usufruto (art.
1.410, I, CC), com os contratos personalíssimos, por exemplo, prestação de
serviço (art. 607, CC) e mandato (art. 682, II, CC), bem como contrato de
trabalho. Parece-nos também que os direitos de personalidade se extinguem
por morte do seu titular, apesar do enunciado no art. 12, parágrafo único, e
no art. 20, parágrafo único, ambos do Código Civil.
Outras situações jurídicas, ativas ou passivas, consideradas transmissí-
veis, não são extintas com a morte do seu titular, em evidente benefício da
estabilidade, da eficiência e da justiça de inúmeras interações sociais. Exce-
tuadas aquelas que se aniquilam por força de sua própria natureza ou por im-
perativo legal, as demais situações jurídicas, caracterizadas por sua patrimo-
nialidade, sobrevivem ao falecimento de seu titular, impondo-se o problema
do destino dos respectivos direitos e obrigações.
Compete ao Direito das Sucessões regular o destino, depois da morte de
uma pessoa, dos seus direitos e obrigações que subsistem para além dessa
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morte.1 O Direito das Sucessões é o setor do Direito Civil responsável pelas
regras que delimitam a transmissão do patrimônio de alguém que deixa de
existir.2
O Código Civil é a primordial fonte legislativa do Direito das Sucessões,
que ocupa o Livro V, da Parte Especial. A Constituição da República, em seu
art. 5º, XXX, enuncia “é garantido o direito de herança”.
Nosso objetivo, no presente trabalho, é apresentar as noções fundamen-
tais que permitam a compreensão do fenômeno jurídico sucessório.
2. CONCEITO DE SUCESSÃO E SUAS ESPÉCIES
Em sentido amplo, afirma-se que sucessão designa a transferência de di-
reitos e obrigações de uma pessoa para outra.3 Assim, ocorre sucessão “quan-
do uma pessoa fica investida num direito ou numa obrigação ou num conjun-
to de direitos e obrigações que antes pertenciam a outra pessoa, sendo os di-
reitos e obrigações do novo sujeito considerados os mesmos do sujeito ante-
rior e tratados como tais”.4 Com acerto, Arthur Vasco Itabaiana de Oliveira
assinala que o traço essencial da sucessão situa-se na permanência de uma re-
lação jurídica que perdura e subsiste a despeito da mudança dos respectivos
titulares.5
A transferência de direitos e obrigações pode ser desencadeada por ato
realizado pelo seu titular em vida, assim como em virtude do fato morte.6 A
primeira é conhecida como transmissão inter vivos, enquanto a segunda,
transmissão mortis causa.
Interessa-nos, particularmente, a transmissão mortis causa. Em sentido
estrito, utiliza-se o termo sucessão para designar a transferência do conjunto
de direitos e obrigações de alguém que falece para outro que ainda está vivo.
A propósito, assinalam Francisco José Cahali e Giselda Maria Fernandes No-
vaes Hironaka: “emprega-se o vocábulo sucessão em sentido estrito para
identificar a transmissão do patrimônio apenas em razão da morte, como fato
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1 GALVÃO TELLES, Inocêncio. Direito das sucessões. 6. ed. Coimbra: Coimbra,
1996, p. 10-11.
2 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das sucessões. Campinas: Red Livros, 2000, p. 52.
3 BEVILÁQUA, Clóvis. Direito das sucessões. Campinas: Red Livros, 2000, p. 54.
4 GALVÃO TELLES, Inocêncio. Direito das sucessões. 6. ed. Coimbra: Coimbra,
1996, p. 25.
5 OLIVEIRA, Arthur Vasco Itabaiana de. Tratado de direito das sucessões. 4. ed. São
Paulo: Max Limonad, 1952, v. 1, p. 52.
6 Cf. GALVÃO TELLES, Inocêncio. Direito das sucessões. 6. ed. Coimbra: Coimbra,
1996, p. 29-33.

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