Autonomia reprodutiva e planejamento familiar

AutorManoel Antônio Silva Macêdo
Ocupação do AutorMestre em Direito Privado pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da PUC Minas
Páginas67-93
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Capítulo 3
AUTONOMIA REPRODUTIVA
E PLANEjAMENTO FAMILIAR
3.1 ANTECEDENTES HISTóRICOS
A perspectiva histórica dos direitos fundamentais desemboca
no surgimento do moderno Estado Constitucional, coincidindo com o
reconhecimento e proteção da dignidade da pessoa humana e com a
limitação do poder estatal (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2021,
p.137).
Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2021, p.137) destacam que algumas
concepções doutrinárias e formas jurídicas antecederam e influencia-
ram o reconhecimento dos direitos fundamentais, no final do século
XVIII, até sua consagração ao longo do século XX, em nível do direito
constitucional positivo.
Klaus Stern (1988 apud SARLET; MARINONI; MITIDIERO,
2021, p.137) sintetiza em três etapas a trajetória histórica dos direitos
fundamentais: (a) uma pré-história, com raízes na filosofia clássica,
especialmente no pensamento greco-romano e na tradição judaico-
-cristã, que se desenvolve até o século XVI; (b) uma fase intermediária,
de elaboração e afirmação da doutrina jusnaturalista, com as primeiras
formulações a respeito de direitos da pessoa humana, na seara do pen-
samento filosófico europeu; (c) e a fase da constitucionalização, iniciada
em 1776, com as sucessivas declarações de direitos dos novos Estados
americanos (Declaração de Direitos do Povo da Virgínia, de 1776), e
com a Declaração Francesa, de 1789.
Nas primeiras constituições, os direitos fundamentais foram con-
cebidos como direitos de defesa do indivíduo perante o Estado, forte-
mente influenciados pelo pensamento liberal-burguês do século XVIII.
Contudo, os impactos da industrialização e dos graves problemas
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sociais e econômicos e a constatação de que a consagração formal de
liberdade e igualdade não assegurava seu efetivo gozo acabaram, já no
decorrer do século XIX, gerando amplos movimentos reivindicatórios
e o reconhecimento progressivo de direitos sociais, cuja nota distinti-
va é sua dimensão positiva de propiciar o bem-estar social (SARLET;
MARINONI; MITIDIERO, 2021, p.141).
Desse modo, a tradição liberal dos direitos do homem, congre-
gada em torno do laissez-faire, que vai do período do século XVII até a
metade do século XIX, sofreu forte contestação, no plano político, pelo
republicanismo e pelo comunitarismo, dando ensejo aos aprimoramen-
tos da doutrina do Welfare State, diante da dificuldade de enfrentar a
realidade dos problemas sociais do capitalismo, que desencadearam as
lutas populares dos séculos XIX e XX.
Preocupada em promover o bem-estar social, a doutrina do
Welfare State foi responsável pela introdução de direitos sociais nas
Cartas constitucionais, período que faz parte da história do constitu-
cionalismo moderno, no qual sobressai como símbolo maior a Cons-
tituição de Weimar.
Posteriormente, a Declaração Universal dos Direitos Humanos
de 1948 inaugurou uma nova fase histórica de internacionalização dos
direitos humanos, em razão da proclamação dos direitos fundamentais
pela Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), dando início ao pro-
cesso de inclusão de novas categorias de direitos supraestatais, não mais
restritos ao interior dos Estados.
Tal como no direito internacional, a multiplicidade de fontes dos
direitos fundamentais é admitida no ordenamento jurídico brasileiro,
que prevê, expressamente, a possibilidade de ampliação de novos direi-
tos e garantias fundamentais, decorrentes inclusive de tratados interna-
cionais de que o Brasil seja parte, conforme art.5º, §2º, da Constituição
Federal.
Nesse norte, para Norberto Bobbio (2004, p.1), o reconhecimen-
to e a proteção dos direitos do homem estão na base das Constituições
modernas, sem os quais não se pode falar em democracia, e em condi-
ções mínimas para solução pacífica dos conflitos.
Bobbio (2004, p.5) afirma também que os direitos naturais, por
mais fundamentais que sejam, são históricos, isto é, resultado das lutas
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