Capítulo 1 - Conceito, objeto e método da criminologia

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Capítulo 1
CONCEITO, OBJETO E
MÉTODO DA CRIMINOLOGIA
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A criminologia é a ciência que estuda a criminalidade. Sem desejar transfor-
mar-se em mera fonte de dados, a criminologia, como ciência empírica, baseada
na realidade, e interdisciplinar, ou seja, somando ensinamentos da sociologia,
psicologia, medicina legal e o próprio direito, apresenta como objeto de estudo
o crime, o criminoso, a vítima e o controle social.
O saber criminológico exige do intérprete da lei um conhecimento amplo
e abrangente das vertentes do crime, necessitando uma visão da criminalidade
diferenciada daquela apresentada pelo Direito Penal.
A relação Criminologia e Direito Penal sempre existiu. Aliás, no nal do
século XIX, Enrico Ferri trazia o debate entre a relação das duas ciências, de-
monstrando a importância de cada uma delas, somando-a ao estudo da Política
Criminal, cando a Criminologia com a função de auxiliar as duas ciências.
Enquanto o Direito Penal tem por objeto as normas penais e por método o téc-
nico-jurídico, interpretando o dever/ser, a Criminologia volta-se ao fenômeno
da criminalidade, investigando suas causas segundo o método experimental,
ou seja, o mundo do ser, estabelecendo um fundamento cientíco para que a
Política Criminal possa transformá-lo em opções e estratégias concretas de fácil
assimilação ao legislador para criar normas penais e aos poderes públicos para
agir na prevenção, repressão do crime e na ressocialização do delinquente.
A criminologia não concorre com o direito penal. Como ciências autô-
nomas, debatem juntas os assuntos relacionados ao crime, cada qual com a
sua vertente. A Criminologia atual não mais se dene como uma ciência que
investiga as causas da criminalidade, mas sim as condições da criminalização, o
sistema penal, os mecanismos do controle social formal e informal, analisando o
comportamento de criminoso funcionalmente relacionado às estruturas sociais.
Não existe atualmente a imagem de que a criminologia está em segundo plano,
enquanto o direito penal é que traça as vertentes do crime. A criminologia deixa
CRIMINOLOGIA – TEORIA E PRÁTICA • Paulo Sumariva
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de ser considerada como um saber auxiliar do direito penal para se tornar um
saber crítico, analisando o objeto criminológico.
A ciência da criminologia possui um papel decisivo para o ensino do direito,
auxiliando na compreensão do poder e do controle social e penal, estudando o
crime, a criminalidade, a pena, a vitimização, a impunidade e a cifra negra. O
saber criminológico é a formação de uma consciência jurídica crítica e responsá-
vel, capaz de tirar o jurista de sua zona de conforto, adormecido no seu ponto de
partida, que é a norma válida, e traçar novas diretrizes, visando o enfretamento
da violência individual, institucional e estrutural.
Não resta dúvida de que o sistema criminal brasileiro enfrenta na atualidade
uma grave crise. Não existem vagas para todos os presos e presas em penitenciárias
com os milhares de mandados de prisão expedidos e não cumpridos. Se todos
fossem cumpridos, onde colocaríamos os detentos? O sistema aponta falhas
em todos os seus segmentos, desde a formação da lei até a sua real aplicação.
Prossionais do direito chegam à exaustão, sem, contudo, encontrar solução
imediata a tal problemática.
Para tanto, encontramos na criminologia uma resposta convincente de todas
estas questões. O domínio do saber criminológico possibilita ao prossional do
direito um real conhecimento da realidade, aplicando de maneira madura e cons-
ciente a lei dentro da atualidade pátria. Aliás, o saber criminológico distingue-se
do saber comum ou popular, que está ligado a experiência práticas, distanciando
o prossional do direito dos “achismos” que traz arraigados na mente.
É assim que a interdisciplinaridade da criminologia faz o seu papel no sis-
tema criminal. Muitas vezes, a lei nos torna cego face à realidade. Para tanto, os
ensinamentos da Sociologia, Economia, Psicologia, ou qualquer outra ciência
não jurídica, que estude a realidade do comportamento humano na sociedade
formam uma nova diretriz a ser seguida pelo operador do direito. É nesse mo-
mento que a criminologia desempenha o seu papel com maestria, auxiliando
a sociedade no combate do crime e do criminoso, buscando uma intervenção
positiva para ressocializá-lo.
Etimologicamente, o termo criminologia deriva do latim crimino (crime) e
do grego logos (estudo), isto é, estudo do crime. Entretanto, não podemos limitar
nosso estudo apenas ao crime, mas também devemos levar em consideração as
circunstâncias sociais, a vítima e o criminoso.
Em 1879, o Antropólogo francês Paul Topinard foi quem utilizou pela pri-
meira vez o termo criminologia. Contudo, seu reconhecimento ocial se deu em
1885, quando o italiano Rafaele Garófolo o utilizou como título de uma obra – A
Criminologia de Garófalo – e, junto com Cesare Lombroso e Enrico Ferri, foram
os três grandes fundadores da Criminologia cientíca.
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CAPítulo 1 • CoNCEIto, oBJEto E mÉtoDo DA CrImINoloGIA
1.2 ETIOLOGIA CRIMINAL – CRIMINOGÊNESE
A Criminogênese é a parte da Criminologia que estuda os mecanismos de
natureza biológica, psicológica e social, através dos quais se projetam os com-
portamentos criminosos. Para tanto é necessário uma análise interdisciplinar,
de natureza sociológica, econômica, losóca, política, médica e psicológica
para a sua conceituação.
Encontramos teorias que armam ser a criminogênese determinada pela
estrutura física e mental do indivíduo. Outros valorizam a análise dos conitos
de adaptação do indivíduo e as suas relações com diversos grupos a que per-
tence. Atribui a responsabilidade da formação do caráter antissocial às relações
familiares defeituosas nos primeiros anos de vida. Existem também autores que
relacionam a criminogênese à ação da sociedade sobre o indivíduo.
1.3 AS VERTENTES DO CRIME
Crime é objeto de estudo de diversas searas, as quais buscam conceituá-lo da
melhor maneira. Para conhecermos a criminologia, é necessário vericar como
algumas ciências conceituam e reconhecem o crime.
1.3.1 Direito penal e o crime
O direito penal apresenta uma abordagem legal e normativa do crime,
ao conceituá-lo como sendo toda conduta ofensiva a preceitos primários que
redunda em imposição de sanções. Tem como plano inicial o princípio da
legalidade. Sem lei não há crime. Aliás, a lei é o limite do conceito de crime
para o direito penal.
Não resta dúvida de que o direito penal é seletivo, ou seja, ele seleciona o
que punir e quem irá sofrer uma reprimenda. Para tanto, o Estado cria a crimi-
nalização primária e a secundária.
Na criminalização primária, o Estado seleciona alguns comportamentos
existentes no contexto social, em tese, danosos e que atingem bens jurídicos,
para proibi-los, ameaçando os indivíduos através de uma lei penal editada for-
malmente pelo Poder Legislativo.
Na criminalização secundária, criada a lei penal, tendo o agente praticado
o comportamento ali descrito, surge para o Estado o “jus puniendi”, ou seja, a
possibilidade de investigá-lo, processá-lo e, por m, condená-lo ao cumprimento
de uma pena.

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