Capítulo V - A Resposta do Réu

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Manoel Antonio Teixeira Filho
Capítulo V — A Resposta do Réu
1. Introdução
A CLT, pouco afeita aos rigores cientícos, alude, de maneira genérica, à defesa do
réu. Essa atitude do legislador trabalhista, sob certo aspecto, é justicável, pois o texto foi
redigido com a preocupação de ser entendido mesmo por quem não possuísse formação
jurídica — lembrando-se que o art. 791, caput, da CLT, atribui capacidade postulatória aos
litigantes, faculdade que lhes permite demandar em juízo sem a participação de advogado —
conquanto isso não seja recomendável, designadamente, nos dias da atualidade que revelam
um processo do trabalho complexo.
O CPC de 1973, mais devotado à técnica, se refere à resposta do réu, que, nos termos
do art. 297, compreendia a exceção, a contestação e a reconvenção. Apesar disso, o legislador
cometeu, aqui, dois deslizes: a) inseriu a contestação antes da exceção, quando, na verdade,
a ordem era inversa; b) disse menos do que pretendia (minus dixit quam voluit), pois
havia uma outra resposta do réu que não era mencionada nesta norma legal: tratava-se do
reconhecimento do direito alegado pelo autor — que o inciso II, do art. 269, do CPC, em
má técnica, designava de reconhecimento da “procedência do pedido”. Um pedido sempre
“procede”, pois proceder signica vir de algum lugar. Os pedidos são rejeitados ou acolhidos
(CPC de 2015, art. 490).
O CPC de 2015 abandonou a referência à resposta do réu, passando a mencionar, de
maneira especíca, apenas a contestação (arts. 335 a 342) e a reconvenção (art. 343), uma vez
que eliminou as exceções (incompetência relativa, suspeição e impedimento). Considerando
que a CLT, além de admitir, em caráter supletivo, a reconvenção, prevê a contestação (defesa,
art. 847) e as exceções (art. 799), devemos continuar a aludir à resposta do réu, expressão
tomada por empréstimo ao CPC de 1973 e largamente posta em uso pela doutrina e pela
jurisprudência trabalhistas.
Vimos, em capítulos anteriores, que embora a resposta do réu devesse ser sempre for-
mulada oralmente, por força do disposto no art. 847, da CLT, na prática, desde muito tempo,
ela passou a ser apresentada sob a forma escrita, na maiora dos casos, para conveniência de
todos os sujeitos do processo.
O importante a assinalar é que, após formular a primeira proposta de conciliação — e
sendo esta rejeitada —, o juiz abrirá oportunidade para que o réu apresente a sua resposta.
Nos termos do art. 847, CLT, ela será oral, dispondo o réu, para isto, de vinte minutos; por
força da praxe, contudo, vem sendo apresentada por escrito.
Antes de examinarmos, especicamente, cada uma das espécies de resposta (exceção,
contestação, reconvenção, reconhecimento do direito alegado pelo autor), devemos lançar
algumas considerações de ordem propedêutica.
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A defesa do réu pode ter como objeto: a) apenas o processo; b) apenas o direito material
que dá conteúdo aos pedidos; c) um e outro, ao mesmo tempo.
a) Defesa quanto ao processo. De modo geral, a defesa se realiza com vistas ao direito
material alegado pelo autor, em que pese ao fato de, em situações extraordinárias,
poder haver processo sem direito material, ou melhor, ser possível o exercício da ação
sem que o autor pretenda a tutela de um direito material, como se dá, v. g., na ação
declaratória negativa.
Em alguns casos, no entanto, o réu se defende não mediante uma resistência às preten-
sões materiais formuladas pelo adversário, mas por meio de objeções de natureza puramente
processual. Diz-se, por isso, que a defesa aqui é indireta, em contraposição à direta, que tem
como objeto o mérito da causa.
Justica-se a denominada “defesa indireta” pela existência de duas relações jurídicas
distintas, que se estabelecem no processo: uma, de natureza material; outra, processual.
Aquela representa o conteúdo; esta, o continente, embora a fórmula ideada não possa ser
aplicada à generalidade das situações, porquanto, como dissemos, pode haver ação sem
direito material, como é o caso da ação declaratória negativa. É, portanto, dessa inegável
duplicidade de relações jurídicas, que se estabelecem em juízo, que emana a possibilidade
de a defesa ser feita com relação somente ao processo (ou no tocante, apenas, ao mérito; ou
quanto a ambos, de maneira simultânea, conforme veremos).
A defesa quanto ao processo (indireta), por sua vez, pode levar em conta: 1) o processo
em si, como método ou técnica de solução estatal de conitos de interesses; 2) a gura do
juiz, como condutor exclusivo do processo e seu sujeito desinteressado.
Comumente, a defesa (1) quanto ao processo, em si, é efetuada em sede de preliminar,
na contestação, abrangendo, p. ex., os pressupostos de constituição e de desenvolvimento
regulares da relação processual. Os primeiros podem ser de caráter subjetivo (partes) ou
objetivo (ação); os segundos dizem respeito a certos atributos das partes (capacidade de ser
parte, capacidade de estar em juízo, capacidade postulatória), e ao procedimento (inicial apta,
citação válida, inexistência de perempção, de litispendência, de coisa julgada ou de conexão).
Também se compreendem na defesa quanto ao processo em si a alegação de falta das condi-
ções da ação, da autorização conjugal, quando necessária, da inexistência de procuração, etc.
A defesa relativa ao processo, que tenha como escopo a pessoa do juiz, (2) é efetuada,
quase sempre, mediante exceção: de incompetência, de impedimento e de suspeição. Um
retoque: embora as exceções de impedimento e de suspeição se reram, realmente, à pessoa
do juiz, a de incompetência concerne ao juízo, por não levar em conta a pessoa do magistrado,
senão que o órgão jurisdicional a que ele se encontra vinculado.
Sob certo aspecto, é lícito armar que toda defesa do réu, que não tenha como objeto o
mérito da causa, pode ser considerada indireta, o que equivale a dizer, processual. A nali-
dade da defesa indireta, aliás, é, exatamente, a de impedir um pronunciamento jurisdicional
sobre o mérito, ou, quando menos, de retardar esse pronunciamento, até que seja removida
a causa da objeção, como se dá, v. g., nos casos de incompetência, impedimento e suspeição.
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b) Defesa quanto ao mérito. Aqui, o réu não formula nenhuma impugnação de índole
essencialmente processual, senão que se dedica a resistir às pretensões materiais for-
muladas pelo autor.
A defesa quanto ao meritum causae pode ser direta ou indireta.
É direta quando se volta para a causa de pedir e para os pedidos. Neste caso, o réu tanto
pode impugnar os fatos narrados pelo autor, armando, por exemplo, que não são verdadeiros
(jornada de trabalho, despedida sem justa causa, prestação de serviços em locais insalubres,
perigosos ou penosos, etc.) ou que deles não decorrem as consequências jurídicas imaginadas
(reintegração de quem não é estável no emprego, equiparação salarial com paradigma que
é empregado de outra empresa, etc.).
Será indireta a defesa quanto ao mérito sempre que o réu, reconhecendo os fatos
constitutivos do direito alegado pelo autor, outro lhe opuser, capaz de modicar (houve
novação), impedir (a dívida ainda não se venceu) ou extinguir (ocorreu o pagamento do
valor pleiteado) esse direito.
lnserem-se, ainda, no conceito de defesa indireta, com relação ao mérito, as alegações
de prescrição extintiva e de decadência. Ambas são, também, classicadas por muitos como
“prejudiciais de mérito” ou “exceções substanciais”. Seja qual for o título que se lhes pespegue
ou a posição taxinômica que se lhes reserve na contestação, o certo é que uma e outra não
constituem defesa processual (indireta) nem defesa direta quanto ao mérito, mas, defesa indi-
reta com relação a este, ou seja, quanto às pretensões materiais postas em juízo pelo autor.
c) Defesa quanto ao processo e quanto ao mérito. Conquanto nada obste a que o réu
se defenda, apenas, quanto ao processo, ou, somente, quanto ao mérito, os fatos da
realidade prática estão a revelar que ele, sempre que é o caso, cuida de oferecer defesa
com relação a ambos, mormente, quando se encontra assistido por bom advogado.
Considerando-se, aliás, a possibilidade de a defesa quanto ao processo ser de eciência
capaz de impedir, até mesmo, o exame do mérito, compreende-se o conceito, difundido nos
meios forenses, de que os advogados que dominam as normas processuais são os semideu-
ses do processo. Só não se esclarece quem são os próprios deuses... Se é que possui alguma
importância essa “divinização” forense.
Se a defesa tiver como objeto o processo e o mérito, é elementar que, por primeiro,
deve ser formulada aquela, para, só depois disso, ser apresentada esta. Em princípio, apesar
dessa ordem lógica a que nos referimos, as duas espécies de defesa devem ser feitas numa só
peça, como se dá com as preliminares à contestação. Em outras situações, porém, as defesas
devem ser oferecidas em peças separadas, como acontece quando a concernente ao pro-
cesso tiver como fundamento a incompetência do juízo, ou o impedimento ou a suspeição
do juiz. Sendo a exceção e a contestação modalidades distintas de resposta, não devem ser
encambulhadas em peça única.
De qualquer modo, as considerações que exaramos, até este ponto, acerca das respostas
que o réu possa apresentar em juízo, tiveram um sentido nitidamente propedêutico. Mais
à frente, nos dedicaremos, de modo especíco, ao exame das diversas espécies de resposta.
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