Capítulo XIII - O Exame Pericial e o Depoimento do Perito

Páginas466-489
466
Manoel Antonio Teixeira Filho
Capítulo XIII — O Exame Pericial
e o Depoimento do Perito
1. Conceito de perícia e de perito
Segundo Moacyr Amaral Santos (Comentários, p. 335) a perícia consiste “no meio
pelo qual, no processo, pessoas entendidas e sob compromisso vericam fatos interessantes
à causa, transmitindo ao Juiz o respectivo parecer”.
Com efeito, há situações em que determinados fatos podem ser percebidos, com pre-
cisão, apenas por pessoas dotadas de determinado conhecimento técnico ou cientíco. Daí
por que Carnelutti se refere aos fatos de percepção técnica (Sistema di diritto processuale
civile. 1.º v., n. 209), assim entendidos os que não se incluem no cabedal de conhecimentos
das pessoas comuns.
A perícia se destina não somente à vericação de tais fatos, mas também à sua aprecia-
ção pelo experto; em verdade, o laudo pericial contém um parecer do perito acerca dos fatos
vericados e interpretados tecnicamente. Com base no laudo (mas, não necessariamente em
obediência a ele) o magistrado apreciará os fatos, formando o seu convencimento. Verica-
-se, desse modo, que a perícia não é prova, mas sim um meio probante.
De nada valeria uma inspeção judicial a pessoas ou coisas (CPC, art. 481), se os fatos
a elas relacionados não pudessem ser captados pelas faculdades sensoriais do magistrado,
visto que inaptas (isto é, não especializadas) para tanto. Ainda que, eventualmente, o juiz
possuísse conhecimentos técnicos a respeito da matéria não lhe seria permitido agir como
perito, pois estaria, em última análise, funcionando como uma espécie de assessor do liti-
gante, cuja parcialidade seria sobremaneira censurável. Esses conhecimentos especializados
o juiz poderia utilizar na apreciação do laudo, a m de convencer-se, ou não, da conclusão
a que chegou o perito.
O perito é um auxiliar do juízo (CPC, art. 149), contribuindo, mediante compromisso
(CLT, art. 827), com a sua cognição técnica para o descobrimento da verdade (CPC, art. 378).
E porque auxiliar o é, não substitui o juiz, em suas funções jurisdicionais. Supre-lhe, apenas,
o desconhecimento ou a ciência imperfeita a respeito de certos fatos de natureza técnica ou
cientíca. Correta, portanto, a observação de Coqueijo Costa (Doutrina e jurisprudência do
processo trabalhista. São Paulo: LTr, 1978. p. 16) de que o perito ca alheio aos resultados do
processo; ele apenas “contribui para formar o material de conhecimento de que o juiz pre-
cisa, sem participar da decisão, que cabe exclusivamente ao magistrado, dada a jurisdição a
este ínsita, da qual resulta a coisa julgada, garantida constitucionalmente por ser a maior das
certezas humanas”. Ao apreciar o laudo, o juiz não julga os fatos em sua essência, mas apenas
6350.3 - Manual da Audiência na Justiça do Trabalho - 3a ed - Fisico.indd 4666350.3 - Manual da Audiência na Justiça do Trabalho - 3a ed - Fisico.indd 466 07/01/2022 15:57:0807/01/2022 15:57:08
467
Manual da Audiência na Justiça do Trabalho
o resultado da investigação efetuada pelo perito: este surge, pois, como um tradutor especia-
lizado de tais fatos. Daí a razão de falar-se, na doutrina, em perito percepiente, ou seja, aquele
cuja função é substituir o magistrado na percepção dos fatos, opostamente ao judicante, que
se destina a indicar ao juiz as regras de experiência ou a aplicá-las. Nestas últimas funções, o
perito presta assistência ao magistrado, a quem caberá perceber, p essoalmente, os fatos, como
ocorre, por exemplo, na inspeção judicial (CPC, art. 481).
O experto tem de estar habilitado para exercer a função que lhe foi cometida pelo juiz
(CPC, art. 156, § 1.º), sob pena de ser recusado, salvo, é certo, se não houver na localidade
pessoa habilitada, ou, havendo, estiver impedida de atuar nos autos, ou, ainda por qualquer
motivo legalmente invocável, não aceitar o encargo. É elementar que o exercício das funções
periciais por quem não estiver habilitado para isso somente deverá ser admitido se, além das
razões já mencionadas: a) for extremamente difícil trazer-se, de outra localidade, perito habili-
tado; e b) o perito não habilitado possuir conhecimentos técnicos necessários ao desempenho
das funções, ou seja, para a realização do exame para o qual foi nomeado.
O perito, contudo, não se confunde com a testemunha; embora ambos sejam terceiros na
relação jurídica processual, o primeiro relata fatos do presente, enquanto o segundo versa sobre
fatos pretéritos. Daí por que se diz, em doutrina, que a testemunha envolve uma apreciação
histórica dos acontecimentos que constituem o motivo da controvérsia estabelecida na ação.
Ela, assim, reconstitui em juízo os fatos do passado que caram retidos em sua memória e que
interessam à instrução do procedimento. Por esse motivo, não se pode exigir que a testemunha
narre, com absoluta delidade, fatos ocorridos há vários anos; seria exigir-lhe acima da sua
capacidade mnemônica, com resultados não raro prejudiciais para a causa e para a própria
investigação da verdade real que se procura transportar para os autos.
Além disso, enquanto o perito é eminentemente neutro (pois foi nomeado pelo juiz),
a testemunha se caracteriza, em regra, pela parcialidade, porquanto a sua presença em juízo
decorre de indicação de um dos litigantes. Da testemunha, por outro lado, não se exige ha-
bilitação para prestar declarações; basta, apenas, que tenha ciência comum dos fatos acerca
dos quais será interrogada.
Os assistentes técnicos, ao contrário, são parciais, no sentido de que funcionam como
auxiliares ou consultores do litigante que o indicou. Também deles se exige, em alguns casos,
habilitação prossional.
Conquanto o CPC tenha dispensado o perito de prestar o compromisso legal, o art. 827,
da CLT, continua a exigir esse compromisso.
2. Perito e testemunha
Embora tenhamos, há pouco, esboçado alguns traços que distinguem o perito da
testemunha, devemos agora aprofundar-nos nessa distinção. O perito e as testemunhas são
pessoas que possuem funções distintas no processo; por isso, a doutrina costuma estabele-
cer as seguintes diferenças entre eles: a) a testemunha depõe sobre os fatos da causa, por ela
presenciados ou que lhe chegaram ao conhecimento por intermédio de terceiros; já ao perito
cabe esclarecer o órgão judicante a propósito dos fatos controvertidos na ação, mediante a
6350.3 - Manual da Audiência na Justiça do Trabalho - 3a ed - Fisico.indd 4676350.3 - Manual da Audiência na Justiça do Trabalho - 3a ed - Fisico.indd 467 07/01/2022 15:57:0807/01/2022 15:57:08

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT