Constitucionalismo televisionado: espetacularizado, cansado e ignorante

AutorJoão Vitor Flavio de Oliveira Nogueira
Ocupação do AutorGraduando em Direito na Universidade Federal de Uberlândia, membro do Grupo Polemos: Política, Imaginação e Futuro
Páginas379-403
Constitucionalismo Televisionado:
espetacularizado, cansado e ignorante
João Vitor Flavio de Oliveira Nogueira1
TELEVISED CONSTITUCIONALISM
- Eu raramente assisto aos “telões”, nem vou a corridas ou parques de
diversão. Acho que é por isso que tenho tempo de sobra para ideias malucas.2
Resumo: A midiatização da justiça e a visibilidade extre-
ma transformaram os juízes da suprema corte brasileira em guras
públicas. O fenômeno do televisionamento das sessões do Supremo
Tribunal Federal (STF) representa a espetacularização da cultura
constitucional. Nesse cenário, sustentado na sociologia de PIERRE
BOURDIEU, investiga-se como o espetáculo, o cansaço e a ignorân-
cia afetam o campo simbólico do órgão de cúpula do Poder Judi-
ciário. Os reexos das características das sociedades do espetáculo,
do cansaço e da ignorância aparecem como espaços propícios para
pesquisar as variáveis que interferem no jogo das decisões judiciais
da mais alta corte do país. Questiona-se como o novo tempo altera
aquilo que lhe é sagrado ou profano, sendo que nem a justiça tam-
pouco a identidade constitucional se revelam como o principal inte-
resse frente aos holofotes da mídia.
Palavras-chaves: Constitucionalismo; Espetáculo; Cansaço;
Ignorância; Campos Sociais.
Abstract: e mediatization of justice and extreme visibility
transformed the judges of the Brazilian Supreme Court into public
gures. e live TV broadcast of the Supreme Court’s plenary ses-
1 Graduando em Direito na Universidade Federal de Uberlândia, membro do Grupo Polemos: Política, Imaginação e Futuro.
2 BRADBURY, Ray. Fahrenheit 451: a novel. Simon and Schuster, 2012, p.27.
380 • CAPÍTULO 14
sions represents a spectacularization of constitutional culture. Hen-
ce, based on the PIERRE BOURDIEU’s Sociology, this article aims
to investigate how the spectacle, burnout and ignorance society aect
the Brazilian Supreme Court’s “symbolic eld”. e question is how
new time changes what is sacred or profane, considering that neither
justice nor constitutional identity are the main interests under the
media spotlight.
Keywords: Constitutionalism; Spectacle; Burnout; Ignoran-
ce; Symbolic eld.
Apresentação
A profanação da verdade simboliza o estigma de um tempo
que prefere a representação à realidade. Em 1967, GUY DEBORD,
com a obra A sociedade do espetáculo3, revelou que a ilusão atingiu
um novo patamar de sacralidade, enquanto a verdade foi rebaixada
ao status de profana4. Já no século XXI, o lósofo coreano BYUNG-
-CHUL HAN ensina, sustentado em Giorgio Agamben, que na So-
ciedade do cansaço a “profanação signica atribuir às coisas um uso
diferente, um uso livre, um uso com objetivos estranhos.5
Nesse sentido, a incultura e a não reexão são exaltadas,
porque o conhecimento já não é visto como um m em si mesmo.
Em uma sociedade que se contenta com um entretenimento dige-
rido e com uma vazia espetacularização, a defesa dos direitos da
ignorância surge como um sintoma do processo de depredação da
verdade. Assim revelam os ensaios de La sociedad de la ignorancia6:
“La ignorancia es atrevida, desacomplejada y, como todos en esta so-
ciedad que constantemente reclama, exige también que se respeten
sus derechos”.
Seguindo essa ideia, a premissa “ter direito é uma maneira
3 DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Contraponto: São Paulo, 2016, p.13.
4 “E sem dúvida o nosso tempo...prefere a imagem à coisa, a cópia ao original, a representação à realidade, a aparência ao ser...
Ele considera que a ilusão é sagrada, e a verdade é profana”. (DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Contraponto: São Paulo,
2016, p.13).
5 HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Tradução de Enio Paulo Giachini. Petrópolis: Vozes, 2015, p.121.
6 BREY, Antoni; MAYOS SOLSONA, Gonçal; CAMPÀS, Joan. La sociedad de la ignorancia y otros ensayos. Barcelona: Infono-
mia, 2009, p.79.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT