Da Liquidação de Sentença (Arts. 509 a 512)

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas784-800
784
Código de Processo Civil
• Comentário
Caput. Parte da matéria estava contida no
art. 475-A do CPC revogado.
A norma dispõe sobre a liquidação da obrigação
de pagar quantia certa imposta pela sentença — o
mais frequente título executivo no processo do tra-
balho.
Nota introdutória
Nos termos do art. 783, caput, do CPC a execução
para cobrança de crédito deve sempre fundar-se em
título de obrigação certa, líquida e exigível.
Nessa mesma ordem de imposições, o art. 786
estabelece que a execução poderá ser instaurada se
o devedor não satis zer a obrigação “certa, líquida
e exigível consubstanciada em título executivo”.
Esclarece o parágrafo único dessa norma que a ne-
cessidade de serem realizadas simples operações
aritméticas destinadas a apurar o valor do crédito
exequendo não subtrai a liquidez constante do título.
Em um plano ideal, as obrigações estampadas em
títulos executivos judiciais deveriam ser sempre lí-
quidas, ou seja, conter todos os elementos necessários
à sua imediata execução, porquanto a certeza do cre-
dor, em relação ao montante do seu crédito — e, em
contrapartida, a do devedor, quanto ao total da dí-
vida —, propiciaria uma execução rápida, livre, em
boa medida, dos incidentes que a entravam, entre os
quais se incluem os respeitantes à determinação do
quantum debeatur. O art. 852-B, I, da CLT, por exem-
plo, que versa o procedimento sumariíssimo, exige
que o pedido formulado na inicial seja certo ou de-
terminado e indique “o valor correspondente”. Essa
norma estava em harmonia com o § 2º, do mesmo ar-
tigo, pelo qual se exigia que a sentença condenatória
também fosse expressa mediante valores líquidos. O
sobredito parágrafo, todavia, foi vetado, quebrando
a harmonia a que nos referimos.
Não estamos a rmando que haja, na prática, sen-
tenças que se revelam incertas quanto à existência do
crédito, pois semelhante anomalia corresponderia à
não-sentença, ao nihil jurisdicional, sabendo-se que
em nosso sistema de processo o provimento emiti-
do pelo juiz deve ser sempre certo, mesmo quando
resolva relação jurídica condicional (CPC, art. 492,
parágrafo único). Nula será, conseguintemente, a
sentença que subordinar o acolhimento dos pedidos
formulados pelo autor à eventualidade de ser consta-
tada, na fase de liquidação, a existência do direito
por ele alegado.
A incerteza, pois, que se possa irradiar da senten-
ça exequenda liga-se exclusivamente ao montante,
ao quantum da dívida, situação que exigirá a prática
de certos atos antecedentes à execução propriamen-
te dita — e dela preparatórios —, destinados à
quanti cação do valor a ser exigido ao devedor. A
esse conjunto de atos dá-se o nome de liquidação
que, em rigor, não é da sentença, e sim da obrigação,
nela contida.
São múltiplos os fatores que impedem o juiz de
proferir, no procedimento ordinário, sentenças con-
tendo obrigações líquidas: ora decorre da própria
natureza do pedido, ora da absoluta ausência de
elementos nos autos (máxime da inicial e na contesta-
ção), ora da vasta quantidade de pedidos deduzidos
pelos litigantes, ora das próprias circunstâncias em
que a sentença foi prolatada (em audiência, e. g.,
quando o juiz possuía pouco tempo para compulsar,
detidamente, os autos, com o objetivo de encontrar
CAPÍTULO XIV
DA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA
Art. 509. Quando a sentença condenar ao pagamento de quantia ilíquida, proceder-
se-á à sua liquidação, a requerimento do credor ou do devedor:
I — por arbitramento, quando determinado pela sentença, convencionado pelas partes ou
exigido pela natureza do objeto da liquidação;
II — pelo procedimento comum, quando houver necessidade de alegar e provar fato novo.
§ 1º Quando na sentença houver uma parte líquida e outra ilíquida, ao credor é lícito
promover simultaneamente a execução daquela e, em autos apartados, a liquidação
desta.
§ 2º Quando a apuração do valor depender apenas de cálculo aritmético, o credor poderá
promover, desde logo, o cumprimento da sentença.
§ 3º O Conselho Nacional de Justiça desenvolverá e colocará à disposição dos interessados
programa de atualização financeira.
§ 4º Na liquidação é vedado discutir de novo a lide ou modificar a sentença que a julgou.
Art. 509
785
Código de Processo Civil
elementos que ensejassem uma condenação líquida)
etc. Não é de grande interesse, para este livro, inves-
tigarmos as causas que conduzem ao proferimento
de sentenças ilíquidas (obrigações ilíquidas), e sim
estudarmos o procedimento judicial a ser observado
quando isso acontece.
Conceito
Em sentido genérico, o verbo liquidar sugere a
acepção de averiguar, tornar líquido, tirar a limpo;
na terminologia processual, entretanto, o substanti-
vo liquidação indica o conjunto de atos que devem ser
praticados com a nalidade de estabelecer o exato
valor da condenação ou de individualizar o objeto
da obrigação. Como assinala Moacyr Amaral Santos,
pela liquidação se visa a estabelecer o valor, a quan-
tidade ou a espécie de obrigação, vale dizer, o que ou
quanto é devido (obra cit., p. 2.396).
Pela nossa parte, conceituamos a liquidação como
(a) a fase preparatória da execução, (b) em que um
ou mais atos são praticados, (c) por uma ou por am-
bas as partes, (d) com a nalidade de estabelecer o
valor da condenação (e) ou de individuar o objeto da
obrigação, (f) mediante a utilização, quando neces-
sário, dos diversos meios de prova admitidos em lei.
Examinemos, a seguir, individualmente, os ele-
mentos componentes do conceito que enunciamos.
(a) Fase preparatória da execução. Embora, no
processo do trabalho, do ponto de vista sistemático,
a liquidação integre a execução, sob o aspecto lógico
ela gura como fase destinada a preparar a execução
ou o cumprimento da sentença, por forma a tornar
exequível a obrigação contida no título judicial, seja
precisando o valor da condenação ou individuando
o objeto da obrigação. A liquidação possui, portanto,
caráter não apenas quanti cante, mas também indivi-
dualizante. Título judicial, cuja execução se promova
sem prévia liquidação — sempre que esta fosse im-
prescindível —, é legalmente inexigível, rendendo
ensejo a que o devedor argua a falta em seus embar-
gos (CPC, art. 525, § 1º, III).
(b) Em que um ou mais atos são praticados. Esse
elemento da de nição que elaboramos tem o propósito
de chamar a atenção ao fato de que embora, no geral,
credor e devedor pratiquem diversos atos convenien-
tes aos seus interesses, na liquidação há casos em que,
às vezes, o seu escopo é atingido mediante a prática
de um só ato pela parte (o credor apresenta artigos de
liquidação que não são impugnados pelo devedor).
(c) Por uma ou por ambas as partes. Nada obstan-
te o devedor tenha sido colocado em um ontológico
estado de sujeição (ao comando sancionatório que se
esplende da sentença condenatória exequenda) pelo
legislador, não se deve tirar desse fato a equivoca-
da conclusão de que ele não possua, na liquidação,
direito a praticar atos necessários a fazer com que a
execução ou o cumprimento da sentença não trans-
borde do título executivo em que se funda, ou que
não se afaste do devido procedimento legal.
Tanto é verdadeira a assertiva que o Código lhe
permite opor-se à execução, via embargos (CLT,
art. 884); contestar os artigos de liquidação (CPC,
art. 509, II), e o mais.
(d) Com a nalidade de estabelecer o valor da
condenação. Cuida-se aqui de execução por quan-
tia certa (CPC, art. 523), que tem na expropriação
judicial de bens do devedor o seu objeto (ibidem, § 3º;
art. 824). Bens atuais ou futuros (CPC, art. 789). Via
de regra, as liquidações trabalhistas tendem a quan-
ti car o valor da condenação, pois o que mais se
costuma pedir, no âmbito da Justiça do Trabalho, é
a emissão de provimentos condenatórios do réu ao
pagamento de certa quantia.
(e) Ou de individuar o seu objeto. Em alguns
casos — algo infrequente no processo especializa-
do — o que se busca, na fase de liquidação, não é
de nir o quantum debeatur e sim individuar o objeto
da obrigação a ser adimplida pelo devedor, ou seja,
“qualidades e espécies, como nas ações universais,
nas alternativas e condicionais...” (LEITE VELHO.
Execução de sentenças. Rio de Janeiro, 1985, p. 294,
nota 1). Em situações como essas, a atividade que as
partes deverão desenvolver, nessa fase preparatória
da execução, concentra-se na xação do gênero e da
qualidade do objeto obrigacional.
(f) Mediante a utilização, quando necessário, dos
diversos meios de prova admitidos em lei. Deter-
minadas liquidações reclamam a abertura de fase
voltada a provar certos fatos que são relevantes ou
mesmo imprescindíveis para de nir-se o montante
da condenação. Esse momento probatório é comum
na liquidação por artigos, notadamente porque o
CPC dispõe que, nessa modalidade de liquidação,
será observado o procedimento comum (art. 509, II).
Daí vem a possibilidade de as partes requererem
a produção de provas, segundo os meios especi -
cados em lei (ou desde que moralmente legítimos
como adverte o art. 369 do CPC).
Torna-se despiciendo fazer constar da de nição
que apresentamos a ressalva de que os atos pratica-
dos pelo credor e pelo devedor, na espécie, estariam
sob a scalização do juiz, pois essa vigilância do ma-
gistrado não constitui particularidade dessa fase de
quanti
cação do débito, se não que traço marcante
do processo moderno, que se manifesta em todos os
momentos e em todas as espécies de procedimento.
Impende registrar que a necessidade de apurar-se
a liquidez da obrigação, estampada no título execu-
tivo, decorre de norma legal imperativa, segundo
a qual a execução, visando à cobrança de crédito,
deve lastrear-se em título líquido, certo e exigível
(CPC, art. 783, caput), sob pena de o desrespeito a
esse mandamento conduzir à virtual declaração de
nulidade da execução (CPC, art. 803, I).
Natureza jurídica da liquidação
Na vigência do CPC de 1939, alguns estudiosos
consideravam a liquidação um processo incidente
no de execução. Pontes de Miranda, p. ex., entendia
haver aí “Duas ações, fundadas em duas pretensões
diferentes, uma a liquidar e outra a executar, dois
Art. 509

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