Dignidade, autonomia e consentimento informado: as diretivas antecipadas de vontade nos casos de não terminalidade de vida no período pandêmico

AutorAndressa Souza de Albuquerque
Páginas207-237
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DIGNIDADE, AUTONOMIA E CONSENTIMENTO
INFORMADO: AS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE
VONTADE NOS CASOS DE NÃO-TERMINALIDADE
DE VIDA NO PERÍODO PANDÊMICO
Andressa Souza de Albuquerque
SUMÁRIO: Introdução. 1. Breve histórico acerca da tutela dos
corpos: a medicina como expressão de poder. 2. Diretivas
antecipadas de vontade: promoção do exercício da autonomia. 3.
Novos rearranjos em razão da pandemia: O estado da arte, a
necessidade de informar, a negativa de submissão a tratamentos
terapêuticos sem evidências científicas. 4. Conclusão.
Introdução
A instauração do Estado de Emergência de Saúde Pública
de Importância Internacional, gerada pelo surto do novo
Coronavírus, trouxe mudanças estruturais para a sociedade,
sobretudo a brasileira. Decretos, Medidas Provisórias, Portarias,
Notas Técnicas e Leis temporárias ou não, foram promulgadas
em curtíssimo espaço de tempo, na tentativa de acompanhar, tanto
a evolução da doença, quanto disciplinar as consequências
perceptíveis de um caos pandêmico.
Os profissionais da saúde, habituados a vivenciar situações
extremas, tendo em vista a precariedade da assistência à saúde no
Brasil, se depararam com um cenário de desordem e escolhas
trágicas, agravado por uma doença de elevada transmissibilidade,
ausência de tratamentos eficazes e temperada por disputas políticas
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e governamentais. Os cidadãos, não meros expectadores dessa
odisseia, mas também atores, eram alvo dos protocolos
medicamentosos, para tratar a enfermidade, e das medidas de
restrição, a fim de evitar a propagação do vírus.
A falta de uniformidade das indicações terapêuticas para a
prevenção e tratamento da doença, associada a alta taxa de
mutabilidade dos estudos científicos disponíveis, criou um
ambiente fértil para se discutir acerca da importância da
manifestação do paciente em se submeter a certos procedimentos
medicamentosos e tratamentos, principalmente quando não
evidência de benefício. Nesse contexto, pipocam as Diretivas
Antecipadas de Vontade (DAV’s), que se apresentam como
instrumentos hábeis a expressar a autonomia do paciente nas
circunstâncias em que, de per si, encontra-se impossibilitado, seja
por uma causa transitória ou permanente.
A inobservância da vontade do paciente pode ser
considerada descumprimento de direitos inalienáveis, tais como o
de dispor sobre seus próprios corpos, o que está em total
dissonância com o ordenamento jurídico pátrio, mormente quando
considerada a Lei 13.979/20, publicada no período
pandêmico, que disciplina que os direitos fundamentais devem ser
respeitados, assim como as evidências científicas.
Por se tratar de evento recente e de mecanismo pouco
difundido na relação médico-paciente, a discussão jurídico-
doutrinária sobre o tema ainda é incipiente, justificando-se o
presente estudo, em especial, para explorar o uso das diretivas
antecipadas de vontade no período da pandemia como meio de
manifestação expressa de recusa de submissão à procedimentos e
tratamentos medicamentosos, principalmente sem respaldo
científico.
Sob tal pressuposto, objetiva-se sistematizar, através de
pesquisa documental interdisciplinar doutrinária que contempla,
não as normativas vigentes no Brasil, como também as

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