Limites e Possibilidade do Acordo em Direitos Indisponíveis: Exame do Artigo 3º, § 2º, da Lei n. 13.140/2015

AutorHumberto Dalla Bernardina de Pinho
Páginas242-247
CAPÍTULO 22
Limites e Possibilidade do Acordo em Direitos Indisponíveis:
Exame do Artigo 3º, § 2º, da Lei n. 13.140/2015
Humberto Dalla Bernardina de Pinho(1)
(1) Professor Titular de Direito Processual Civil na UERJ, IBMEC e Estácio. Martin-Flynn Global Law Professor at University of Connecticut School
of Law. Diretor Acadêmico da FEMPERJ. Membro do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
(2) “Negócio processual é o fato jurídico voluntário, em cujo suporte fático confere-se ao sujeito o poder de escolher a categoria jurídica ou estabe-
lecer, dentro dos limites fi xados no próprio ordenamento jurídico, certas situações jurídicas processuais”. (DIDIER Jr., Fredie; NOGUEIRA, Pedro
Henrique Pedrosa. Teoria dos fatos jurídicos processuais. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2012. p. 59.)
(3) Típicos são aqueles previstos na própria lei, como eleição de foro (art. 63), suspensão convencional do processo (art. 313, II), escolha consen-
sual do mediador e do perito (arts. 168 e 471), saneamento consensual (art. 357, § 2º), adiamento da audiência (art. 362, I), distribuição diversa do
ônus da prova (art. 373, §§ 3º e 4º), liquidação de sentença por arbitramento (art. 509, I), desistência de uso de documento cuja falsidade é alegada
pela parte contrária (art. 432, parágrafo único) etc.
(4) “Vulnerabilidade indica suscetibilidade em sentido amplo, sendo a hipossufi ciência uma de suas espécies (sob o viés econômico). A suscetibi-
lidade do litigante, porém, pode advir de outros fatores involuntários que o acometam; como vulnerabilidade pode decorrer da condição pessoal, é
Vamos, nesse texto, tratar de algumas questões que
cercam o acordo envolvendo direitos indisponíveis. Algo
que, até algum tempo era um tabu no direito brasilei-
ro, passa, agora, a ser expressamente permitido pela Lei
n. 13.140/2015.
Contudo, antes de ingressar no exame do art. 3º da
Lei da Mediação, é fundamental abordar algumas questões
necessárias à adequada compreensão do tema.
Iniciamos com a menção à consensualidade e à coope-
ração, notas marcantes do novo Código de Processo Civil
brasileiro. Além do já citado art. 6º, que prestigia o prin-
cípio da cooperação como norma fundamental do pro-
cesso civil, o novo diploma legal traz diversas previsões
com incentivo ao uso dos meios adequados de solução
de controvérsia, notadamente a mediação e a conciliação
(arts. 3º e 334).
Ademais, o art. 139, inciso V, do CPC, prevê que cabe
ao juiz “promover, a qualquer tempo, a autocomposição”,
e o art. 381, inciso II, autoriza a produção antecipada de
prova quando esta “seja suscetível de viabilizar a autocom-
posição ou outro meio adequado de solução de conflito”.
Esses exemplos ilustram a ideia do juiz como agente
concretizador da política pública de solução de conflitos.
Além disso, o CPC de 2015 inovou ao introduzir no
ordenamento jurídico brasileiro a figura das convenções
processuais, que são negócios(2) jurídicos bilaterais.
Passamos a ter, agora, três possíveis convenções a se-
rem inseridas nos contratos: convenção de arbitragem
(art. 3º da Lei n. 9.307/96), pacto de mediação (art. 23 da
Lei n. 13.140/2015) e negócios processuais (art. 190 do
CPC). Quanto a esses últimos, além da cláusula geral do
art. 190, temos, também os negócios típicos(3), previstos
pelo legislador para determinadas situações específicas.
O § 1º do art. 3º ressalva que a mediação pode versar
sobre todo o conflito ou apenas parte dele. A exemplo do
que já ocorre na arbitragem, as partes podem selecionar
uma questão específica e submetê-la à mediação, ou, no
caso da cumulação de pedidos, indicar a mediação como
ferramenta mais adequada para um deles e a arbitragem
ou mesmo o processo judicial para o outro.
Ademais, importante observar os limites subjetivos
para o cabimento de cada uma dessas convenções. Como
é de conhecimento geral, o art. 3º da Lei de Mediação é um
divisor de águas no que se refere à definição dos limites do
acordo a partir da espécie de direito em jogo.
É digno de nota que o legislador opta por impor apenas
limites objetivos, não excluindo da mediação incapazes
ou mesmo vulneráveis.
Assim sendo, nada impede que a mediação seja reali-
zada acerca de direitos titularizados por menores ou inca-
pazes, o que não é possível em outras ferramentas, como a
arbitragem (ver art. 1º da Lei n 9.307/96, que neste ponto,
pelo menos numa perpectiva litaral, não foi alterado pela
Ainda nessa perspectiva, as convenções processuais
também não podem ser realizadas quando colocam em
risco direitos daqueles que se encontram em manifesta
situação de vulnerabilidade, nos exatos termos da parte
final do parágrafo único do art. 190 do CPC. Não custa
lembrar que vulnerabilidade(4) significa suscetibilidade, e

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