O atendimento das áreas rurais à luz da Lei Federal 14.026/2020

AutorAlceu de Castro Galvão Junior e Sheila Cavalcante Pitombeira
Páginas1-18
O ATENDIMENTO DAS ÁREAS RURAIS À LUZ
Alceu de Castro Galvão Junior
Doutor em Saúde Pública. Mestre em Engenharia Hidráulica. Engenheiro Civil.
Sheila Cavalcante Pitombeira
Doutora em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Professora e Pesquisadora da
Universidade de Fortaleza. Professora Emérita da Escola Superior do Ministério
Público do Ceará. Procuradora de Justiça do Estado do Ceará.
Sumário: Introdução – 1. A universalização do saneamento rural – 2. Arcabouços jurídicos
nacional e estadual – 3. Arcabouços jurídicos locais – Conclusões – Referências.
INTRODUÇÃO
A disparidade entre os índices de cobertura dos serviços de saneamento
básico no Brasil, notadamente na coleta e tratamento do esgotamento sanitário, e
a perspectiva de universalização desses serviços, motivaram a alteração legislativa
do marco regulatório. Observe-se, contudo, que o marco regulatório setorial, seja
nacional, estadual ou municipal, deve garantir segurança jurídica para a reali-
zação de investimentos necessários à universalização do acesso ao saneamento
básico, bem como estabelecer regras para a adequada prestação desses serviços e
determinar um arranjo organizacional eciente para a gestão do setor.
A Lei Federal 11.445, de 5 de janeiro de 2007, estabelece as diretrizes nacionais
para o saneamento básico, dispondo, entre outros, sobre a prestação de serviços,
planejamento, controle social e regulação. A referida legislação foi atualizada pela Lei
Federal 14.026, de 14 de julho de 2020, trazendo profundas alterações para o setor, entre
as quais: atribuir à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) a compe-
tência para editar normas de referência sobre os serviços de saneamento; extinguir a
gura do contrato de programa e; dar ênfase as formas de prestação e planejamento
regionalizado, caracterizando-se como o novo marco legal do saneamento básico.
No tocante ao saneamento rural, a principal alteração do novo marco foi a
revogação do §1º e §2º do art. 10, que tratava dos instrumentos de contratação
de organizações dos usuários, em cooperativas ou associações, para a prestação
dos serviços em localidades de pequeno porte, predominantemente ocupada por
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população de baixa renda, onde outras formas de prestação apresentem custos de
operação e manutenção incompatíveis com a capacidade de pagamento dos usuá-
rios. Este dispositivo revogado permitia a construção de um arranjo institucional,
minimamente sustentável, para operação e gestão por sistemas multicomunitários.
Ainda em 2020, foi publicado o Decreto Federal 10.588, de 24 de dezembro,
que trata, entre outros, sobre a alocação de recursos públicos federais e os nan-
ciamentos com recursos da União ou geridos ou operados por órgãos ou entida-
des da União. Com vistas a minimizar a revogação do §1º e §2º do art. 10 da Lei
11.445/2007, este decreto estabeleceu no art. 4º, situações que não se constituem
serviço público de saneamento básico, entre as quais,
as ações de saneamento básico executadas por meio de soluções individuais, desde que o
usuário não dependa de terceiros para operar os serviços, incluída a prestação de serviços
realizados por associações comunitárias criadas para esse m que possuam competência
na gestão do saneamento rural, desde que delegadas ou autorizadas pelo respectivo titular,
na forma prevista na legislação.
Anterior à edição do novo marco regulatório, diversas organizações multico-
munitárias para a prestação dos serviços de saneamento em áreas rurais iniciaram a
construção de seus arcabouços jurídicos próprios, sendo muitos deles aprovados em
Câmaras Municipais. Este é o caso dos Sistemas Integrados de Saneamento Rural do
Ceará (SISAR-CE) e do Piauí (SISAR-PI) e das Central de Associações Comunitárias
para Manutenção Sistemas de Saneamento da Bahia. Referidos sistemas são estrutu-
rados, cada um deles, como uma organização não governamental, de direito privado,
sem ns lucrativos, sendo constituída por federações de associações comunitárias
pertencentes à mesma bacia hidrográca, destinadas ao abastecimento de água e coleta
e tratamento de esgoto das associações liadas. Desta forma, as novas regras nacionais
sobre saneamento básico implicaram na necessidade de readequação dos arcabouços
jurídicos locais e, consequentemente, nova aprovação nas Câmaras Municipais.
Além disso, a Lei 14.026/2020, art. 11-B, estabeleceu metas de universalização
para os contratos de prestação dos serviços, correspondente a 99% (noventa e nove
por cento) da população com acesso a água potável, e 90% (noventa por cento) da
população com acesso a coleta e tratamento de esgotos, até 31 de dezembro de 2033.
Entende-se como população, as áreas urbanas e rurais de um município. Cabe lembrar
que a regulamentação da meta foi objeto da norma de referência 2, da Agência Nacio-
nal de Águas e Saneamento Básico – ANA. Portanto, considerando que o principal
objetivo dos arcabouços jurídicos para o saneamento rural é prover tais serviços com
segurança jurídica e com vistas à sua universalização, é importante entender como
será calculada a universalização para o saneamento rural, com base nestes indicadores.
Diante do exposto, o presente artigo objetiva avaliar os arcabouços jurídicos
adotados pelos modelos multicomunitários para prover segurança jurídica frente
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