Comentários e anotações jurisprudenciais sobre a Lei n. 12850/2013

AutorGaltiênio da Cruz Paulino/André Batista e Silva
Páginas29-106
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Capítulo 4
COMENTÁRIOS E ANOTAÇÕES JURISPRUDENCIAIS SOBRE
A LEI Nº 12.850/2013
Seção I
Da Colaboração Premiada
(Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
Art. 3º-A. O acordo de colaboração premiada é negócio jurídico
processual e meio de obtenção de prova, que pressupõe utilidade e
interesse públicos. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
No presente dispositivo, o primeiro sobre acordo de colaboração
premiada neste diploma normativo, é especificada, conforme exposto no
tópico 3, a natureza jurídica do instituto, que, sob o aspecto da Teoria Geral
do Processo, enquadra-se como um negócio jurídico processual firmado
entre o Ministério Público ou a Polícia com o colaborador, e, sob o ângulo
da Prova, apresenta-se como um meio de obtenção de prova.
Enquanto negócio jurídico processual, podem as partes, nos
limites da lei, fixar direitos e obrigações mútuas, que serão aferidos, sob a
luz da legalidade pelo juízo homologador, o qual não poderá adentrar no
mérito do pacto. O Ministério Público, por exemplo, abrirá mão
parcialmente da persecução penal em face do colaborador, em razão de ele
ter colaborado com a investigação, enquanto o colaborador receberá um
prêmio, sanção mais branda, em decorrência de ter atuado de maneira
colaborativa.
Além disso, os relatos apresentados pelo colaborador durante a
colaboração não são provas, mas meios de obtenção de prova, que,
juntamente com os elementos de corroboração apresentados, serão
utilizados pelo órgão persecutor para obtenção de provas em desfavor dos
delatados e para a demonstração da ocorrência dos fatos delitivos
informados.
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Outrossim, nesse dispositivo é feito referência a dois valores que
devem nortear todos os acordos de colaboração, a utilidade e o interesse
público. Não se admite a celebração de acordo de colaboração que não seja
útil para a persecução penal e não esteja de acordo com o interesse público.
O acordo de colaboração não é voltado para o atendimento dos interesses
do colaborador ou mesmo do membro do Ministério Público que tenha sido
responsável pela celebração do pacto. É destinado para ser útil à
investigação e deve estar de acordo com o interesse da sociedade, centrado
na busca por uma persecução penal eficiente.
A análise dos aspectos utilidade e interesse público deve ser feita
pelos órgãos de persecução penal durante as tratativas de celebração de
todos os acordos de colaboração, bem como pelo juízo no momento da
homologação do acordo, pois estes aspectos fazem parte do espectro de
legalidade ao qual o juízo está adstrito.
Art. 3º-B. O recebimento da proposta para formalização de acordo de
colaboração demarca o início das negociações e constitui também
marco de confidencialidade, configurando violação de sigilo e quebra
da confiança e da boa-fé a divulgação de tais tratativas iniciais ou de
documento que as formalize, até o levantamento de sigilo por decisão
judicial. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Ao surgir o interesse na celebração do acordo, deve o pretenso
colaborador encaminhar requerimento nesse sentido para que se possa dar
início às tratativas. Ao contrário do que se possa imaginar, não é o termo
de confidencialidade que garante o sigilo das negociações, mas sim o
recebimento da proposta inicial pelo colaborador. Note-se que esse sigilo
deve permanecer até ser levantado por decisão judicial (art. 7º, parágrafo
3º da Lei 12.850/113).
A partir desse momento, quaisquer divulgações sobre tais
negociações iniciais ou sobre documentos apresentados poderão
configurar, nos termos do dispositivo, “violação de sigilo e quebra da
confiança e da boa-fé”. Isso visa garantir maior segurança jurídica ao
candidato a colaborador, posto que lhe será assegurado que nada daquilo
que ele apresentou inicialmente poderá ser utilizado em seu desfavor em
caso de não celebração do acordo, isto é, estará o pretenso colaborador
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imune a qualquer tipo de persecução criminal no momento em que
apresenta ao Ministério Público os elementos que possui que subsidiem
seu pedido (situação denominada como “queen for a day”).
Se não fosse assim, haveria um desestimulo à colaboração.
Outrossim, deve sempre o membro do Ministério Público atuar pautado
pela boa-fé e pela lealdade, só devendo considerar as informações trazidas
pelo colaborador em caso de ser celebrado o ajuste ao final.
Por vezes, acontece de o colaborador apresentar requerimento
visando à celebração do acordo enquanto já responde a ação penal. Nesse
caso, sob pena de haver quebra da confidencialidade, não pode o
requerente informar ao juízo penal que iniciou tratativas de acordo de
colaboração premiada, devendo seguir normalmente com a sua defesa.
Nem se argumente que haveria postura contraditória do pretenso
colaborador ao não assumir culpa na ação penal que responde e,
simultaneamente, confessar os crimes no intuito de celebrar acordo. A
uma, porque estaria exercendo o seu direito à ampla defesa. A duas, porque
o sistema penal brasileiro aceita a “mentira defensiva”, ou seja, aquela na
qual o réu falta com a verdade unicamente para se defender, sem imputar
falsamente crime a outrem (“mentira agressiva”). A três, porque se não for
concretizado o acordo poderá o postulante ter sido prejudicado em sua
defesa técnica, já que teria alterado sua estratégia processual por influência
da negociação com o Ministério Público.
§ 1º A proposta de acordo de colaboração premiada poderá ser
sumariamente indeferida, com a devida justificativa,
cientificando-se o interessado. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
O simples fato de ter sido apresentado pedido de acordo de
colaboração premiada não obriga o órgão ministerial a celebrar o ajuste.
Neste momento, deve ser feita uma análise inicial do que foi apresentado
pelo colaborador para se avaliar a viabilidade ou não de continuar as
tratativas.
Em caso de não ser possível o prosseguimento, deve o membro do
Ministério Público indeferir sumariamente a proposta e devolver ao
pretenso colaborador tudo aquilo que ele apresentou ao P arquet, devendo

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